Valorizar os salários e o emprego em vez de ceder ao grande capital
«Salários e emprego são duas questões centrais para assegurar condições de vida dignas a quem trabalha», sublinhou Jerónimo de Sousa numa sessão realizada dia 27, em Setúbal.
Baixas remunerações e fragilização dos direitos são chagas no mundo laboral
O secretário-geral do PCP falava na abertura da iniciativa promovida no âmbito da campanha que o Partido tem em curso sob o lema «O emprego e os direitos dos trabalhadores, contra a exploração».
Antes dos vivos testemunhos trazidos à sessão por dez membros de Organizações Representativas dos Trabalhadores (ORT), focados na realidade concreta de empresas do distrito de Setúbal, Jerónimo de Sousa considerou que a valorização dos salários e emprego é indissociável de uma «política verdadeiramente alternativa à política de direita». Não têm, por isso, encontrado «a resposta que se impunha» nas «opções políticas e propostas apresentadas pelo Governo PS».
Mais recentemente, tal é visível nos planos de Recuperação e Resiliência (PRR) e de Estabilidade 2021/2025, pois se o primeiro não enfrenta défices estruturais como a «substituição de importações por produção nacional», o segundo contempla «o regresso acelerado à política da ditadura do défice, (...) mantendo as mesmas restrições que têm impedido a contratação de milhares de trabalhadores em falta e o justo aumento dos salários na Administração Pública». Dá, ainda, «um sinal errado em matéria de salários ao sector privado».
Opção pelo grande capital, continuou o dirigente comunista, particularmente grave «em relação às leis laborais, nas quais permanece uma inaceitável vantagem discricionária ao grande capital, que lhe foi dada pelas revisões do Código de Trabalho, promovidas por sucessivos governos, em matéria de contratação colectiva e de despedimentos».
Ofensiva
Acresce «a enorme pressão que, a pretexto da situação epidemiológica e com a conivência do Governo, o grande capital vem exercendo sobre o emprego, os direitos e salários para levar mais longe a exploração dos trabalhadores e o saque dos recursos públicos», alertou.
Ou seja, detalhou Jerónimo de Sousa, a «uma degradada situação social», resultado da «imposição e subsistência de um modelo de baixos salários, crescente precarização das relações laborais e manutenção de elevados níveis de desemprego», junta-se o agravamento de todas estas chagas, «como o demonstram claramente o uso e abuso do lay-off por parte de grandes empresas e multinacionais com muitas dezenas de milhões de euros de lucro, como a Autoeuropa, a Visteon, a Delphi ou os TST, afectando mais de nove mil trabalhadores na Península de Setúbal».
O problema, salientou o Secretário-geral do PCP, vai muito além da Península de Setúbal», como se atesta nas Contas Nacionais relativas a 2020, que mostram que «os accionistas e famílias do conjunto das empresas receberam 7,4 mil milhões de euros de dividendos, mais 332 milhões do que em 2019».
Em contraste, na região, desde Março de 2020, mais de dez mil trabalhadores, sobretudo com vínculos precários, engrossaram as estatísticas do desemprego, evidenciando a dimensão do problema «em diversas empresas e complexos industriais», prosseguiu Jerónimo de Sousa, insistindo em acusar «o patronato, com a conivência do Governo do PS, de aproveitar para dar passos adiante na individualização dos vínculos laborais, redução de direitos individuais e obstaculização do exercício dos direitos colectivos».
Tentativas de «impedir a realização de plenários, de criação de bancos de horas ou de marcação abusiva de dias de férias» só não têm tido sucesso «devido à oposição das ORT e dos trabalhadores», notou o Secretário-geral do Partido, para quem o PCP, os trabalhadores e as suas organizações de classe têm tido, neste contexto, uma intervenção e luta decisivas.
Depois de exemplificar isso mesmo com as vitórias alcançadas em matéria de pagamento integral dos salários, alargamento do direito ao subsídio de desemprego e do apoio a filhos menores, Jerónimo de Sousa reafirmou que, «perante uma situação nacional marcada pela degradação económica e social, o que se impunha era uma outra e mais audaciosa política para servir os trabalhadores, o povo e o País, e não de cedência aos interesses do grande capital».
Defendeu, por isso, no imediato, «o aumento dos salários de todos os trabalhadores, incluindo o aumento do Salário Mínimo Nacional (SMN), que no curto prazo devia atingir os 850 euros, e dos salários dos trabalhadores da Administração Pública», bem como a necessidade de «um verdadeiro programa de desenvolvimento do País» que rompa «com um rumo que tem desprezado as actividades produtivas e aprofundado a dependência externa».
Na linha da frente
Ao longo de mais de uma hora, uma dezena de membros de ORT abordaram, com detalhe, o combate que travam os trabalhadores e as suas estruturas de classe no distrito face à ofensiva patronal.
Combate no qual os comunistas no Movimento Sindical Unitário têm estado na primeira linha, salientou Luís Leitão, da USS/CGTP-IN, e que se expressa na defesa dos profissionais e do SNS como garantes da resposta equitativa no plano da Saúde, como precisou Zoraima Prado, falando dos enfermeiros. Combate, ainda, pela valorização dos salários e direitos dos trabalhadores das IPSS e misericórdias, que estão na linha da frente auferindo o SMN, como relatou Judite Dias, do STFPS/CGTP-IN, mas, também, na defesa do sector ferroviário e daqueles que o podem potenciar, como precisou João Pedro Ricardo.
Luta que tem dado resultados no sector da grande distribuição e vai continuar, entre outros aspectos, pelo cumprimento das convenções colectivas, assegurou Fernando Pais, trabalhador da Sonae. Que é dura mas exaltante contra a precariedade dos vínculos, o recurso ao lay-off, aos despedimentos colectivos e ao encerramento de empresas, à compressão de direitos e da retribuição do trabalho em diversos domínios, visando aumentar a exploração; pela segurança, higiene e saúde nas empresas e locais de trabalho, o direito à progressão na carreiras e a sua efectivação e contra as discriminações e atropelos crescentes, impostos por um patronato que acumula cada vez mais riqueza, como, denunciaram, dando vários e chocantes exemplos, à vez, Paula Sobral, da Visteon, Nuno Santos, trabalhador da Autoeuropa, Paula Bravo, trabalhadora da Administração Pública, Pedro Soares, da Lauak, ou Fernando Bragança, da CT da Navigator.
A terminar, Jerónimo de Sousa enfatizou a importância e e o exemplo da resistência, apelou à mobilização e consciencialização prioritária dos mais jovens e advertiu que não é por acaso que o grande capital e os seus serventuários continuam a atacar a Constituição, já que ela é um bastião de direitos e garantias em matéria laboral. Assim se cumprisse.