Desmentindo a imagem do País cor-de-rosa

Números que exigem mudança

Há quem viva num Portugal cor-de-rosa. Mas outra realidade emerge já nos números oficiais, a dar razão aos que, como o PCP, exigem a alteração da política.
Os baixos salários e as magras pensões, o aumento real do custo de vida, os elevados níveis de desemprego e de precariedade, as gritantes desigualdades económicas e sociais carregam de tons negros o País que não vive da especulação financeira, da exploração do trabalho, de negócios-subsídios oriundos do Estado ou da União Europeia.
Os dados que aqui publicamos são conhecidos. Muitos deles foram referidos na recente Conferência Nacional do PCP sobre questões económicas e sociais. Alguns até são referidos «com preocupação» por titulares de responsabilidades pelo seu agravamento.
Estes números fazem crescer outro: o número daqueles que sentem a necessidade de mudar de rumo e que se juntam ao PCP na exigência de uma política ao serviço do povo e do País.


Milhões crescentes
correm para o capital


Entre 2004 e 2006, os lucros da banca cresceram 135 por cento.
Em 2006, os lucros das 500 maiores empresas não financeiras aumentaram 67 por cento. Nesse ano, os lucros dos cinco maiores grupos bancários, somados aos da e Sonae, ultrapassaram 5 mil milhões de euros. E em 2007 continuaram a subir (mais 22 por cento, só no primeiro semestre). Os bancos e seguradoras alcançaram os lucros mais elevados de sempre (2 721 e 704 milhões de euros, respectivamente).
Só no primeiro semestre de 2007, os lucros das grandes companhias petrolíferas aumentaram 71 por cento, relativamente ao mesmo semestre de 2006, enquanto os lucros dos bancos cresceram 25 por cento.
No final de 2007, a lista das cem pessoas mais ricas do País juntou fortunas no valor de 34 mil milhões de euros (mais 36 por cento do que 2006), o que representa quase um quarto da riqueza produzida em Portugal e equivale a um salário mensal de 500 euros, pago a um milhão de trabalhadores, durante 5 anos.
São generosamente recompensados vários «gestores de topo» (que, por regra, fazem carreira associados a grupos económicos e aos partidos do «centrão»). Paulo Teixeira Pinto, ex-presidente do BCP, saiu com uma indemnização de 10 milhões de euros e uma pensão anual de 500 mil euros (mais de 35 mil euros por mês). Excluindo as remunerações variáveis (que representam outro tanto!), Henrique Granadeiro e administradores da PT recebem quase 87 mil euros por mês; a Brisa paga 137 mil euros; o BCP, 211 mil euros; a Sonae, 65 mil; o BPI, 62 mil; o BES e a Semapa, 50 mil.

Dar a quem mais tem
foi a opção no OE


No Orçamento de Estado para 2008, quase duplicaram os benefícios fiscais destinados ao off-shore da Madeira, que passaram de mil milhões de euros, em 2007, para 1 780 milhões. Esta verba representa 44 por cento do défice das contas públicas previsto para este ano.
Ficaram apartados 1 200 milhões de euros, para estudos e pareceres, muitos dos quais vão alimentar a clientela que gravita ao redor da oligarquia que tem o comando do País.
O mesmo Governo e o mesmo PS que decidiram estas benesses, impuseram aos reformados um novo agravamento dos impostos, colocaram os salários da Administração Pública a perder poder de compra pelo sétimo ano consecutivo e recusaram a descida faseada do IVA, proposta pelo PCP.

Subida dos preços
acima da inflação


No início do ano ocorreu um novo aumento generalizado de preços, em regra superiores à inflação prevista pelo Governo e que é esgrimida para travar a justa actualização de salários. Os portugueses têm que pagar mais 3,9 por cento nos transportes; até mais 30 por cento no pão; mais 5 a 10 por cento, nos restantes produtos alimentares (e ainda mais no leite e derivados); mais 2,9 por cento na electricidade; mais 4,3 a 5,2 por cento no gás; mais 2,6 por cento nas portagens. Na saúde, em 2007, as despesas subiram em média 7,5 por cento, o triplo da inflação registada; só os custos dos serviços hospitalares cresceram 53,8 por cento; e o Governo tenciona aumentar as taxas moderadoras em 4 por cento.
O aumento das taxas de juro sobrecarrega os orçamentos de um milhão e seiscentas mil famílias com empréstimos para habitação, cujas taxas de juro subiram quase 25 por cento em 2007. No ano anterior, já tinham disparado 46 por cento. Esta subida das taxas, no ano passado, traduziu-se, em média, num aumento de cerca de 13 por cento nas prestações mensais, segundo uma estimativa do Diário de Notícias (2 de Janeiro).
Acresce a subida do preço dos combustíveis...

O recorde no desemprego
com menos apoio social


Os níveis de desemprego são os mais elevados desde Abril de 1974, afectando 451 mil trabalhadores (média dos três primeiros trimestres de 2007), com uma taxa de 8 por cento, em sentido restrito (em sentido lato, incluindo as categorias estatísticas dos «inactivos disponíveis» e do «subemprego visível», são 595 mil desempregados e 10,5 por cento).
A taxa anual de desemprego está em crescimento desde 2001, e desde 2002 sobe o desemprego de longa duração (12 meses ou mais).
Entre o 1.º trimestre de 2004 e o 3.º trimestre de 2007, o número de desempregados aumentou 29 por cento (de 347 200 para 444 400), mas passaram a receber subsídio de desemprego menos 9 por cento (de 290 200 para 264 200). A percentagem de desempregados com direito a subsídio desceu de 89,6 por cento para apenas 59,5 por cento.

Campeões da desigualdade
na divisão de rendimentos


A parte dos salários no rendimento nacional, que atingiu 59 por cento em 1975, era de 40 por cento em 2004.
Em 2005, Portugal apresenta o maior nível de desigualdade de rendimentos entre os estados membros da UE27. Na relação entre as partes recebidas pelos 20 por cento com maiores rendimentos e os 20 por cento com menores rendimentos, Portugal (e Lituânia) apresentavam um rácio de 6,9 (a média da UE25 era 4,9 e o rácio mais baixo pertencia à Finlândia, com 3,5). Em 2006, este indicador baixou... para 6,8.

Pobreza aumenta
nos trabalhadores


Quase dois milhões de pessoas estão em risco de pobreza, com o INE a revelar, no dia 15, que esta situação abrangeu, no inquérito de 2006, 18 por cento da população residente (com rendimentos até 366 euros por mês, por adulto equivalente).
Em 2004, 12,2 por cento dos assalariados trabalhando a tempo completo recebiam menos de dois terços do ganho mediano (Quadros de Pessoal), uma indicação da incidência da pobreza laboral.
O estudo a «Pobreza em Portugal» revelou que 40 por cento dos pobres são trabalhadores por conta própria ou por conta de outrem. Em cada quatro assalariados a tempo inteiro, um aufere salário de base que não supera o salário mínimo nacional em mais de 15 por cento.
O salário mínimo afastou-se progressivamente do salário médio (de 68 por cento, em 1981, para menos de 50 por cento, em 2004).
Ainda mais grave se apresenta a situação das mulheres, cujo salário médio, em 2005, era de cerca de 77 por cento do dos homens. O indicador de baixos salários (até dois terços do ganho salarial mediano) teve no final do período analisado pela Comissão do Livro Branco (1995-2005), quando equivalia a 432 euros, o ponto mais elevado dos últimos sete anos (12,8 por cento do total de trabalhadores e trabalhadoras a tempo completo e com remuneração completa); mas era de 18,6 por cento, para as mulheres, e de 8,6 por cento, para os homens.

Migalhas
e indignidade


As pensões (de reforma e outras) tiveram, este ano, aumentos diários médios que se situam entre 21 cêntimos e 32 cêntimos, no regime contributivo, e que foram de 16 cêntimos, no caso da pensão social, e 19 cêntimos, nos agrícolas. Graves perdas sofrem ainda com a aplicação da nova fórmula de cálculo e do «factor de sustentabilidade», que o Governo PS introduziu.
Em 2004, a pensão média de velhice das mulheres correspondia a 61 por cento da dos homens; no caso da pensão por invalidez, representava 75 por cento.


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