Acusações de práticas ilegais das secretas

Exige-se clareza ao primeiro-ministro

O primeiro-ministro deve explicações sobre a realização de escutas ilegais pelas «secretas», prática relativamente à qual há a acusação de ser habitual e cumprida segundo orientações superiores.

Não querer ouvir o responsável da «secreta» e até o Conselho de Fiscalização faz pensar sobre o que PSD e CDS tentam esconder

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No centro deste caso está o que o PCP considera ser a «gravidade das acusações» feitas aos Serviços de Informações pela defesa de Jorge Silva Carvalho, no âmbito do processo judicial em que este é arguido pela prática de actos ilegais enquanto director do SIED, designadamente o acesso detalhado a dados do tráfego telefónico do jornalista Nuno Simas. Confessa Silva Carvalho, entre outras coisas, que tudo seria feito «de acordo com orientações superiores e segundo o modus operandi dos serviços secretos portugueses».

«Não podemos deixar de exigir que o primeiro-ministro se pronuncie sobre as acusações feitas no âmbito de um processo judicial, de que a prática ilegal que está sob julgamento – e que ninguém contesta que tenha ocorrido – era, ou não, prática habitual dos Serviços de Informações, e se era, ou não, praticada de acordo com orientações superiores, e de quem», afirmou em declaração política no Parlamento, dia 25, o deputado comunista António Filipe.

Para o PCP, que entretanto endereçou já a Passos Coelho uma pergunta por escrito na expectativa de que traga alguma luz sobre o assunto, o chefe do Governo (que detém a responsabilidade máxima pela direcção dos Serviços de Informações) não pode igualmente deixar de explicar por que motivo tem vindo a indeferir os pedidos para quebra do Segredo de Estado no âmbito do referido processo judicial.

Silêncio ensurdecedor

É que sendo o cumprimento da lei e da Constituição por parte das «secretas» «um valor democrático fundamental», como sublinhou António Filipe, a não autorização dessa quebra do Segredo de Estado no quadro de um processo judicial relativo à investigação de práticas ilegais pelos Serviços de Informações, então, só pode ser encarada como uma «atitude inaceitável de obstrução à Justiça».

«O segredo de Estado não pode ser usado pelo primeiro-ministro para dar cobertura a actuações inconstitucionais e ilegais dos Serviços que estão sob sua tutela directa», enfatizou o parlamentar comunista, que estendeu as suas críticas às bancadas do PSD/CDS-PP pelo silêncio por estas imposto nesta matéria à AR e que qualificou de «verdadeiramente ensurdecedor».

Aludia à rejeição – para si um «facto gravíssimo e que não pode passar em claro» – ocorrida na manhã desse mesmo dia pelos partidos da maioria governamental, com a abstenção do PS (ver caixa), da proposta do PCP para a audição urgente na 1.ª Comissão do secretário-geral e do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República.

Rejeição que a deputada do PSD Teresa Leal Coelho procurou justificar com o argumento de que a sua bancada se recusa a «ser um fantoche» da defesa de Silva Carvalho, cujas acusações, invocou, visam «provocar o poder político e transformar um caso judicial num caso político» (ver caixa).

«Não nos calaremos e não abdicamos de usar todos os mecanismos constitucionais de que dispomos para exigir o apuramento de responsabilidades por práticas ilegais dos Serviços de Informações e para exigir que não existam em Portugal serviços de informações a actuar à margem da lei e em violação de direitos fundamentais dos cidadãos», foi a garantia reiterada com firmeza no debate por António Filipe.


A posição dúbia do PS

À afirmação do deputado Luís Pita Ameixa de que o PS tem uma posição «tranquila» sobre esta matéria reagiu António Filipe com ironia, considerando-a mesmo «demasiada tranquila», tendo em conta a gravidade da situação que está a ser revelada perante a opinião pública. E discordou sobretudo da ideia de que «não há factos novos», como disse o parlamentar do PS

«Então há um ex-director do Serviço de Informações Estratégicas e Defesa que está acusado num processo judicial pela prática de ilegalidades, no processo defende-se dizendo que recebia orientações superiores – que só podem vir ou do secretário-geral do SIRP ou do primeiro-ministro –, diz que isso era prática corrente nos serviços, e o senhor deputado vem dizer que não há factos novos?», inquiriu, perplexo, António Filipe, que disse ainda não compreender a abstenção do PS ao requerimento do PCP (a maioria PSD/CDS-PP obstaculizou, votando contra) para ouvir em comissão parlamentar o responsável das secretas e o conselho de fiscalização, face aos novos e graves factos que entretanto vieram a lume.

 



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