Os coveiros

Anabela Fino

As eleições gerais antecipadas em Espanha, no próximo dia 23 de Julho, podem levar ao poder, se as sondagens derem certo, o partido de extrema-direita Vox, com quem o Partido Popular, de direita, tem vindo a estabelecer acordos após a derrota do PSOE nas eleições locais de Maio. O Vox entrou em 140 governos municipais e elegeu representantes em 43 capitais de província, sendo o partido mais votado em 30 municípios, 26 dos quais com maioria absoluta. A extrema-direita praticamente duplicou o número de votos e eleitos em relação a 2019, recolhendo 1,6 milhões de votos e elegendo 1665 vereadores.

O fenómeno parece recorrente no seio da União Europeia. Na Bélgica, que vai às urnas em 2024, a extrema-direita flamenga representada pelo partido Vlamms Belang aparece nas sondagens como possível vencedora, com 25% dos votos, enquanto a Aliança neo-flamenga, direita conservadora, surge em segundo lugar com 22% das intenções de votos. Na Alemanha, o AFD (Alternativa para a Alemanha) surge nas sondagens com 20% das intenções de voto, percentagem que sobe para 30% no Leste do país, onde pela primeira vez o partido elegeu um governador, em Sonneberg, na região da Turíngia.

A tendência confirmou-se na Grécia, a Nova Democracia saiu das urnas com 40,5% dos votos, o que com o bónus ao partido mais votado, agora em vigor, lhe dá a maioria absoluta, e o partido Espartanos, herdeiro do neonazi Aurora Dourada, rompeu a barreira dos 3% e recolheu 4,6% dos votos.

Já em Itália governa o partido Fratelli d'Italia, de Giorgia Meloni, a primeira-ministra que tem como lema «Deus, Pátria e Família», homofóbica, anti-aborto, feminacionalista, contra o multiculturalismo, anti-imigração, racista e xenófoba. Na Suécia, os neo-nazis que apoiam o governo dão pelo nome de Democratas da Suécia, enquanto em Helsínquia os Verdadeiros Finlandeses se juntaram aos conservadores para o executivo mais à direita da história do país dos últimos 70 anos. Enquanto isso, na Dinamarca, a convergência entre conservadores e extrema-direita abriu as portas do poder ao Partido do Povo dinamarquês (Dansk Folkpati, FD), nacionalista, anti-imigrante e islamofóbico. Na Áustria, a aliança entre conservadores e extrema-direita deixou de provocar pruridos no final dos anos 90, com o Partido Popular Austríaco (ÖVP), democrata-cristão, a juntar-se ao Partido da Liberdade da Áustria (FPÖ), nacionalista.

Assim vai a UE, onde o ascenso da extrema-direita, camuflado por palavras como liberdade, democracia, povo, se traduz num crescente desequilíbrio de forças e estimula o retrocesso, que já se verifica, dos valores humanistas e dos direitos sociais tão duramente conquistados na Europa. Sem o contraponto do campo socialista, a social-democracia vende-se pela ilusão de poder, sem se dar conta de que, como a rã que leva às costas o escorpião, cava a própria sepultura.



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