A Comissão e o Livro Branco

No final de 2006, o Governo de José Sócrates e Vieira da Silva criou a Comissão do Livro Branco das Relações Laborais, para preparar uma revisão do Código do Trabalho (e não apenas a alteração dos aspectos gravosos deste). Esta revisão mais ampla já surge na linha antes seguida pelo Governo do PSD/CDS-PP e o argumento é o mesmo: há que flexibilizar as relações laborais, para aumentar a produtividade e a competitividade.

Quem está na Comissão?

A composição da Comissão tem um pendor fortemente governamentalizado (dois dos seus membros acabaram por demitir-se):
- o presidente e o relator foram secretários de Estado de governos do PS;
- dos 9 vogais em exercício, 5 são funcionários superiores do Ministério do Trabalho e 2 são conhecidos assessores da CIP.

O que diz o Livro Branco?

O Livro Branco das Relações Laborais tem, essencialmente, duas partes, distintas entre si:
- a análise do mercado de trabalho, baseada nos números oficiais, regista o crescimento do desemprego, o aumento da precariedade, o bloqueamento da contratação colectiva, os problemas com a produtividade... (mas ficam de fora as razões da baixa produtividade);
- as propostas de alteração da legislação, ao invés de atacarem as causas daqueles problemas, preconizam o agravamento das normas responsáveis por eles.
As propostas foram resumidas às temáticas nucleares, enunciadas pelo ministro do Trabalho em sucessivas intervenções públicas e conhecidas por «mobilidade interna»:
- contrato individual de trabalho (perpetuar a contratação individual, legalizando a precariedade como regra);
- adaptabilidade (flexibilidade) dos horários, de modo a alargar a duração do trabalho (até 12 diárias e 60 horas semanais);
- descanso semanal (flexibilizar e precarizar, para liquidar um dia);
- trabalho a tempo parcial (impulsionar o pagamento como parcial, mesmo com trabalhadores a tempo completo);
- trabalho suplementar (liquidar ou reduzir o pagamento das horas de trabalho para além do horário normal);
- as férias (reduzidas em 3 dias);
- a mobilidade funcional e geográfica (obrigar o trabalhador a fazer tudo e impor a colocação em qualquer instalação da empresa);
- facilitar e embaratecer o despedimento individual e colectivo, mesmo sem justa causa.
Ataca ainda a organização sindical, com a aferição da representatividade e com condicionantes no direito de representação, de negociação e de vinculação dos trabalhadores às convenções colectivas.
E insiste, de forma qualitativamente nova, na caducidade da contratação colectiva, procurando liquidar, expressamente, os cerca de 150 contratos colectivos de trabalho, que foram defendidos com êxito nas anteriores ofensivas.


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