Porto - Sementes de futuro
Uma vitória sobre a chantagem
Começar pelo fim é o melhor princípio, relatando a tarde soalheira do dia 24 em que muitos milhares de trabalhadores e população se concentraram na Praça da Liberdade – respondendo ao apelo da União de Sindicatos do Porto –, quando já a greve geral se aproximava do fim.
Na multidão de rostos – diversos – que ali figuravam, havia uma desconcertante similitude: gente alegre, animada, dançando despreocupadamente ao som da música; gente compenetrada, traquejada e experiente, empunhava faixas e pancartas; gente com visível cansaço encontrava camaradas de luta e partilhava as experiências daquela noite de piquete de greve; gente heróica, alguns tão jovens, que quem os não tivesse visto em acção nos piquetes, de forma alguma suspeitaria da bravura com que se bateram contra os «serviços mínimos» violadores do direito à greve, contra as ameaças patronais e a intimidação policial; gente vinda de empresas com taxas de adesão à greve esmagadoras, superiores a 90%; gente que no seu local de trabalho fez greve sozinha, ou então com mais um ou dois colegas. Toda esta gente, orgulhosa, da condição de grevista.
«Uma grande adesão no distrito do Porto», «superior a anteriores greves gerais», diziam os dirigentes sindicais em cima do palco daquela concentração. E uma torrente infindável de nomes de empresas e locais de trabalho que aderiram massivamente à greve, seguia-se: «100% de adesão na Câmara de Amarante», «100% na cantina do Hospital Pedro Hispano”, «Sakthi, empresa metalúrgica com 80 a 90%», «aeroporto Sá Carneiro encerrado», «porto de Leixões encerrado»… enquanto alguns aplaudiam e gritavam «Viva a greve geral», outros, que porventura nunca tinham posto o pé em semelhante andança, procuravam absorver o que se passava, naquela que seria a sua iniciação no caminho da luta.
Todos os ramos de actividade do sector privado foram afectados no distrito do Porto, com centenas de empresas e locais de trabalho com adesões acima dos 70% no sector da Metalurgia, da Construção Civil, da Hotelaria, do Comércio e dos Serviços. No sector público cerca de uma centena de serviços das autarquias foram encerrados ou fortemente condicionados; várias repartições de Finanças, da Segurança Social, Escolas, Centros de Saúde e Hospitais encerraram também.
Determinante foi a unidade e a luta dos trabalhadores dos transportes do distrito do Porto. Apesar da chantagem e intimidação de que foram particular alvo, com a imposição de «serviços mínimos» ilegais, ameaças e «apelos» públicos das chefias, a greve conquistou adesões acima dos 90% em empresas como os STCP, o Metro do Porto, a REFER, a EMEF e a CP.
A combatividade, a consciência de classe, o empenho e dedicação de dirigentes, delegados e activistas sindicais, a solidariedade, a confiança na luta e a disponibilidade para a continuar, estavam ali bem patentes.
A rejeição das política de direita, a exigência de uma vida melhor e uma sociedade mais justa, também.
Para trás estava uma noite e manhã de piquetes. Piquetes como o que desfilou pelo Shopping Via Catarina cortando o trânsito na Rua Fernandes Tomás; ou ainda o piquete no parque de material circulante ferroviário da CP em Novelas, impedido por um sargento da GNR – que recorreu à agressão – de falar com um trabalhador; piquetes como o da estação da CP em Caíde de Rei, onde os trabalhadores resistiram aos serviços mínimos ilegais e de onde nenhum comboio suburbano partiu.
Adiante afigurava-se o despertar da semente que a greve geral deixou junto de milhares, milhões até, de trabalhadores. A luta continua. Os trabalhadores não esmorecem. E com eles, a sua organização sindical de classe no distrito do Porto, também não.