Encontro nacional lança debate e propostas para política alternativa de Protecção Civil

O Encontro Nacional do PCP «Do papel e política do Estado aos meios necessários – Uma outra política de Protecção Civil», no passado sábado, propôs medidas para o curto prazo e ideias e soluções de fundo.

«Com confiança e audácia, vamos falar, esclarecer, tomar a iniciativa»

O Encontro teve lugar no auditório dos Bombeiros Voluntários de Sacavém (Loures), durante a manhã e a tarde de 28 de Outubro, e contou com a participação de cerca de uma centena de militantes comunistas e pessoas sem filiação partidária, que trabalham nas diversas áreas da Protecção Civil ou que acompanham este tema, na sua actividade política regular, vindos de todo o País.

Em 31 intervenções, falou-se de: ordenamento do território; papel das autarquias (municípios e freguesias); criação das Regiões Administrativas; papel supletivo das Forças Armadas (abordado por Rui Fernandes, da Comissão Política do Comité Central do PCP); movimento associativo dos bombeiros (principal pilar da protecção e socorro, que tem no financiamento o principal problema, como referiram vários dirigentes de associações humanitárias de bombeiros voluntários); forças de segurança e coordenação com a Protecção Civil; actividade do PCP na Assembleia da República e no Parlamento Europeu (com intervenções dos deputados Alma Rivera, João Dias e João Pimenta Lopes); a Força Especial de Protecção Civil; SIRESP e comunicações; prevenção e segurança nos aeroportos e aeródromos; aquisição progressiva de meios aéreos pelo Estado, através da ANEPC; problemas dos bombeiros profissionais e dos sapadores florestais (carreira, salários, suplemento de risco, reforma aos 55 anos de idade ou 36 de serviço); valorização dos bombeiros e todos os agentes e trabalhadores da Protecção Civil, sua protecção social; desordenamento florestal, abandono do mundo rural e despovoamento do interior (abordado por João Frazão, da Comissão Política do CC do PCP); as Equipas de Intervenção Permanente, número, pagamento às associações de bombeiros (AHBV); transporte de doentes e atendimento nos hospitais; socorro marítimo, vigilância e salvamento nas praias; como prevenir cheias (exemplo da solução promovida em Loures e Sacavém, com a Câmara Municipal de maioria CDU); a diferença entre o muito que foi anunciado depois dos grandes incêndios (Serra da Estrela e distrito de Leiria) e o muito pouco que foi feito; especificidades da situação nas regiões autónomas dos Açores e da Madeira; actividade do INEM; planeamento civil de emergência.

Com luta e reforço do PCP

«As conclusões que aqui tirámos, as intervenções que aqui foram feitas, os contributos que aqui se expressaram correspondem à realidade, correspondem às dificuldades que se expressam no terreno todos os dias, correspondem às tristezas mas também às alegrias de quem salva, de quem protege, de quem age pelo bem comum» – comentou o Secretário-Geral do PCP, que esteve presente desde início e interveio no encerramento.

Paulo Raimundo lembrou que «quem está ligado à realidade conhece e sente a vida e tem a razão do seu lado», apelando: «Vamos, então, com essa razão que temos; vamos, então, com as propostas que temos e que são as que correspondem às necessidades; vamos, então, com confiança e audácia, falar, esclarecer, tomar a iniciativa, para ampliar a consciência de que é necessária uma política alternativa», a qual «é possível com a luta de todos e o reforço do PCP».

Na abertura, Octávio Augusto, responsável pelas questões da Protecção Civil na Comissão Política do Comité Central do Partido, explicou que a realização do Encontro resultou «da necessidade de procedermos a uma análise mais sistematizada dos inúmeros e crescentes problemas» nesta área e, «ao mesmo tempo, elaborarmos um conjunto de propostas alternativas ao actual modelo».

Por um lado, trata-se de «propostas de curto prazo, como as que temos vindo a apresentar na Assembleia da República e aquelas que iremos formular e que, a serem aprovadas, introduzirão profundas alterações no Orçamento do Estado para o próximo ano». Por outro lado, há «propostas de fundo, que visam apresentar um modelo alternativo ao actual sistema de Protecção Civil».

O Encontro Nacional foi precedido de «um vasto debate no Partido, com reuniões nos distritos de Faro, Évora, Portalegre, Setúbal, Lisboa, Santarém e Leiria» e «várias reuniões temáticas, para aprofundar matérias como o socorro na orla marítima, o papel das Forças Armadas e, em particular, da Força Aérea, o papel das autarquias, os problemas dos trabalhadores».

Houve ainda «um importante processo de discussão, de recolha de opiniões, de contacto directo com a realidade», quer a partir dos deputados comunistas na Assembleia da República e no Parlamento Europeu, quer por iniciativa das organizações regionais e concelhias do PCP. Tiveram lugar reuniões e contactos com a Liga dos Bombeiros e várias das suas federações, foram visitadas dezenas de associações de bombeiros e serviços da Protecção Civil, câmaras municipais e juntas de Freguesia, sindicatos e outras entidades.

Na Resolução saída do Encontro – que prevê a promoção de uma jornada de divulgação das conclusões junto de bombeiros e outros agentes de Protecção Civil – faz-se uma apreciação crítica da actual situação.

Defende-se linhas estruturantes de um «sistema de Protecção Civil inovador, moderno e suportado num pensamento estratégico» e caracteriza-se este sistema (subordinado a uma visão integrada de políticas públicas). Define-se as medidas necessárias, a nível da União Europeia, das autarquias locais, dos bombeiros, das Forças Armadas e forças de segurança, de equipamentos e infra-estruturas, recursos humanos, meios aéreos e SIRESP.

 

Medidas imediatas

Por fim, o PCP avança com 12 medidas imediatas, começando por propor que na AR se realize um debate sobre a Protecção Civil de que o País precisa. A maior parte destas medidas vai traduzir-se em propostas de alteração, no âmbito da discussão do Orçamento do Estado para 2024, designadamente com vista a:

– Aumentar para 52 milhões de euros a verba de suporte ao financiamento das associações humanitárias de bombeiros voluntários (AHBV), detentoras de corpos de bombeiros;

– Na Lei 94/2015 (sobre este financiamento), eliminar a norma que impede cada associação de ter uma variação positiva do financiamento superior a 10 por cento, face ao ano precedente;

– Inserir uma verba, a transferir para as câmaras, que assegure a sustentabilidade do dispositivo de Protecção Civil municipal (incluindo a efectiva estruturação dos serviços municipais de Protecção Civil, de acordo com a Carta de Risco de cada município);

– Utilizar os fundos do PRR para investimento no sistema de Protecção Civil, nomeadamente quanto ao reforço de meios humanos e de equipamento nos corpos de bombeiros;

– Garantir aos bombeiros o combustível de emergência, isento de IVA;

– Apoiar com 70 milhões de euros as obras de manutenção e requalificação em quartéis;

– Disponibilizar 30 milhões de euros para retirada do fibrocimento dos quartéis;

– Apoiar em 660 mil euros a revisão/manutenção das auto-escadas;

– Promover a revisão do protocolo entre as AHBV e o INEM e a ANEPC, de modo a contemplar os valores que cubram de modo integral os custos efectivos dos serviços prestados e do equipamento e materiais utilizados;

– Melhorar os seguros de todos os agentes de Protecção Civil.

 

A Protecção Civil de que o País precisa

Para o PCP, como se afirma na Resolução do Encontro Nacional, urge:

1. Integrar a Protecção Civil como elemento obrigatório dos diferentes instrumentos de planeamento e ordenamento do território e urbanístico, designadamente o Programa Nacional (PNPOT), os planos regionais (PROT) e os planos directores municipais (PDM);

2. Promover uma acção permanente de sensibilização e informação sobre identificação e redução de riscos;

3. Integrar a Protecção Civil nos currículos de todos os níveis de ensino e nas actividades extra-curriculares;

4. Promover a cabal aplicação da Lei de Bases da Política Florestal e assegurar a reflorestação ordenada das áreas ardidas;

5. Dotar as áreas protegidas, em particular as que têm área florestal, com os adequados meios de vigilância, socorro e combate aos incêndios florestais e a outros acidentes;

6. Direccionar e rentabilizar recursos financeiros de programas comunitários, de forma convergente, para o desenvolvimento da política nacional de Protecção Civil;

7. Assegurar uma ampla participação de todos os agentes da Protecção Civil e da população em geral, num debate público (para além dos grupos de trabalho constituídos junto do Governo) sobre a adequação da legislação e respectiva regulamentação;

8. Actualizar a legislação direccionada para a prevenção e combate aos riscos tecnológicos, designadamente nas empresas e nos grandes complexos industriais e zonas envolventes;

9. Promover a alteração da Lei de Bases da Protecção Civil, antecedendo o processo legislativo de um amplo e participado debate, quanto ao modelo de sistema que ela deverá reflectir.

 

O grande falhanço

«A importância da Protecção Civil vai muito para além dos incêndios rurais. Os incêndios urbanos, cheias, sismos, orla marítima, seca, desastres industriais e fenómenos inesperados constituem também preocupações da Protecção Civil aos diversos níveis. Veja-se o importante papel dos agentes de Protecção Civil durante a epidemia.

Hoje é muito evidente a centralidade da Protecção Civil face a catástrofes e fenómenos extremos, uma centralidade ligada à necessária inversão de opções erradas, como são o uso intensivo dos solos, o crescimento industrial e urbano desordenado, o abandono rural e a desertificação.

A segurança das populações está profundamente ligada à valorização do Interior, ao investimento e abertura de serviços públicos, desenvolvimento ordenado do território, apoios à agricultura, incentivo à fixação de populações, reforço dos transportes públicos e outras medidas que impactem directamente no ambiente e protejam os interesses do povo.

A segurança das populações e a Protecção Civil passam necessariamente, também, por outra política, que coloque como elemento estratégico a prevenção. As catástrofes e fenómenos extremos, mesmo tendo um alto grau de imprevisibilidade, podem e devem ser prevenidos e minimizados.

A catástrofe de 20 de Fevereiro de 2010 na Madeira e os dramáticos incêndios de 2017 desencadearam uma ampla discussão na sociedade portuguesa sobre o que falhou. E falhou de facto muita coisa, mas o grande falhanço foi a política. Sucessivos governos conduziram o País ao desordenamento florestal e territorial e à falta de prevenção.

Acontecimentos com particular gravidade, mas que não são caso isolado.

Ninguém pode prometer que situações dramáticas como as ocorridas nunca mais e em nenhuma circunstância voltam a acontecer.

Mas isso não significa que não se deve adoptar as medidas que os previnam e enfrentem os problemas concretos com vista à sua superação, desde logo no urgente reforço de meios financeiros, técnicos e humanos, os quais continuam aquém do necessário.»

Excerto da intervenção de Paulo Raimundo , Secretário-Geral do PCP

 



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