Um grão de areia chamado Palestina
A situação no Médio Oriente, uma região do mundo que é desde há décadas palco da ingerência imperialista, foi tema de debate no espaço da Cidade Internacional, lugar por excelência para a manifestação da solidariedade entre os povos.
Ali Yousef Alnabouti, do Partido Baas Árabe da Síria, Jehad Rashid, da Frente Democrática de Libertação da Palestina, Fayez Badawi, da Frente Popular de Libertação da Palestina, Hana Awad, da Fatah, Isaam Besseisso, embaixador da Autoridade Nacional Palestiniana em Portugal, e Silas Cerqueira, do Conselho Português para a Paz e Cooperação, integraram a mesa moderada por Jorge Cadima.
Coube ao representante da Síria, país exposto ao ataque do imperialismo norte-americano e do seu aliado israelita, lembrar que, a partir dos atentados de 11 de Setembro, os EUA dividiram o mundo em dois blocos: os que são a favor e os que são contra a política dos EUA de pretensa luta contra o terrorismo.
Sublinhando que é Washington quem desde sempre patrocina o terrorismo, como fez no Afeganistão quando o objectivo era atacar a antiga União Soviética, Yousef Alnabouti recordou que continua sem resposta o pedido da Síria para a realização de uma convenção internacional para definir o que é o terrorismo. Não é de estranhar uma tal atitude, já que os principais desestabilizadores do Médio Oriente, EUA e Israel, se empenham em subverter os conceitos, transformando os ocupantes em vítimas e os ocupados em atacantes.
A guerra contra o Iraque, a pretexto das armas de destruição massiva que não existiam, faz parte desta estratégia para redesenhar o mapa da região e permitir ao imperialismo o controlo das suas riquezas naturais (60 por cento dos recursos de petróleo e outros recursos). Mas também aqui, tal como na Palestina, a vida demonstra que a luta dos povos não dá tréguas e que não haverá paz no Médio Oriente ocupado.
A propósito, Alnabouti lembrou que Israel continua a ocupar territórios da Síria, Líbano e Palestina, desrespeitando todas as resoluções da ONU sobre a matéria desde há décadas. Neste caso não há retaliações, mas quando se trata de ameaçar a Síria, o Iraque ou o Irão, então o caso muda de figura, porque há de facto dois pesos e duas medidas ao sabor dos interesses norte-americanos.
A questão palestiniana
A incontornável questão palestiniana, particularmente actual devido à retirada israelita da Faixa de Gaza, dominou o debate. A presença dos representantes de diferentes forças políticas que integram a Organização de Libertação da Palestina (OLP) ajudou a perceber a complexidade de uma luta que, tendo uma causa comum, está longe de ser unívoca.
O mote foi dado por Jehad Rashid, ao sublinhar que a retirada da Faixa de Gaza não é uma concessão de Israel mas antes a manifestação da derrota da política expansionista de Telavive. «Há que estar vigilantes», alertou, porque esta retirada tem de ser «o primeiro passo da retirada total dos territórios ocupados em 1967», o primeiro passo para a efectiva construção de um Estado palestiniano «independente, democrático e laico».
Lembrando que Israel rejeita todos os planos internacionais de paz, acelera a construção de colonatos em Jerusalém, mantém presos cerca de 8000 palestinianos, Rashid sublinhou a necessidade de obrigar o primeiro-ministro israelita, Ariel Sharon, a respeitar o direito internacional, bem como pressionar os governos árabes para que não se iludam com Sharon e a sua «meia retirada». Para tal, disse, há que «intensificar o trabalho político a nível internacional de apoio à causa palestiniana, com o que contam com a intervenção activa do PCP, que tal como sempre estará na primeira linha de defesa dos legítimos interesses do povo palestiniano».
Também Fayez Badawi alertou para o grande equívoco que é o chamado «roteiro da paz», fazendo notar que a retirada israelita de Gaza pode ser «uma ratoeira, uma mentira», na medida em que os colonos se retiram para a Cisjordânia «como se fosse a terra dos seus pais».
Apresentado como a «única democracia do Médio Oriente», Israel é na verdade um país que pratica uma política baseada em «campos de concentração, presos políticos, muro do apartheid, envenenamento de água potável, postos de controlo, assassinatos selectivos, arranque de árvores, destruição de culturas e todo o tipo de discriminações», sublinhou Badawi. É contra este «Estado democrático» que rejeita o direito ao regresso dos palestinianos à sua terra que importa continuar a luta, disse, pois não haverá paz «sem uma solução global e total», sem um verdadeiro Estado palestiniano livre e independente.
Com a solidariedade do PCP para esta luta contam igualmente a Fatah e a Autoridade Nacional Palestiniana (ANP), cujos representantes deram testemunho do constante apoio recebido dos comunistas portugueses.
A luta não vai parar, garantiu Isaam Besseisso, que encara a retirada dos ocupantes de Gaze como «um primeiro passo, positivo, mas apenas um primeiro passo», pois ninguém pode entrar e sair de Gaza sem autorização de Israel, o que significa que o território agora desocupado continua a ser «uma prisão para um milhão de pessoas».
Reafirmando que a ANP não aceita o «muro racista» nem a Cisjordânia ocupada (58 por cento para Israel e 42 por cento para a Palestina), e que o direito ao regresso dos cerca de cinco milhões de refugiados palestinianos é inalienável, Besseisso garantiu que os palestinianos estão prontos à convivência pacífica, mas «num Estado soberano e independente, com a capital em Jerusalém Oriental».
Silas Cerqueira encerrou o debate lembrando a Conferência de solidariedade com a Palestina realizada em Lisboa em 1979, oportunidade para uma das primeiras deslocações de Yasser Arafat a uma capital europeia. Então como agora, disse, o PCP esteve na primeira linha da solidariedade com a luta do povo da Palestina, «esse grão de areia que tem emperrado o imperialismo» no Médio Oriente. Os perigos são grandes, advertiu Silas Cerqueira, pelo que importa mais do que nunca erguer bem alto a bandeira do internacionalismo, que é também «uma homenagem à memória e ao exemplo de Álvaro Cunhal».
Deixando a alma nas pedras
Deixando a alma nas pedras,
apesar da dor, fica a força.
Deixando a alma nas pedras
o cemitério enche-se.
Valor num rosto manchado
de sangue, esforço e pobreza.
Massacre,
fome na prisão,
nos portos e nos campos.
Deixando a alma nas pedras,
as pedras levam a alma.
Tirando forças do barro,
da chuva tirando forças.
Aos tanques as crianças fazem frente
com pedras.
Terra, onde as almas jazem.
A luta segue e perdura
e, enquanto restar uma criança,
a nossa esperança madura.
Por Palestina
Mariuma Khalaf, Maio de 2004 (10 anos de idade)
Ali Yousef Alnabouti, do Partido Baas Árabe da Síria, Jehad Rashid, da Frente Democrática de Libertação da Palestina, Fayez Badawi, da Frente Popular de Libertação da Palestina, Hana Awad, da Fatah, Isaam Besseisso, embaixador da Autoridade Nacional Palestiniana em Portugal, e Silas Cerqueira, do Conselho Português para a Paz e Cooperação, integraram a mesa moderada por Jorge Cadima.
Coube ao representante da Síria, país exposto ao ataque do imperialismo norte-americano e do seu aliado israelita, lembrar que, a partir dos atentados de 11 de Setembro, os EUA dividiram o mundo em dois blocos: os que são a favor e os que são contra a política dos EUA de pretensa luta contra o terrorismo.
Sublinhando que é Washington quem desde sempre patrocina o terrorismo, como fez no Afeganistão quando o objectivo era atacar a antiga União Soviética, Yousef Alnabouti recordou que continua sem resposta o pedido da Síria para a realização de uma convenção internacional para definir o que é o terrorismo. Não é de estranhar uma tal atitude, já que os principais desestabilizadores do Médio Oriente, EUA e Israel, se empenham em subverter os conceitos, transformando os ocupantes em vítimas e os ocupados em atacantes.
A guerra contra o Iraque, a pretexto das armas de destruição massiva que não existiam, faz parte desta estratégia para redesenhar o mapa da região e permitir ao imperialismo o controlo das suas riquezas naturais (60 por cento dos recursos de petróleo e outros recursos). Mas também aqui, tal como na Palestina, a vida demonstra que a luta dos povos não dá tréguas e que não haverá paz no Médio Oriente ocupado.
A propósito, Alnabouti lembrou que Israel continua a ocupar territórios da Síria, Líbano e Palestina, desrespeitando todas as resoluções da ONU sobre a matéria desde há décadas. Neste caso não há retaliações, mas quando se trata de ameaçar a Síria, o Iraque ou o Irão, então o caso muda de figura, porque há de facto dois pesos e duas medidas ao sabor dos interesses norte-americanos.
A questão palestiniana
A incontornável questão palestiniana, particularmente actual devido à retirada israelita da Faixa de Gaza, dominou o debate. A presença dos representantes de diferentes forças políticas que integram a Organização de Libertação da Palestina (OLP) ajudou a perceber a complexidade de uma luta que, tendo uma causa comum, está longe de ser unívoca.
O mote foi dado por Jehad Rashid, ao sublinhar que a retirada da Faixa de Gaza não é uma concessão de Israel mas antes a manifestação da derrota da política expansionista de Telavive. «Há que estar vigilantes», alertou, porque esta retirada tem de ser «o primeiro passo da retirada total dos territórios ocupados em 1967», o primeiro passo para a efectiva construção de um Estado palestiniano «independente, democrático e laico».
Lembrando que Israel rejeita todos os planos internacionais de paz, acelera a construção de colonatos em Jerusalém, mantém presos cerca de 8000 palestinianos, Rashid sublinhou a necessidade de obrigar o primeiro-ministro israelita, Ariel Sharon, a respeitar o direito internacional, bem como pressionar os governos árabes para que não se iludam com Sharon e a sua «meia retirada». Para tal, disse, há que «intensificar o trabalho político a nível internacional de apoio à causa palestiniana, com o que contam com a intervenção activa do PCP, que tal como sempre estará na primeira linha de defesa dos legítimos interesses do povo palestiniano».
Também Fayez Badawi alertou para o grande equívoco que é o chamado «roteiro da paz», fazendo notar que a retirada israelita de Gaza pode ser «uma ratoeira, uma mentira», na medida em que os colonos se retiram para a Cisjordânia «como se fosse a terra dos seus pais».
Apresentado como a «única democracia do Médio Oriente», Israel é na verdade um país que pratica uma política baseada em «campos de concentração, presos políticos, muro do apartheid, envenenamento de água potável, postos de controlo, assassinatos selectivos, arranque de árvores, destruição de culturas e todo o tipo de discriminações», sublinhou Badawi. É contra este «Estado democrático» que rejeita o direito ao regresso dos palestinianos à sua terra que importa continuar a luta, disse, pois não haverá paz «sem uma solução global e total», sem um verdadeiro Estado palestiniano livre e independente.
Com a solidariedade do PCP para esta luta contam igualmente a Fatah e a Autoridade Nacional Palestiniana (ANP), cujos representantes deram testemunho do constante apoio recebido dos comunistas portugueses.
A luta não vai parar, garantiu Isaam Besseisso, que encara a retirada dos ocupantes de Gaze como «um primeiro passo, positivo, mas apenas um primeiro passo», pois ninguém pode entrar e sair de Gaza sem autorização de Israel, o que significa que o território agora desocupado continua a ser «uma prisão para um milhão de pessoas».
Reafirmando que a ANP não aceita o «muro racista» nem a Cisjordânia ocupada (58 por cento para Israel e 42 por cento para a Palestina), e que o direito ao regresso dos cerca de cinco milhões de refugiados palestinianos é inalienável, Besseisso garantiu que os palestinianos estão prontos à convivência pacífica, mas «num Estado soberano e independente, com a capital em Jerusalém Oriental».
Silas Cerqueira encerrou o debate lembrando a Conferência de solidariedade com a Palestina realizada em Lisboa em 1979, oportunidade para uma das primeiras deslocações de Yasser Arafat a uma capital europeia. Então como agora, disse, o PCP esteve na primeira linha da solidariedade com a luta do povo da Palestina, «esse grão de areia que tem emperrado o imperialismo» no Médio Oriente. Os perigos são grandes, advertiu Silas Cerqueira, pelo que importa mais do que nunca erguer bem alto a bandeira do internacionalismo, que é também «uma homenagem à memória e ao exemplo de Álvaro Cunhal».
Deixando a alma nas pedras
Deixando a alma nas pedras,
apesar da dor, fica a força.
Deixando a alma nas pedras
o cemitério enche-se.
Valor num rosto manchado
de sangue, esforço e pobreza.
Massacre,
fome na prisão,
nos portos e nos campos.
Deixando a alma nas pedras,
as pedras levam a alma.
Tirando forças do barro,
da chuva tirando forças.
Aos tanques as crianças fazem frente
com pedras.
Terra, onde as almas jazem.
A luta segue e perdura
e, enquanto restar uma criança,
a nossa esperança madura.
Por Palestina
Mariuma Khalaf, Maio de 2004 (10 anos de idade)