A química que nos transforma
Com o lema «Química - a nossa vida, o nosso futuro», a Assembleia-Geral das Nações Unidas proclamou 2011 como o Ano Internacional da Química, visando celebrar as suas contribuições para o bem estar da humanidade. A Festa do Avante! foi mais longe e, no Espaço da Ciência, local por onde passaram muitos milhares de pessoas, abriram-se perspectivas, fundamentais para a compreensão do mundo e do cosmos.
«Contra os que não acreditam que todo o mundo é composto de mudança, contra os que não acreditam que tudo se transforma, nós, comunistas, contrariamos a história. Porque somos a vanguarda da Revolução, a vanguarda da luta dos explorados contra os exploradores, porque transformamos o mundo com a nossa força que nos vem do trabalho, do trabalho que tudo transforma», lia-se, à entrada da exposição, enquanto outros apreciavam uma escultura, de grande dimensão, que chamava à atenção para os elementos básicos da química (átomos e moléculas).
«É também a luta pela transformação do mundo que está simbolizada na nossa bandeira. A união da foice e do martelo, dos camponeses e dos operários, a união de todos os explorados do mundo representada pela estrela de cinco pontas do internacionalismo proletário. E podemos sempre dizer que a química que somos, que a química que nos transforma, está por trás da esperança transformadora construída de anos de luta contra a injustiça e opressão», prossegue o texto, acompanhado pela formula mais evidente de todos os tempos: «(PS+PSD+CDS)3 = troika», seguida da resposta, cada vez mais necessária: «A luta tudo transforma», lema escolhido, que imana da frase de Lavoisier («Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma») e procura, sinteticamente, traduzir o pensamento revolucionário de que a luta é o motor da história.
Lá dentro, num espaço dedicado ao conhecimento, a exposição retractava como era a química ainda antes de o ser, ou seja a alquimia, mostrando, por exemplo, quem foram «os primeiros químicos» e como se processavam os processos de «destilação, mineração e refinação».
Continuando, deparamo-nos com os «princípios e ideais do iluminismo», que fizeram avançar a «valorização da ciência», e onde se abordavam os pensamentos de Lavoisier, António Augusto de Aguiar, Marie Currie (merecedora de um Nobel da Química, em 1911, pela sua descoberta dos elementos químicos: rádio e polónio), assim como «a nova teoria atómica» ou o que significa os termos ADN (ácido desoxirribonucleico) ou ARN (ácido ribonucleico). Foram ainda «homenageados», pelas suas contribuições, filósofos e cientistas, como Tales de Mileto, Roger Bacon, Leonardo da Vinci, Paracelso, Giordano Bruno, Roger Boyle George Ernest.
Neste espaço, em destaque estiveram ainda, entre outros, John Dalton, Amedeo Avogadro e Dimitri Mendeleev, um dos maiores génios da química, que contribuiu para a classificação periódica dos elementos, criando uma tabela na qual os mesmos eram dispostos em filas horizontais, de acordo com as massas atómicas crescentes, e colunas verticais, com elementos de propriedades semelhantes. Entre os maiores, valorizaram-se ainda as descobertas de Ernest Rutherford, Niels Bohr, Erwin Schrödinger, Francis Crick, James Watson, Rosalind Franklin e Maurice Wilkes.
De fácil leitura, com alguns poemas à mistura, os visitantes tiveram ainda a oportunidade de perceber a importância da química no dia-a-dia, nos alimentos, nos medicamentos, na energia e no ambiente, entre a paz e a guerra, e de «absorver» algumas das propostas do PCP nesta área da ciência.
Para as crianças havia uma área onde se podiam fazer pinturas com «tinta invisível», entre outras actividades, e para os mais curiosos muitas experiências, como por exemplo as «lâmpadas de luz ultravioleta, materiais luminescentes», onde se explorou, para espanto de todos, os fenómenos da flurescência e fosferência, bastante confundidas pelo público, mas que tem origens muito diferentes. A flurescência corresponde à capacidade de uma substância absorver luz ultravioleta e emitir luz visível, num processo quase instantâneo. A fosferência corresponde à absorção de luz e emissão lenta. Um fenómeno responsável por alguns sinais de emergência brilhantes no escuro.
Entre muitas outras experimentações – em colaboração de professores e alunos das faculdades de Ciências de Coimbra e de Lisboa, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, do Núcleo de Física do Instituto Superior Técnico e do Centro de Ciência Viva de Constância - testava-se ainda a «espátula de dilatação», a «implosão de latas» e a «célula de hidrogénio».
No Auditório do Espaço Ciência tiveram lugar, durante os três dias, palestras e debates sobre «A história química de uma vela», «Viva com a química!», a «Química no universo», iniciativas para «Comemorar o Ano Internacional da Química e o Centenário da Fundação da Sociedade Portuguesa de Química».
Lágrima de Preta
Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para analisar.
Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterlizado.
Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.
Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.
Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:
nem sinais de negro
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio.
António Gedeão
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexactas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioactiva
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atómica
Sem cor sem perfume
Sem rosa, sem nada
Vinicius de Moraes