O ideal que merece uma vida
As comemorações do centenário do nascimento de Álvaro Cunhal estenderam-se por vários espaços e momentos do Espaço Central da Festa do Avante!, contando e mostrando a actualidade desse exemplo maior de empenho pessoal na luta pelo ideal comunista.
A «Fotobiografia» destacava-se na Loja; um grande cartaz anunciava que «Até Amanhã Camaradas», realizado por Joaquim Leitão, estará «brevemente nos cinemas» – junto ao CineAvante!, cuja programação encerrou com «Cinco Dias Cinco Noites», de José Fonseca e Costa.
Na principal entrada para o grande pavilhão vermelho e branco, junto à Praça da Paz, houve frequentemente filas de visitantes para entrar na exposição «Vida, Pensamento e Luta: Exemplo que se Projecta na Actualidade e no Futuro». Esta muito grande afluência remetia-nos logo para a sua primeira edição, no Pátio da Galé, em Lisboa, que recebeu mais de 20 mil pessoas.
A diversidade de idades, de vestimentas e de observações dos visitantes reproduzia as múltiplas cores que encontrávamos por toda a Quinta da Atalaia e deixava perceber que muitos tiveram ali o primeiro encontro com este rico conjunto de documentos da história do PCP e da vida do principal construtor do Partido: fotografias, vídeos, objectos pessoais, textos, reconstituições.
A fila à entrada crescia devido à demora logo nos primeiros painéis. Lá mais para dentro, constantemente, muros de visitantes moviam-se, com longas pausas, diante deste ou daquele conjunto. Uns fotografavam a réplica da cela onde Álvaro Cunhal foi sujeito a oito anos de isolamento, outros não resistiam a encostar o ouvido curioso à telefonia que «transmitia» baixinho sons da Rádio Portugal Livre, outros picavam com o indicador o ecrã táctil para desfolharem «Desenhos da Prisão» (alguns inéditos) e pinturas de Álvaro Cunhal (a chamar para as Artes Plásticas, ali a poucas dezenas de metros). Do sobressalto que alertava para um depoimento de Sofia Ferreira sobre o momento em que foi presa, com Álvaro Cunhal, no Luso, em 1949, a atenção era desviada para o filme que simulava a heróica fuga de Peniche, em 1960. A voz do histórico dirigente comunista pontuava marcos no percurso, sobretudo quando os temas já se referiam ao período posterior ao 25 de Abril de 1974.
Na saída, ecoava-se a valorização do legado de Álvaro Cunhal para os dias de hoje, destacada pela afirmação do ideal comunista por que vale a pena lutar.
Esta ideia sobressaiu também no debate dedicado ao centenário, no Fórum, sábado à tarde, onde José Capucho, do Secretariado do Comité Central do PCP, salientou que Álvaro Cunhal a expressou em palavras e na prática, durante os seus 74 anos de militância, tanto no período da construção do socialismo como após as derrotas no Leste europeu.
Manuela Pinto Ângelo, também do Secretariado do CC, frisou que em Álvaro Cunhal são inseparáveis o homem, o comunista, o intelectual e o artista. Realçou a muito estreita relação entre o dirigente e o Partido, bem como o apaixonado interesse de Cunhal por todas as áreas da vida.
Jaime Toga, da Comissão Política do CC, ao abordar o 25 de Abril e a contra-revolução, lembrou a observação de Álvaro Cunhal, quanto à originalidade de, com a acção do povo a colocar-se sempre à frente das decisões do Governo, terem sido alcançadas profundas transformações revolucionárias, sem poder revolucionário.
Manuel Rodrigues, membro do Comité Central, lembrou o informe apresentado ao 3.º Congresso do Partido e as linhas de acção definidas para a unidade antifascista, esforços que prosseguiriam no apoio à aliança povo-MFA, em 1974, e que tinham estado na base da política de unidade para a luta dos trabalhadores, que levou à criação da Intersindical, em 1970. Marcaram igualmente a intervenção do PCP nas eleições, desde a FEPU.
«O Partido com Paredes de Vidro», referido também noutras intervenções, foi a mais completa obra sobre o partido comunista, após Lénine e «O Partido de Novo Tipo», destacou Armindo Miranda, membro da Comissão Política do CC, que tratou a contribuição de Álvaro Cunhal para a construção do Partido, chamando a atenção para alguns aspectos práticos e reflexões.
As observações e comentários do público permitiram desenvolver e aprofundar algumas questões, como a participação de Álvaro Cunhal, em 1935, em Moscovo, com Bento Gonçalves, nas conversações da delegação portuguesa ao congresso da Internacional Comunista; o combate ao desvio de direita no PCP, em 1956-1959; as alianças e o reforço do PCP e da luta de massas; as características e objectivos das comemorações do centenário.
Frente ao Fórum, um painel numa parede da exposição anunciava as próximas grandes iniciativas: o congresso «Álvaro Cunhal, o Projecto Comunista, Portugal e o Mundo de Hoje», a 26 e 27 de Outubro, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa; o comício a 10 de Novembro, no Campo Pequeno; a exposição central, de 30 de Novembro a 15 de Dezembro, no Porto; uma sessão sobre «A Soberania e a Independência Nacional, Pensamento e Acção de Álvaro Cunhal», no dia 1 de Dezembro, em Lisboa; uma iniciativa sobre «Álvaro Cunhal, o Intelectual e o Artista», em Lisboa, a 14 de Dezembro; e o encerramento das comemorações, em Peniche, nos dias 3 e 4 de Janeiro, com a recriação da fuga e um comício no forte.