Crises, alheamentos e os interesses do costume
Como se resolve a «crise política»? A pergunta foi feita há dias ao Secretário-geral do PCP pelos jornalistas, num contacto com trabalhadores da Exide, na Castanheira do Ribatejo. A resposta, que foi dada no momento, tem sido repetidamente exposta nas páginas do Avante! e na intervenção do PCP: resolvendo a crise na vida das pessoas, aumentando salários e pensões, regulando preços, salvando os serviços públicos do rumo liquidatário a que têm sido sujeitos pela política seguida por este, como, antes, por outros governos.
A resposta é, para quem se confronta no dia-a-dia com as dificuldades, clara e evidente. Mas não satisfez a curiosidade jornalística. Mas será preciso mudar mais ministros, mudar todo o Governo, criar novos ministérios, retorquiram.
O episódio não tem novidade, mas não deixa de ser revelador do alheamento das reais dificuldades nas vidas de cada um patente nos alinhamentos dos principais noticiários. Tal como tinha acontecido no contacto com os trabalhadores do pólo logístico da Sonae na Azambuja, em Dezembro, os problemas dos salários que não chegam ao fim do mês, dos horários que não dão espaço à vida pessoal, da precariedade que não permite fazer planos para lá do dia de amanhã – realidades da vida de tantos (e de tantos jornalistas) – não chegaram às emissões televisivas, radiofónicas ou às páginas dos jornais.
Esta fixação em torno do percurso de governantes, da orgânica governativa, de iniciativas parlamentares tantas vezes mais a pensar no impacto mediático do que nas soluções para os problemas nacionais, tem atravessado não apenas a cobertura noticiosa da actividade do PCP mas também as várias entrevistas dadas pelo Secretário-geral nas últimas semanas. Não porque o PCP não tenha análise e propostas sobre a situação nacional, como disse cinicamente um ex-deputado do PSD, Miguel Morgado, promovido a comentador há dias, mas apesar de os problemas e as soluções necessárias para o País ter estado no centro da acção do PCP.
A tal crítica, por exemplo, surgiu a propósito de uma recente reportagem/entrevista feita pela estação televisiva que acolhe Miguel Morgado, à SIC. A crítica que Morgado fez, em rigor, devia ser deixada à estação, que decidiu as perguntas que quis fazer e a edição da reportagem. Tal como se podia dizer o mesmo da entrevista ao jornal Expresso, publicada uns dias antes, cuja edição conseguiu expurgar praticamente todas as referências às propostas do PCP para o País. O truque é simples e eficaz: por um lado, é assumida uma opção editorial que anula do espaço mediático as propostas e soluções apresentadas pelo PCP; por outro, dá-se palco, sem contraditório, a quem, na ausência de soluções, ataca o PCP.
Logo a abrir o ano, no passado dia 2, o PCP fez uma declaração sobre os aumentos dos preços em 2023, que caem em cima da maior subida dos últimos 30 anos, em 2022. O resultado mediático não passou de menos de 20 segundos no final de uma peça televisiva. Fica claro: a acção do PCP tem sido intensa, ainda que a comunicação social dominante a esconda.