Desenvolvimento tecnológico deve servir o progresso social
PROGRESSO O País tem de acompanhar a revolução tecnológica digital, advoga o PCP, que alerta todavia que esta tem de traduzir-se em progresso social, não em exclusão ou novas formas de exploração.
O País precisa de vencer fragilidades e dependências
«Trouxe-nos para este debate as questões da valorização da nossa economia, sua relação com a inovação, produção de conhecimento, tendo como pano de fundo a chamada revolução tecnológica digital e com ela o que se convencionou denominar de revolução industrial 4.0», começou por referir o Secretário-geral do PCP ao interpelar o primeiro-ministro, dia 14, no debate quinzenal.
Análise sobre matérias relacionadas com o desenvolvimento das forças produtivas que Jerónimo de Sousa aproveitou para esclarecer que são, de resto, uma «componente essencial» do programa que o PCP preconiza para o País, visando combater as suas «fragilidades, a sua dependência, os défices estruturais, as debilidades dos seus sectores produtivos e da economia».
Esse é um desafio que está colocado e que não se confina apenas ao «progresso tecnológico e ao desenvolvimento do sistema científico nacional», mas que exige ser acompanhado pelo progresso social em todas as esferas da nossa vida colectiva, anotou o líder comunista, para quem o desenvolvimento tecnológico ou a dita revolução digital «não pode ser 4 (quatro) em mecanismos de exploração do trabalho e 0 (zero) no plano dos direitos».
Fundadas razões para preocupação encontra pois Jerónimo de Sousa quando constata que vão surgindo vozes que clamam pela «necessidade de ajustar e flexibilizar as políticas laborais e sociais e até a própria política aos domínios do 4.0».
O que, do seu ponto de vista, coloca um problema que classifica de «central» e que se prende com a «apropriação dos ganhos do desenvolvimento tecnológico».
Pela inclusão
Saber, no fundo, se esse almejado desenvolvimento tecnológico é «pretexto para o alargamento e flexibilização dos horários de trabalho ou oportunidade para promover a redução progressiva dos horários de trabalho para todos os sectores, dando um firme combate à desregulação».
Essa foi uma das questões que Jerónimo de Sousa colocou ao primeiro-ministro, deixando à reflexão deste um conjunto de outras interrogações sobre aspectos relacionados com os avanços tecnológicos e suas implicações directas no nosso devir colectivo, como seja a diversificação das fontes de financiamento da Segurança Social, o controlo público de sectores estratégicos da economia ou a crescente necessidade de uma mais justa distribuição da riqueza criada no País.
Daí que a resposta aos problemas colocados pela «iminente aceleração do desenvolvimento tecnológico» reclame, no entender do Secretário-geral do PCP, que todas estas dimensões sejam equacionadas.
E porque essa resposta, na sua óptica, «não pode ser parcial» – se se quiser «construir uma sociedade que se oriente para a inclusão de todos e onde cada um tenha o direito a viver com dignidade» –, instou o chefe do Governo a esclarecer se «vamos tratar de uma coisa, sem dar resposta a todas as outras»
Apostar nas qualificações
António Costa, falando da transformação do sistema produtivo, reconheceu que não se pode «tratar nenhuma questão isoladamente sem ter uma visão de conjunto». Salientou, porém, que a «questão das qualificações é absolutamente chave», desde logo na formação dos jovens que, teorizou, «não seja espartilhante» e os «prepare para aprender ao longo da vida» e para uma «cidadania activa e uma participação activa no mundo do trabalho».
«Mas que implica também uma resposta relativamente àqueles que já estão hoje no mercado de trabalho, que tiveram uma formação que não teve em conta as necessidades de hoje», acrescentou, sustentando ser essa a razão pela qual o «investimento nas qualificações, designadamente nas competências digitais, é crucial».
O combate à precariedade foi igualmente assumido pelo chefe do Governo como uma «questão central», por razões de «dignidade do trabalhador» e de «produtividade da própria empresa».
Depois de admitir que a revolução 4.0 da indústria coloca «grandes interrogações sobre o futuro do mercado de trabalho», defendeu por fim que a «prioridade das qualificações» tem que «ir de par com o investimento no sistema de investigação e desenvolvimento, na modernização tecnológica das empresas, na formação ao longo da vida e com a criação de mecanismos sociais que suportem os momentos de transição».
Assegurar direitos
Na réplica, Jerónimo de Sousa insistiu em lembrar que os «fascinantes avanços nos domínios da ciência e da técnica sempre, mas sempre, beneficiaram fundamentalmente uma parte – o capital –, não o trabalho».
«E é isso que está causa: saber para onde vai o resultado desses avanços da ciência e da técnica», enfatizou, pondo em relevo a questão nodal, só em parte aflorada na resposta do primeiro-ministro.
Antes, na sua primeira intervenção, o líder comunista concluíra já que o desenvolvimento tecnológico de que o País carece é aquele que «tem o pleno emprego como objectivo fundamental», que «assegure o direito ao trabalho, acabando com o flagelo dos vínculos precários», que aposte na «política de educação e formação profissional numa perspectiva de formação permanente», e não, em «nome de uma pretensa modernização das relações de trabalho», usado para «impor novas e disfarçadas formas de trabalho precário».
Demora em fazer justiça
Neste debate Jerónimo de Sousa voltou ao tema das reformas dos trabalhadores com longas carreiras para assinalar que a solução avançada ficou muito aquém daquela que o PCP propôs e que visava «garantir o direito à reforma sem penalizações para todos os trabalhadores com 40 e mais anos de descontos».
Esse primeiro avanço abriu no entanto a «perspectiva de uma solução mais abrangente a breve prazo», levando o Governo a anunciar duas outras fases de alteração ao regime de pensões antecipadas (a primeira das quais para o início de 2018) no sentido dessa valorização das longas carreiras.
Fazer justiça a estas pessoas assume porém uma premência crescente, sem mais delongas, a avaliar por casos concretos como o relatado por Jerónimo de Sousa de uma operária de 61 anos de idade, com o salário mínimo nacional, e 42 de descontos para a Segurança Social. Tendo feito o levantamento da sua carreira contributiva, constatou que teria direito a 415 euros. Com penalizações como o factor de sustentabilidade, ficou a saber que só receberá 293 euros.
«Ninguém neste hemiciclo é capaz de aceitar que isto é fazer justiça a quem trabalhou no duro e descontou durante 42 anos para, depois, ter como resposta do Estado 293 euros para essa sua longa vida de trabalho», afirmou o líder comunista, convicto de que este é um «exemplo gritante de como têm de ser dados passos na concretização do direito daqueles que se querem reformar».
«Temos de fazer avanços nos direitos mas, ao mesmo tempo, assegurar aquilo que tem de ser sagrado que é a sustentabilidade do futuro da Segurança Social», respondeu o primeiro-ministro, repetindo uma ideia tantas vezes já por si enunciada, que completou dizendo que o desiderato «passa por garantir as receitas mas também por gerir o esforço».
António Costa reafirmou no entanto o compromisso do Governo de levar por diante uma «convergência faseada», em sede de negociação em concertação social, quer para a penalização das reformas antecipadas, numa «trajectória de reposição de justiça para as longas carreiras contributivas», quer para o factor de sustentabilidade.
Por avanços ao serviço de todos
Na abordagem ao problema de fundo que é «saber a quem serve e ao serviço de quem está» a revolução tecnológica digital – «se serve uma minoria ou se está ao serviço da maioria que trabalha e do desenvolvimento geral», salientou –, Jerónimo de Sousa confrontou o primeiro-ministro com outros aspectos indissociáveis desta questão e que são da maior importância para a vida de todos nós.
Se o desenvolvimento tecnológico é «condição para produzir mais», não deveria então ser também um «acrescido suporte para garantir uma Segurança Social Pública valorizada com novas formas de financiamento complementar ao actual regime de contribuições», «capaz de garantir pensões e reformas dignas e um reforçado quadro de protecção social, na doença, no desemprego, na velhice?», questionou o líder comunista.
E seguindo a mesma linha de raciocínio, defendeu que o desenvolvimento tecnológico de que o País precisa não deve estar «submetido ao controlo e apropriação privada das multinacionais e monopólios», o que do seu ponto de vista passa pela «reposição dos sistemas de comando» e pela «preservação pública de alavancas fundamentais da economia».
De igual modo, sustentou, em vez de serem «fonte de maximização do lucro e de concentração de riqueza nas mãos de uns poucos», os avanços tecnológicos devem servir como «instrumento para uma mais justa distribuição do Rendimento Nacional, assente numa maior valorização dos salários e dos rendimentos do trabalho».