Soares ao telefone
O caso não é para menos e já vamos perdendo a conta às inúmeras notícias, reportagens, comentários e outras peças que sobre o caso BES/GES têm vindo à estampa. Uma informação abundante que vai circulando nos diferentes órgãos de comunicação, mais em jeito de novela policial do que de apuramento real dos factos e responsabilidades políticas e económicas inerentes ao colapso do império Espírito Santo. Estratégia ou não dos poderes dominantes, o facto é que na enxurrada da informação que vai estando disponível muitos vão perdendo o fio à meada por entre a complexa teia de labirínticas relações entre grupos económicos e poder político, ou perante a sucessão de episódios, como a recente demissão dos administradores do chamado Novo Banco, entre eles o conselheiro de Estado, escolhido por Cavaco, chamado Vítor Bento.
Surgem no entanto pequenas «pérolas» que lançam alguma luz sobre a forma em como este polvo foi ganhando (e está a ganhar, não nos iludamos!) força e poder na sociedade portuguesa, na inversa medida, claro está, do agravamento da exploração e pobreza do nosso povo.
Vem isto a propósito de uma reportagem exibida pela RTP1 no programa linha da frente que faz uma espécie de reconstituição da vida e percurso do banqueiro Ricardo Salgado e onde, lá para o minuto 5 da referida reportagem, nos aparece a figura de Mário Soares a explicar – por vaidade ou distracção – o seguinte: estávamos no início da década de 90 quando o próprio telefonou a Ricardo Salgado dizendo-lhe que estavam a «desnacionalizar» a economia e se ele não queria ficar com o «seu banco», ao que Ricardo Salgado lhe terá respondido que sim, mas que, pobre coitado, não tinha dinheiro, coisa que Soares se prontificou a resolver com um simples telefonema ao «mon ami Miterrand» que por via de um banco francês (BNP Paribas) lhe disponibilizou a massa.
Não sei quantos mais telefonemas fez Mário Soares nessa como em outras alturas para dar a mão a um punhado de capitalistas que anos antes eram o suporte do regime fascista. Mas o que é certo e seguro é que sem a intervenção activa do PS, mas também do PSD e CDS, não teria sido possível assistirmos ao criminoso percurso de privatizações de empresas estratégicas para o País e à reconstituição dos grupos monopolistas que a Revolução de Abril, por razões que são cada vez mais evidentes, justamente liquidou.