Mais um banquete para o capital
Um «vergonhoso negócio» que serve apenas interesses privados em prejuízo do interesse público, assim classifica o PCP a venda dos CTT, uma operação que encaixa na política de «traição ao interesse nacional e de ataque às condições de vida dos trabalhadores e populações».
Governo vende a retalho a soberania e a democracia económica
«Pela primeira vez em cinco séculos de história, os correios são entregues aos interesses privados dos grupos económicos», sublinhou o deputado comunista Bruno Dias, para quem o Governo teve o atrevimento de «ir mais longe do que foi a própria ditadura fascista» no que toca aos CTT e ao serviço público postal.
Palavras muito duras que perpassaram toda a declaração política que proferiu na passada semana em nome da sua bancada, dirigidas contra um Governo que em sua opinião está a «vender a retalho a soberania nacional e a democracia económica».
Falando na véspera da muito falada «estreia bolsista» dos CTT, ocorrida dia 5 e tida como ponto alto da privatização, o deputado comunista viu-a como um «obsceno espectáculo de enriquecimento de alguns à custa do empobrecimento de quase todos».
E sobre a propaganda que a precedeu, não poupando na crítica, considerou-a «uma provocação e um insulto». «Os Correios, que são do Estado porque o seu dono é o povo, são desta forma roubados aos portugueses – e os portugueses são convidados a comprar acções na bolsa, da empresa que lhes é roubada», censurou.
Vale tudo
Importante na intervenção de Bruno Dias foi ainda a demonstração do carácter doloso, sob todos os pontos de vista, desta decisão do Governo PSD/CDS-PP.
No plano das contas públicas, especificou, o Estado perde as receitas dos dividendos que deixa de receber, perde receitas fiscais, perde o «controlo estratégico de um serviço público que é factor fundamental de desenvolvimento e qualidade de vida, de coesão territorial na ligação às regiões».
Nada que pareça incomodar ou preocupar os partidos que suportam o Governo, como se voltou a constatar pela reacção no debate à declaração política do PCP. Surgiu pela voz do deputado Luís Menezes (PSD), com este fixado sobretudo em valorizar o encaixe obtido no imediato pelo Estado com a venda dos CTT, o qual nas suas contas míopes será «quase aquilo que receberia por 12 anos de dividendos futuros».
A merecer a dura crítica de Bruno Dias esteve ainda o comportamento do Governo em todo este processo que apelidou de «verdadeiramente escandaloso». O que se assistiu foi ao «transformar de um serviço público num negócio privado», salientou, lembrando que valeu tudo para atingir esse objectivo.
Encerraram-se centenas de estações de correio, arrancaram-se centenas de marcos de correio, degradou-se o serviço postal votando ao abandono as populações, exemplificou, lembrando que em paralelo outras linhas de ataque ganharam terreno atingindo o emprego com direitos e chegando mesmo à destruição de centenas de postos de trabalho.
Venda a retalho
As «maiores suspeitas e preocupações», segundo Bruno Dias levanta igualmente o chamado «protocolo» assinado entre o Governo e os CTT para a criação do que é designado por «Espaços Loja do Cidadão» em estações de correio. As circunstâncias em que tal ocorrerá não são conhecidas, observou, o que se sabe é que está prevista a mobilização de fundos públicos e comunitários, «colocando funções do Estado e da administração pública nas mãos de interesses privados».
Numa prática destinada a favorecer os privados, que Bruno Dias resumiu como sendo a «venda a retalho» da soberania nacional e da democracia económica, o Governo procedeu ainda à alteração do Contrato de Concessão do Serviço Postal, permitindo assim o fecho mais fácil de estações de correio, «aumentos de preços e discriminações tarifárias facilitadas, eliminação do próprio conceito de Rede Pública Postal e do seu Plano de Desenvolvimento».
Sem deixar de notar que com esta privatização a hora é de «banquete» para o Governo e o poder económico, Bruno Dias deixou porém um aviso: «Fazem a festa com o que está a ser roubado ao País e ao povo, mas o povo e os trabalhadores, mais cedo que tarde, hão-de estragar-vos a festa. Porque a luta aí está e vai continuar».
Ouvir o governador
O caminho agora aberto à criação de um Banco Postal, possibilidade negada durante décadas em nome do interesse público, é mais um exemplo de como o Governo aposta tudo em favorecer interesses privados. E por isso o PCP quer ouvir na AR sobre esta matéria o governador do Banco de Portugal, tendo para o efeito requerido na Comissão de Orçamento as diligências para esse efeito.
Concretizando a decisão tomada nas suas recentes Jornadas Parlamentares no Algarve, a bancada comunista formalizou já também a apreciação parlamentar do decreto-lei que altera as bases da concessão do serviço postal universal.