Três dias de uma viagem política e cultural ao Portugal real
Se a Festa é o palco das lutas e tradições do povo, este ano, mais uma vez, todas as realidades do País couberam no seu terreno, numa verdadeira viagem política e cultural pelo Portugal real.
Quem entrou pela Quinta da Princesa, deparou-se, após escassos metros, com uma gigantesca lona, onde se lia «Viana do Castelo», casa de uma exposição sobre os atentados aos centros de trabalho do Partido, tema que ressoou na apresentação do livro Apontamentos sobre os ataques terroristas contra o PCP e os comunistas no Alto Minho 1975/75.
No mais, e entre corações de Viana pintados nas paredes e instrumentos tradicionais, pôde-se apreciar arroz de sarrabulho ou pataniscas de bacalhau.
Descendo para o espaço açoreano, o tema que saltou à vista foram os transportes e a defesa de uma SATA pública, presente quer na sua exposição, quer no debate «Os transportes públicos como factor decisivo para o desenvolvimento da Região Autónoma dos Açores».
A realidade de quem vive afastado em nove ilhas, e os perigos da privatização da companhia aérea regional, foram foco de um espaço onde, também, se pôde apreciar a morcela com ananás ou beber licores de S. Miguel.
Ao lado, erguia-se Viseu, com uma réplica da pintura de José Mouga presente no primeiro centro de trabalho da capital do distrito, inaugurado à 50 anos, e incendiado pela reacção a 1 de Setembro de 1975.
Com a luta dos baldios no cinquentenário da Revolução de Abril presente em debate, e com poesia escrita nas paredes, os comunistas viseenses montaram, ainda, uma «Taberna Beirã», onde se conseguiu degustar produtos tradicionais como caldo de cebola ou rojões.
Um pouco abaixo, Braga deu destaque a Esposende, único concelho com costa marítima no distrito. O mar fez-se presente no azul das ondas pintadas nas paredes, que abriam espaço à pintura de um farol vermelho e ao lema «PCP – Em defesa dos direitos e lutas dos pescadores».
Além de uma banca dedicada em exclusivo ao artesanato regional, o pavilhão contou, também, com um debate sobre os transportes públicos e a ferrovia na região.
Andando mais um pouco, pôde ver-se o pavilhão vermelho ribatejano, que contou com a exposição «Avante com Abril», com 50 primeiras páginas deste jornal, desde 1974, e com o debate «Abril é mais futuro no distrito de Santarém». Nas paredes, textos e desenhos deram vida à resistência na região e às lutas de ontem e de hoje dos trabalhadores e das populações ribatejanas.
Numa banca própria, a vida ganhou-se com produtos típicos como os vinhos regionais ou a tigelada de Abrantes.
Passando para o outro lado da rua, Setúbal erguia-se num pavilhão onde a luta dos trabalhadores foi tema dos diversos murais pintados sobre as paredes brancas. Aqui, além das filas para o choco frito (acompanhado do moscatel de Palmela), houve lugar a expressões políticas como uma exposição e sessão de homenagem a Odete Santos ou os debates «Arrábida reserva da biosfera» e «Plano de Desenvolvimento do PCP para a Península de Setúbal».
Decorreu, ainda, nos três dias, uma exposição de brinquedos em madeira, provenientes da colecção de Hélder Martins.
Seguindo pela Praça da Paz, encontrou-seAveiro que, este ano, deu destaque à luta pela democracia cultural, tendo como lema «Abril é cultura», reflectido em máscaras de teatro, partituras ou teclados de piano pintados nas paredes, vibrando em múltiplas cores rumo a uma derradeira palavra-de-ordem: «A rua também é palco».
«A Revolução de Abril e a democratização da cultura» foi o nome do debate num espaço onde se podiam encontrar os tradicionais ovos moles e moliceiros.
Em Coimbra, mais abaixo, sobre fundo azul escuro, as palavras «O futuro é Abril» e os cravos pintados abriam portas a uma região onde Abril foi mote para a exposição «Memórias da Revolução (18 de Março – 3 de Maio)», com variados objectos e documentos referentes ao período revolucionário.
Aqui, além de se poder comer pastéis de Tentúgal e do Lorvão, assistiu-se ao debate «Abril é futuro!» e à apresentação do número dois da Fábrica, revista do Sector Intelectual, dedicado à revolução.
Antecedido de um gigantesco monumento ao cante alentejano (nos 10 anos da sua elevação a património da Humanidade), o espaço do Alentejo, a par da carne de porco à alentejana ou do bolo de mel, contou com exposições sobre os 100 anos da Casa do Alentejo e sobre o 25 de Abril. Numa parede, erguia-se, também, um mural relativo aos assassinatos de Catarina Eufémia (há 70 anos) e de Caravela e Casquinha (há 45 anos).
Abril e o cante marcaram presença, igualmente, nos debates da região, e a cultura, como um todo, saiu à rua com a animação circulante de vários grupos corais.
Com vista privilegiada para os principais espectáculos da Festa, o Porto afirmou, em variados e coloridos murais, o que é, afinal, Abril: educação, mobilidade, trabalho, habitação. Abril é isto tudo, e os comunistas portuenses souberam afirmar as soluções necessárias para estas diferentes áreas.
Também em foco esteve a cultura, com o debate «Direito à cultura. Direito de Abril», e com as bancas de venda de produtos tradicionais da região (como as mantas de Vila do Conde ou os couros de Amarante).
Ainda na orla do Palco 25 de Abril, o lema «Com os valores de Abril, defender o trabalho e a produção, desenvolver a Beira Interior» sobressaía, em branco, sobre as paredes rubras de Castelo Branco e Guarda.
Temas comuns aos dois distritos predominaram neste espaço, reflectindo-se nos murais pintados (com figuras relativas ao trabalho e à produção), no debate «A luta em defesa da Natureza e ambiente na Beira Interior» e, claro, na gastronomia, com bacalhau à Assis e maranhos.
Continuando a andar, erguia-se, por trás das longas filas para o bolo do caco ou para a poncha, a Madeira, com um mural de homenagem a Rui Nepomuceno, «advogado do povo» e comunista madeirense que faleceu este ano.
Aqui também se pôde ver uma exposição sobre os presos políticos do fascismo na Madeira, inspirado na investigação de Élvio Passos e João Palla Lizardo (com referências a momentos como a revolta das águas da Ponta do Sol), bem como assistir a um debate sobre o mesmo tema.
Leiria, ao lado, além de um forno a lenha onde se vendeu pão com chouriço, contou com um destaque particular ao 25 de Abril, a resistência e a luta do povo leiriense. Também presente na sua exposição esteve a revolta de 18 de Janeiro de 1934, que completa, este ano, o seu 90.º aniversário.
Já o Museu Nacional Resistência e Liberdade, conquista do povo, deu mote para o debate realizado no pavilhão, onde, num canto particular, marcaram presença peças em vidro da Marinha Grande.
Em frente ao espaço do Desporto, Vila Reale o seu chão verdejante foram palco de uma exposição e de um debate sobre a destruição da linha ferroviária do Corgo, com gravosas consequências para a região, impulsionadora de um Interior deixado cada vez mais ao abandono e um exemplo claro dos impactos negativos da política de direita.
Aqui, todos puderam, igualmente, apreciar uma sumarenta posta de raça autóctone da região ou comer doces tradicionais como os cavacórios.
Em baixo, Lisboaafirmou a sua presença com os seus já tradicionais Alfarrabista, Feira da Ladra, Pavilhão do Coleccionador, Sai-Sempre e Palco Fado. A estes, juntaram-se espaços como a churrasqueira e o frango assado, ou a tasca do leitão. Por todo o pavilhão, painéis criados por diferentes artistas deram forma ao lema «És tu quem produz a riqueza! Valorizar o trabalho e os trabalhadores», a par de um mural com primeiras páginas do Avante! e de outro sobre as células de empresa.
No espaço decorreu, também, a apresentação do 31.º Caderno Vermelho e um debate sobre novas tecnologias e a exploração dos trabalhadores.
Descendo mais um pouco, a seguir ao Espaço Central, Bragança, ladeada pela pintura de um gigantesco cravo sob as palavras «Trabalho, honestidade, competência», lema da CDU, apresentou, em consonância, uma exposição e um debate sobre o Poder Local Democrático, conquista de Abril, responsável por muito do progresso das populações do País, mas ameaçado por retrocessos como a extinção de freguesias.
Quanto à gastronomia, o «prato rei» foi a posta mirandesa, a par do mel do Parque de Montesinho.
Por fim, e quase na entrada da Quinta do Cabo, o Algarve esteve presente com um espaço decorado com diversos murais com desenhos relativos a variadas conquistas de Abril (como os salários, a educação ou o SNS), a par do tema em destaque este ano, a habitação, tanto na exposição, que abordou este direito antes e após o 25 de Abril, como no debate «50 anos de Abril! O SAAL e o problema da habitação hoje».
Pôde-se, ainda, comer arroz de marisco ou comprar os tradicionais bolos de amêndoa.