Cúmplices da mesma política
A primeira intervenção do deputado Carlos Zorrinho, na sua qualidade de novo líder parlamentar do PS, foi recebida sem surpresa por Bernardino Soares, que dela disse ser «o que se esperava».
«É mais ou menos aquela intervenção do partido que agora não tem nada a ver com isto, que chegou agora aqui e não está muito de acordo com o que se está a passar», ironizou, certeiro, o presidente da bancada comunista, dirigindo-se ao deputado do PS que acabara de proferir uma declaração política onde esteve patente a pretensão de projectar a imagem de «um novo PS, próximo das pessoas».
O deputado do PCP fez-lhe notar, porém, que o PS, primeiro subscritor do acordo com a troika, não pode agora desligar-se daquilo com que se comprometeu, «nem fingir – divergindo no acessório para concordar no essencial – que não está amarrado a este programa de destruição do País, que é aquele que está a ser aplicado pelo actual Governo, com a sua total colaboração, conivência e responsabilidade».
E parafraseando a troca de mimos a que se assistira momentos antes entre PSD e PS, com o primeiro a dizer que este tinha mudado de «gerência» e, consequentemente, de «estilo», e o segundo a responder que o seu interlocutor tinha mudado de «negócio», Bernardino Soares não pôde deixar de concluir que o que se passou no País com este Governo é que «mudou a gerência mas não mudou o negócio».
«O negócio é o mesmo, a política é a mesma e os resultados serão igualmente desastrosos com este Governo, como foram com o PS», avisou.
História mal contada
E sobre a estafada teoria da alegada convergência partidária que teria levado ao derrube do governo do PS, o líder parlamentar do PCP tratou de lembrar que não foi isso que se passou mas sim uma outra coisa: o primeiro-ministro José Sócrates é que se demitiu.
Repondo a verdade dos factos, recordou ainda que o PCP esteve sempre contra todas as medidas gravosas dos vários PEC apresentados pelo governo de três em três meses, contrariamente ao PSD que foi sempre um apoiante firme do PS em todos os PEC e orçamentos do Estado e só no PEC IV, por tacticismo, resolveu não lhe dar apoio e tirar o tapete.
«O que não apaga o facto de ter sido cúmplice e co-responsável pela política do anterior governo, tal como o PS é cúmplice agora do PSD», acusou ainda Bernardino Soares, exemplificando, a propósito, com a muito recente proposta do partido de António José Seguro sobre a tributação extraordinária das empresas com mais de um milhão e meio de euros de lucro.
A questão é que ainda em Junho, por altura do debate do roubo do subsídio de Natal aos portugueses, perante a proposta do PCP dirigida exactamente naquele sentido, o PS não a votou favoravelmente, lembrou o líder parlamentar do PCP, inquirindo se por acaso ainda não tinha sido por aquele detectada a enorme injustiça que o Governo PSD-CDS/PP estava a praticar.
Daí que Bernardino Soares tenha aconselhado Carlos Zorrinho a não se indignar muito com a proposta de colocar a meia-haste as bandeiras dos países em dificuldades com a sua dívida pública, como sugeriu um ministro alemão. É que se esta proposta só pode merecer «uma reacção firme de todos aqueles que defendem Portugal e a nossa soberania», a verdade é que o PS assinou «um acordo de submissão com a troika que é muito pior do que a bandeira a meia-haste, porque é pôr a soberania a meia-haste», sustentou Bernardino Soares.
Carlos Zorrinho, na réplica, num exercício de equilíbrio impossível, falou do compromisso com a troika – que afirmou ser para respeitar –, dizendo simultaneamente não acompanhar a sua execução sob o pretexto de que nele não constam algumas medidas tomadas pelo Governo, como o aumento dos transportes ou da taxa máxima para a electricidade.