«Despacho» de Gaspar arrasado em debate suscitado pelo PCP

Retaliar contra o próprio povo

O PCP considera inadmissível em democracia um despacho paralisante para a administração pública como o exarado pelo ministro das Finanças, vendo no gesto uma concentração de poderes com algo de semelhante ao que Portugal assistiu nos anos 30 do século passado.

Governo não se conforma com as regras da democracia

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«Como é possível que, em democracia, um Governo sequestre o Estado, paralise serviços e tome como reféns as vidas de milhões de portugueses, deixando-as suspensas de uma decisão do agora todo-poderoso ministro das Finanças?», questionou no Parlamento o deputado comunista João Oliveira, há uma semana, na abertura de um debate de actualidade pedido pela sua bancada, no decurso do qual acusou ainda Vítor Gaspar de pretender concentrar em si «todos os poderes, mandar em todos os ministérios e ministros e todos os serviços do Estado».

Desmontando os pontos essenciais da argumentação aduzida no famigerado despacho, nomeadamente quando o titular da pasta das Finanças invoca as «sérias dificuldades no cumprimento dos objectivos» e das metas, procurando com isso responsabilizar o Tribunal Constitucional, o parlamentar do PCP perguntou onde estiveram essas preocupações quando em 2012 o Governo falhou as metas orçamentais e objectivos quanto ao desemprego e à recessão económica.

«Sequestro»

E sobre o alegado prejuízo para a credibilidade externa do País que teria advido da decisão do TC, segundo o Governo, João Oliveira inquiriu se o factor que afecta essa credibilidade reside nas decisões dos tribunais que fazem cumprir as leis e a Constituição ou está no Governo que em dois anos consecutivos aprova orçamentos inconstitucionais, que em vez de cumprir a Lei Fundamental «sequestra» o País.

Sem resposta não ficou ainda a afirmação do Executivo de que o despacho resulta da necessidade de adoptar «medidas que reforcem o controlo da execução orçamental e consequentemente de contenção das despesas do sector público», com João Oliveira a interrogar-se quanto à razão que leva a que não haja esta mesma preocupação quando se trata de «pagar juros usurários aos agiotas e especuladores» ou quando se trata de «enterrar mais e mais dinheiro no buraco do BPN ou na recapitalização da banca».

O secretário de Estado do Orçamento, Luís Morais Sarmento, viria no debate a repetir o essencial dos argumentos, alegando nomeadamente que as «metas orçamentais a que o País está obrigado são muito exigentes», que o «Governo tem de cumprir o Acórdão do TC e que isso obriga a rever o OE» e que para efectuar a revisão do OE o «Governo deve manter toda a flexibilidade», isto é «garantir durante o período de decisão política toda a margem possível».

E disse também que o despacho tem uma vigência temporária – «e necessariamente curta», as palavras são suas –, vigorando «enquanto decorre esta decisão».

Ora a verdade é que o despacho não tem data de validade e, pese embora a afirmação do Governo de que não tem os efeitos que se lhe atribuem, os seus impactes já começaram a sentir-se na generalidade dos serviços do Estado.

Rua com o Governo

Reafirmada pela bancada comunista foi por fim a denúncia de que a política do pacto de agressão e deste Governo, operacionalizada por despachos como este do ministro das Finanças, tem apenas um único objectivo: «o de fazer pagar aos trabalhadores e ao povo por inteiro a crise do capital financeiro e especulativo».

E por isso – e porque «não se conforma com as regras da democracia nem com a Constituição», como anotou João Oliveira – este Governo tem de ser demitido.

À bancada comunista associaram-se na crítica ao Governo os restantes partidos da oposição. Heloísa Apolónia (PEV) condenou a «resposta vingativa» do Governo ao acórdão do TC e valorizou o facto de muitos portugueses «se aperceberam neste momento da importância da Constituição, determinante para salvaguardar a democracia», enquanto Pedro Filipe Soares (BE) viu no despacho a mão de quem tem «uma visão punitiva da democracia, de quem não vive bem com a Constituição da República». Para João Galamba (PS), este despacho que limita despesa, tal como «num passado de má memória», centraliza no ministro das Finanças «o funcionamento da administração pública».

 

Execução orçamental é uma miragem

A ideia de que o despacho é «importante» mas não se refere a «nada e excepciona todas as despesas» já contratualizadas foi sustentada pelo Governo e pelos partidos que o apoiam. Mas se é assim, «por que foi exarado? Que objectivos persegue? Será apenas para levantar o umbigo do ministro Vítor Gaspar e continuar a ofender o Tribunal Constitucional?», indagou o deputado comunista Honório Novo, dirigindo-se ao secretário de Estado do Orçamento, Luís Morais Sarmento.

O parlamentar do PCP quis ainda saber quais as razões que levaram aquele a dizer que o Governo tinha de reorganizar as metas orçamentais. «Porquê? É inevitável? É obrigatório?», inquiriu, deixando uma hipótese de resposta: «ou será porque o Governo alemão e o seu ministro das Finanças mandou o Governo português fazer?»

A verdade é que há alternativa como tratou de demonstrar Honório Novo ao defender que o Governo deveria alterar as metas orçamentais, passar o défice de 5,5% para 6,2%, e, assim, «defender a honra do País, dizendo que em Portugal quem manda mais do que a troika e que o governo alemão é o Tribunal Constitucional». «Faça isso», foi o desafio por si lançado ao governante, que na resposta recusou tal cenário alegando que «não há dinheiro».

Antes, o deputado do PCP considerara, ainda, ser falso que a decisão do TC comprometa a execução orçamental.

Pela razão simples de que esta há muito que «está comprometida», salientou, recordando que já em 2012 o défice passara de 4,5% para 6,4%, com a execução orçamental a derrapar em mais de três mil milhões de euros.

«A execução orçamental em 2013 está comprometida desde que o OE foi aprovado», afiançou, sublinhando que os relatórios da mesma assim o comprovam tendo em conta a subida das despesas com o desemprego (era para ser de 16,4% e já vai em 16,8%), e a derrapagem das receitas fiscais e contributivas.

E por isso a execução orçamental em 2013 «era e é uma miragem», concluiu Honório Novo, para quem o acórdão do TC veio mostrar, tal como acontecera no ano passado, que «este Governo só consegue governar fora da lei».



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