Na rota do declínio e do desastre
Um verdadeiro crime contra os interesses de Portugal e dos portugueses, assim define o PCP o processo de privatizações em curso visando alienar o pouco que ainda resta de importantes empresas públicas.
As privatizações configuram um crime contra a nossa economia
LUSA
«Alguns mil milhões de euros serão arrecadados, sectores importantes passarão para as mãos dos grandes interesses privados nacionais e internacionais, mais trabalhadores irão para o desemprego, o País ficará mais pobre, o tecido económico nacional mais frágil e a dívida pública continuará a crescer», sumariou o deputado comunista José Lourenço, antecipando o cenário que resultará do prosseguimento desta política de lesa pátria e que tem como alvos próximos, entre outras empresas, a ANA- Aeroportos, a TAP, os CTT, áreas da CGD, os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, a CP Carga, transportes urbanos de Lisboa e Porto, a Águas de Portugal, a RTP.
Prosseguir o processo de privatizações é pois aprofundar o caminho de desastre que lhe está associado e que tem vindo a ser imposto ao País, com a «destruição do nosso aparelho produtivo» e o «aprofundamento da nossa dependência externa», assinalou o parlamentar do PCP faz hoje oito dias na declaração política que proferiu em nome da sua bancada.
País lesado
Processo este (são já 240 as operações de privatização realizadas desde 1989 pelos governos PSD, PS e PSD/CDS-PP) a que se junta agora a «venda feita a pataco», donde resulta, tudo junto, concluiu José Lourenço, que o Estado «não só deixou de receber os dividendos proporcionados pelo elevado volume de lucros» das empresas entretanto privatizadas – ascenderam a 39 000 milhões de euros (mais do que renderam ao Estado com a sua privatização) os lucros líquidos entre 2004 e 2011 obtidos só pelos grandes grupos económicos que resultaram do processo de privatizações e que estão no PSI 20 –, como não obteve compensação em termos do IRC por si cobrado, uma vez que todos esses novos grupos económicos têm agora as suas sedes fiscais em paraísos fiscais, furtando-se assim ao pagamento de «milhares de milhões de euros em impostos».
Indo ao fundo da questão, José Lourenço lembrou ainda que as privatizações são «uma das pedras angulares da política neoliberal» que norteia há décadas a acção de sucessivos governos, «sempre acompanhada pela liberalização dos mercados e a desregulamentação dos mecanismos de orientação e direcção económica».
Com os resultados que se conhece e que são hoje o triste e lamentável retrato do País: «desemprego profundo, com mais de um milhão e trezentos mil trabalhadores desempregados, dívidas elevadíssimas, défices permanentes e cada vez mais acentuados, enormes dependências e desigualdades sociais que se vão acentuando».
Monopólios em grande
Recusando que a redução da dívida pública possa servir de justificação para as privatizações, como falaciosamente tem sido dito pelos círculos governantes (ver caixa), o parlamentar comunista sublinhou que o verdadeiro objectivo que lhes esteve sempre subjacente, ainda que não confessado, «foi sem qualquer dúvida a reconstituição dos grupos económicos monopolistas, liquidados pelo 25 de Abril e pelas nacionalizações».
Reconstituição de grupos económicos privados feita «à luz dos seus interesses dominantes», «subalternizando e espezinhando os interesses nacionais», «em áreas a coberto da chamada concorrência externa e na produção dos chamados bens não transacionáveis», «segundo o seu muito antigo, conhecido e natural critério de racionalidade: a maximização da taxa de lucro», como bem lembrou José Lourenço.
Uma realidade que dá razão à exigência de uma outra política, como reclama o PCP, uma política «em que o poder económico se subordine ao poder político, em que o Estado tenha uma posição dominante nos sectores estratégicos da nossa economia», que «suspenda todo este criminoso processo de privatizações e reverta para o sector público, por nacionalização e/ou negociação adequada, empresas e sectores privatizados».
Buraco sem fundo
Desmontado por José Lourenço foi o argumento invocado vezes sem conta segundo o qual por trás das privatizações está o objectivo de reduzir a dívida pública. Comprovando que essa é mais uma falácia destinada a mascarar as verdadeiras razões, recordou, desde logo, que por altura do início das privatizações – 1989 – a dívida bruta do Estado representava 54,3 por cento do PIB, sendo que hoje essa dívida corresponde a 120 por cento do PIB. Ou seja, 23 anos decorridos desde o início da sangria do nosso melhor património público com a sua passagem para mãos privadas, depois de os governos terem arrecadado cerca de 32 mil milhões de euros a preços correntes, a dívida pública mais do que duplicou.
«A dívida pública transformou-se num buraco sem fim nem fundo, onde desapareceram milhões e milhões de euros», acusou o deputado do PCP.
As responsabilidades do PS
A declaração política de José Lourenço suscitou reacções das várias bancadas, com o PS, por exemplo, pela voz de Basílio Horta, a afirmar que «não é favorável às privatizações» em sectores estratégicos para a economia nacional, isto depois de ter ensaiado o seu já habitual número de vitimização sob o pretexto de que o PCP «olha para o PS como alvo» e o «cola a políticas que não são as suas».
Preto no branco, avivando a memória dos deputados que se sentam na bancada do PS, José Lourenço recordou que desde 1995, pela mão daquele partido sob a direcção de Guterres e Sócrates, foram privatizadas a Petrogal, a EDP (sector da energia), a PT (sector das telecomunicações), a Secil e Cimpor (cimentos), Portucel e Soporcel (pasta de papel), Quimigal, Companhia Nacional Petroquímica (sector químico), Siderurgia Nacional (sector siderúrgico).
«Se isto não são empresas do sectores estratégicos, estamos conversados», rematou o parlamentar do PCP, considerando «espantoso» que depois daquele rol o PS venha dizer que é contra as privatizações, mais ainda quando é sabido que no PEC IV estavam já inscritas todas as privatizações que o Governo actual tem na calha.
À deputada Carina Oliveira (PSD), por sua vez, que em defesa das posições do Governo sustentou que «o Estado não tem de ser dono de aviões», referindo-se à TAP, José Lourenço respondeu salientando que independentemente de ter ou não aviões o que o Estado tem é que «defender o interesse público», coisa que este Governo não faz.
E depois de sublinhar que «as empresas não são rentáveis pelo facto de serem privadas ou públicas», perguntou se não dá que pensar o facto de só as empresas privatizadas do PSI 20, em oito anos, terem rendido mais em lucros para os seus accionistas do que aquilo que o Estado obteve aquando da sua privatização.