Uma obra que mantém a actualidade
«A verdade e a mentira na revolução de Abril» foi a obra de Álvaro Cunhal debatida no sábado passado, no Porto, no âmbito do ciclo de debates promovido pelo PCP sobre cinco das obras teóricas mais emblemáticas daquele dirigente.
Dezenas de pessoas presentes no Salão da Junta de Freguesia de Massarelos ouviram atentamente Vasco Cardoso e Aurélio Santos, membros, respectivamente, da Comissão Política e da Comissão Central de Controlo do PCP, que abordaram aspectos distintos do livro.
Antes de passar a palavra a Aurélio Santos, que falou sobre o desenvolvimento do processo revolucionário no 25 de Abril e o início da contra-revolução, Vasco Cardoso introduziu o debate, sublinhando o objectivo daquela iniciativa do PCP: combater a manobra de branqueamento de acontecimentos recentes da História de Portugal, dar a conhecer às novas gerações a verdade histórica dos factos mas, sobretudo, reconhecer a imensa actualidade do pensamento político e acção revolucionária de Álvaro Cunhal.
Mais tarde, falando dos efeitos da contra-revolução, Vasco Cardoso diz que, apesar de, como o livro revela, muitas das mais significativas conquistas de Abril terem sido destruídas num complexo e longo processo que teve como objectivo primeiro restaurar o capitalismo monopolista, a verdade é que o alcance daquelas conquistas foi tão vasto e tão transformador que a Constituição, o quadro legal, os valores e aspirações do povo português mantêm elementos incontornáveis daquele período libertador.
Para os comunistas, o papel da democracia económica é um papel angular, num quadro mais vasto de uma democracia também política, social e cultural, e é por isso que a reconstituição dos monopólios assume tão grande importância nos dias de hoje, diz Vasco Cardoso, para quem a política de direita, desenvolvida ora pelo PSD ora pelo PS, tem sido, de facto, uma política de subserviência aos interesses daqueles grupos nacionais ou estrangeiros, com as repercussões negativas que teve em toda a sociedade.
Mas a etapa actual da contra-revolução é, para Vasco Cardoso, a mais avançada de todas, na medida em que procura inclusive desfigurar a natureza democrática do nosso sistema político. Seja através de limitações à liberdade de expressão, da repressão contra o movimento sindical nas empresas e locais de trabalho, das alterações às leis eleitorais, da censura e instrumentalização dos media ou, finalmente, do velho projecto da direita de uma Constituição «limpa do lixo ideológico».
Como se esconde a face
Vasco Cardoso chama ainda a atenção para a análise «particularmente lúcida» do livro a propósito das ingerências do imperialismo – com a cumplicidade de forças e partidos nacionais, incluindo o PS – na vida interna do nosso País. Lembra as redes terroristas e a sua escandalosa impunidade; os que, intrigando, conspirando e manobrando para dividir e liquidar o MFA, acusavam ao mesmo tempo o PCP de o instrumentalizar, para abrir caminho a um golpe militar contra-revolucionário; os que prepararam golpes atrás de golpes até ao golpe de 25 de Novembro de 1975, alegadamente para dar resposta a um suposto «golpe comunista».
Enfim, expressões concretas da realidade portuguesa que simultaneamente revelam aquilo a que o imperialismo é capaz de recorrer, para procurar impor a sua vontade à dos outros povos. Aliás, afirma Vasco Cardoso, diariamente se assiste a ingerências semelhantes em África, Venezuela, Timor, Ucrânia, Bielorússia e outros países. «Não são, naturalmente, situações decalcadas da nossa história» diz, mas as semelhanças indicam que, por detrás, está a mão da CIA, do grande capital, da social-democracia, das burguesias nacionais.
Por fim, neste livro, que à mentira como «arma e prática viciosa» contrapõe a verdade, o critério de análise e a intervenção prática dos comunistas, o autor reafirma elementos que iluminam a intervenção dos comunistas nos dias de hoje. Dentre eles Vasco Cardoso destacou a «Perspectiva histórica», um dos elementos que, segundo Álvaro Cunhal, «na luta contra a ditadura, na revolução e na contra-revolução, conferiu ao PCP capacidade e contagiante confiança».
O que distingue o PCP
«A verdade e a mentira na Revolução de Abril», para além de revelar a dimensão de Álvaro Cunhal como estadista, apresenta o quadro do papel e intervenção do PCP no Estado português e a contribuição dos comunistas para a democracia portuguesa, nas formas como se estabeleceu, desenvolveu e ficou consagrada na Constituição. Documenta, ainda, e analisa as fases, causas, objectivos e expressões do processo contra-revolucionário», antes e depois do 25 de Abril, avançando nos seus capítulos finais reflexões de grande actualidade na presente conjuntura nacional e internacional.
Esta a opinião de Aurélio Santos, para quem a obra teórica de Álvaro Cunhal contém mesmo elementos fundamentais para a avaliação não apenas da história do PCP mas da própria história contemporânea do País, tão deliberadamente falsificada. Aliás, como Álvaro Cunhal sublinha no preâmbulo do livro, «quem escreve História tem naturalmente conceitos de classe de natureza ideológica e teórica», que não poderão deixar de se reflectir na apreciação dos acontecimentos. E alertou: «as ideias feitas conduzem a minimizar ou silenciar acontecimentos por vezes determinantes e a sobrevalorizar, ao ponto de aparecerem como determinantes, outros acontecimentos, que na realidade pouco significaram. Os historiadores das classes governantes, considerando de valor intemporal e universal os próprios conceitos de Estado, de Democracia, de Direito, desde logo têm ideias feitas que determinam a sua apreciação defeituosa dos factos, e conduzem a errados juízos de valor relativos a acontecimentos e a forças sociais e políticas. Afastam-se assim da verdade histórica».
Verdade e mentira
Este não é o caso do PCP que, na sua acção como na visão que tem do mundo e da História, não esconde o seu ponto de vista – o da classe operária e das classes trabalhadoras. É que, como Álvaro Cunhal sublinha, verdade «é referir com objectividade factos e acontecimentos, mesmo quando desfavoráveis à própria opinião. Verdade é, na actividade prática, declarar os reais objectivos e as reais consequências que se pretendem.» Mentira «é ocultar e disfarçar os reais objectivos, difundindo e propagando que decisões e medidas da sua autoria e responsabilidade têm efeitos que correspondem aos interesses do povo, quando têm em vista efeitos precisamente contrários.»
Álvaro Cunhal não faz, contudo, «teorização abstracta» nem é homem de «fórmulas», diz Aurélio Santos. Ele desenvolve e aplica o marxismo, tendo em conta as circunstâncias concretas da sociedade portuguesa. Mais, o seu pensamento caracteriza-se por adequar o estatuto revolucionário ao povo português, como se pode verificar no livro, na concepção das «conquistas da revolução» e da via para o socialismo, na associação entre democracia e socialismo ou nas concepções sobre a perspectiva histórica. Um livro que regista também contribuições essenciais do PCP para a revolução portuguesa ou, por exemplo, aponta a «incompatibilidade, nas condições de Portugal, de um regime de real democracia com uma dominação económica dos monopólios e a sua consequente dominação política».
Antes de passar a palavra a Aurélio Santos, que falou sobre o desenvolvimento do processo revolucionário no 25 de Abril e o início da contra-revolução, Vasco Cardoso introduziu o debate, sublinhando o objectivo daquela iniciativa do PCP: combater a manobra de branqueamento de acontecimentos recentes da História de Portugal, dar a conhecer às novas gerações a verdade histórica dos factos mas, sobretudo, reconhecer a imensa actualidade do pensamento político e acção revolucionária de Álvaro Cunhal.
Mais tarde, falando dos efeitos da contra-revolução, Vasco Cardoso diz que, apesar de, como o livro revela, muitas das mais significativas conquistas de Abril terem sido destruídas num complexo e longo processo que teve como objectivo primeiro restaurar o capitalismo monopolista, a verdade é que o alcance daquelas conquistas foi tão vasto e tão transformador que a Constituição, o quadro legal, os valores e aspirações do povo português mantêm elementos incontornáveis daquele período libertador.
Para os comunistas, o papel da democracia económica é um papel angular, num quadro mais vasto de uma democracia também política, social e cultural, e é por isso que a reconstituição dos monopólios assume tão grande importância nos dias de hoje, diz Vasco Cardoso, para quem a política de direita, desenvolvida ora pelo PSD ora pelo PS, tem sido, de facto, uma política de subserviência aos interesses daqueles grupos nacionais ou estrangeiros, com as repercussões negativas que teve em toda a sociedade.
Mas a etapa actual da contra-revolução é, para Vasco Cardoso, a mais avançada de todas, na medida em que procura inclusive desfigurar a natureza democrática do nosso sistema político. Seja através de limitações à liberdade de expressão, da repressão contra o movimento sindical nas empresas e locais de trabalho, das alterações às leis eleitorais, da censura e instrumentalização dos media ou, finalmente, do velho projecto da direita de uma Constituição «limpa do lixo ideológico».
Como se esconde a face
Vasco Cardoso chama ainda a atenção para a análise «particularmente lúcida» do livro a propósito das ingerências do imperialismo – com a cumplicidade de forças e partidos nacionais, incluindo o PS – na vida interna do nosso País. Lembra as redes terroristas e a sua escandalosa impunidade; os que, intrigando, conspirando e manobrando para dividir e liquidar o MFA, acusavam ao mesmo tempo o PCP de o instrumentalizar, para abrir caminho a um golpe militar contra-revolucionário; os que prepararam golpes atrás de golpes até ao golpe de 25 de Novembro de 1975, alegadamente para dar resposta a um suposto «golpe comunista».
Enfim, expressões concretas da realidade portuguesa que simultaneamente revelam aquilo a que o imperialismo é capaz de recorrer, para procurar impor a sua vontade à dos outros povos. Aliás, afirma Vasco Cardoso, diariamente se assiste a ingerências semelhantes em África, Venezuela, Timor, Ucrânia, Bielorússia e outros países. «Não são, naturalmente, situações decalcadas da nossa história» diz, mas as semelhanças indicam que, por detrás, está a mão da CIA, do grande capital, da social-democracia, das burguesias nacionais.
Por fim, neste livro, que à mentira como «arma e prática viciosa» contrapõe a verdade, o critério de análise e a intervenção prática dos comunistas, o autor reafirma elementos que iluminam a intervenção dos comunistas nos dias de hoje. Dentre eles Vasco Cardoso destacou a «Perspectiva histórica», um dos elementos que, segundo Álvaro Cunhal, «na luta contra a ditadura, na revolução e na contra-revolução, conferiu ao PCP capacidade e contagiante confiança».
O que distingue o PCP
«A verdade e a mentira na Revolução de Abril», para além de revelar a dimensão de Álvaro Cunhal como estadista, apresenta o quadro do papel e intervenção do PCP no Estado português e a contribuição dos comunistas para a democracia portuguesa, nas formas como se estabeleceu, desenvolveu e ficou consagrada na Constituição. Documenta, ainda, e analisa as fases, causas, objectivos e expressões do processo contra-revolucionário», antes e depois do 25 de Abril, avançando nos seus capítulos finais reflexões de grande actualidade na presente conjuntura nacional e internacional.
Esta a opinião de Aurélio Santos, para quem a obra teórica de Álvaro Cunhal contém mesmo elementos fundamentais para a avaliação não apenas da história do PCP mas da própria história contemporânea do País, tão deliberadamente falsificada. Aliás, como Álvaro Cunhal sublinha no preâmbulo do livro, «quem escreve História tem naturalmente conceitos de classe de natureza ideológica e teórica», que não poderão deixar de se reflectir na apreciação dos acontecimentos. E alertou: «as ideias feitas conduzem a minimizar ou silenciar acontecimentos por vezes determinantes e a sobrevalorizar, ao ponto de aparecerem como determinantes, outros acontecimentos, que na realidade pouco significaram. Os historiadores das classes governantes, considerando de valor intemporal e universal os próprios conceitos de Estado, de Democracia, de Direito, desde logo têm ideias feitas que determinam a sua apreciação defeituosa dos factos, e conduzem a errados juízos de valor relativos a acontecimentos e a forças sociais e políticas. Afastam-se assim da verdade histórica».
Verdade e mentira
Este não é o caso do PCP que, na sua acção como na visão que tem do mundo e da História, não esconde o seu ponto de vista – o da classe operária e das classes trabalhadoras. É que, como Álvaro Cunhal sublinha, verdade «é referir com objectividade factos e acontecimentos, mesmo quando desfavoráveis à própria opinião. Verdade é, na actividade prática, declarar os reais objectivos e as reais consequências que se pretendem.» Mentira «é ocultar e disfarçar os reais objectivos, difundindo e propagando que decisões e medidas da sua autoria e responsabilidade têm efeitos que correspondem aos interesses do povo, quando têm em vista efeitos precisamente contrários.»
Álvaro Cunhal não faz, contudo, «teorização abstracta» nem é homem de «fórmulas», diz Aurélio Santos. Ele desenvolve e aplica o marxismo, tendo em conta as circunstâncias concretas da sociedade portuguesa. Mais, o seu pensamento caracteriza-se por adequar o estatuto revolucionário ao povo português, como se pode verificar no livro, na concepção das «conquistas da revolução» e da via para o socialismo, na associação entre democracia e socialismo ou nas concepções sobre a perspectiva histórica. Um livro que regista também contribuições essenciais do PCP para a revolução portuguesa ou, por exemplo, aponta a «incompatibilidade, nas condições de Portugal, de um regime de real democracia com uma dominação económica dos monopólios e a sua consequente dominação política».