Monotemas e o alvo de sempre
Vivemos há mais de uma semana com um novo monotema a invadir o espaço mediático: a chamada Operação Influencer e a crise política que precipitou – mais um episódio na longa lista de monotemáticas em série: saltamos da COVID para a Ucrânia, de lá para a Palestina. Como se lia num recente artigo de opinião, com triste ironia, António Costa merece o Nobel da Paz pelo feito de ter varrido a guerra da frente dos nossos olhos: a morte e a destruição prosseguem, mas foram varridos para as segundas partes dos noticiários televisivos. Mas esta tendência para reduzir o País e o mundo a um único tema não foi a única a repetir-se, por estes dias, com a crise política e o processo judicial que a precipitou.
A hegemonia dos comentadores e a praga dos tudólogos que, não sendo exclusivo das televisões, ocupam os ecrãs dia e noite. Pode ser uma forma muito barata de encher horas de emissão, mas o desfile de comentadores, na sua maioria ungidos do título (expresso ou implícito) de especialistas no tema do momento (seja qual for, a especialidade pode mudar que os protagonistas são os mesmos), é uma constante. Com a agravante recorrente de, não poucas vezes, os tais especialistas serem jornalistas dos próprios órgãos de comunicação social, esbatendo a linha que devia ser claríssima entre notícia e opinião – dispensando aqui o ridículo a que se continua a prestar a SIC por manter na sua direcção de informação José Gomes Ferreira, que voltou a demonstrar que o seu engajamento político se sobrepõe ao respeito pelos factos a que a sua carteira profissional obriga.
O sensacionalismo é o critério prevalecente de grande parte das redacções, mesmo nos títulos tidos como de referência. As regras elementares da profissão e as obrigações deontológicas desaparecem num ápice quando se trata de expor informações que possam causar impacto – sem preocupação aparente pela devassa da vida privada, pelo rigor, pela isenção e, no caso em concreto, abdicando da função de apurar factos e abordar as informações com espírito crítico e dúvida metódica, assumindo como verdade o que é dito numa escuta telefónica. Foi assim que alguns alimentaram uma tese, tão absurda quanto infundada, de envolvimento do PCP nas suspeitas em causa.
Escreveu-se que os suspeitos terão exercido influência sobre o PCP para desbloquear procedimentos na Câmara Municipal de Sines, a partir de uma conversa escutada em que um dos arguidos faz referência cujo tom revela mais fanfarronice que outra coisa qualquer. Com algumas (poucas) excepções, a tese chegou a páginas de jornal e até emissões de televisão sem qualquer esforço de verificação de verosimilhança dessa hipótese nem sequer uma pergunta feita ao PCP sobre a matéria. Se o tivessem feito (ou tivessem dedicado uns minutos a uma simples pesquisa) perceberiam rapidamente o absurdo: não há qualquer relação de uma citada técnica superior daquela autarquia com o PCP, assim como este apenas tem um vereador em sete (detendo o PS a maioria absoluta) e sempre afirmou reservas aos projectos em causa.
Mas, tal como aconteceu com José Gomes Ferreira e o já célebre tweet falso de António Costa lido em directo, a sede foi tanta em atacar o PCP que nada disto importou na hora de publicar.