Votos, contas e nada de vida

O Orçamento do Estado para 2024 está, neste momento, em discussão na Assembleia da República, num processo que se vai prolongar até final de Novembro. Este é um dos momentos em que, todos os anos, as editorias de política e de economia dos órgãos de comunicação social se concentram nas conferências de imprensa de apresentação do Orçamento, nas reacções, nas propostas de alteração, nas votações, nos números, por aí fora.

É curioso observar as diferentes abordagens feitas pela política e pela economia: os primeiros preocupados em saber sentidos de voto, quem faz mais propostas de alteração ou em fazer leituras de convergências ou divergências nas votações; os segundos mais focados nos números, em cálculos sobre a carga fiscal, o excedente e o rácio da dívida. Em comum, no geral, está a ausência das consequências para a vida de cada um (no salário, na pensão ou no funcionamento dos serviços públicos) nas peças e nas análises que uns e outros fazem – ou, dito de outra forma, uma marca de classe no olhar sobre o Orçamento do Estado.

Na actual discussão orçamental tivemos um novo exemplo disto mesmo, com a «polémica» em torno do aumento do Imposto Único de Circulação (IUC). As aspas não pretendem menorizar a injustiça que a medida implica, mas a forma como os media a alimentaram, indo ao encontro do interesse daqueles que não querem discutir as opções de fundo presentes no documento: seja o PS, o seu autor, sejam aqueles que fariam as mesmas opções se pudessem.

Vejamos a desproporção: ao longo do mês de Outubro, nos noticiários das 13h00 e das 20h00 o IUC foi tema principal em pelo menos 11 peças na RTP1, 15 na SIC e 10 na TVI. Por comparação, o aumento de pensões foi tema principal em apenas 2 peças na RTP1, 3 na SIC e 2 na TVI. A comparação podia ser feita com peças sobre salários ou, ainda, a partir da imprensa escrita, e os resultados seriam idênticos (o que revela um outro sintoma da pobreza do nosso cenário mediático, em que televisões, rádios e jornais tocam quase todos pela mesma batuta – mudamos de títulos mas o conteúdo é sempre o mesmo).

Quando ouvirmos comentadores a dizer que este é o Orçamento do IUC, praticamente reduzindo a sua análise às opções do Governo a essa medida e passando ao lado dos aspectos que afectam a vida de quem trabalha e trabalhou – o salário, a pensão, a habitação ou a situação no SNS –, estão a cumprir um papel. São mais uma peça na formatação mediática. O Governo, claramente, agradece o feito: se assim não fosse, o primeiro-ministro não teria dedicado longos minutos do seu discurso no início da discussão do Orçamento do Estado na generalidade, na passada segunda-feira.

Como o Secretário-Geral do PCP, Paulo Raimundo, afirmou no último sábado, o Governo até pode deixar cair o aumento do IUC que o Orçamento que defende continua a ter a marca da injustiça fiscal.




Mais artigos de: PCP

O distrito da Guarda não está condenado

De 25 a 27 de Outubro decorreram as jornadas dos deputados do PCP no Parlamento Europeu (PE) no distrito da Guarda, as quais privilegiaram o contacto directo com trabalhadores e populações, com os pequenos e médios produtores e empresas, com utentes de saúde e outros serviços públicos.

Faleceu Margarida Tengarrinha

O Secretariado do Comité Central do PCP informou, dia 26, «com profundo pesar», que faleceu Maria Margarida Carmo Tengarrinha. «Nascida a 7 de Maio de 1928 em Portimão, Margarida Tengarrinha, desde jovem, participou nas lutas estudantis de 1949 e 1954 em Lisboa, tendo sido membro da Direcção...

Veto dá razão ao PCP

Reagindo ao veto do Presidente da República ao diploma do Governo de privatização da TAP, o PCP considerou que «as razões invocadas (...) são em si mesmo a comprovação e confirmação de que a defesa dos interesses nacionais são incompatíveis com esse crime económico que a privatização da empresa representaria». Em nota...

Saiu O Militante

Está disponível desde hoje a mais recente edição da revista O Militante, correspondente aos meses de Novembro e Dezembro, com o título de capa «Não nos resignamos, lutamos: A alternativa constrói-se na luta», que remete para o texto de Abertura. Para além do comunicado da reunião do Comité...