A chaga da precariedade

A imposição de cortes salariais é apenas uma das peças dessa política mais vasta que visa intensificar a exploração dos trabalhadores. Neste sentido têm concorrido também as alterações ao Código do Trabalho, dirigidas todas elas para torpedear direitos e agravar as condições laborais.

O ataque em curso à contratação colectiva, a generalização da precariedade, o embaratecimento e facilitação dos despedimentos, o aumento dos horário de trabalho, o agravamento da articulação da vida pessoal, familiar e profissional constituem exemplos dessas consecutivas alterações para pior à legislação laboral, como lembrou em recente debate parlamentar a propósito da precariedade a deputada comunista Rita Rato.

Nesse debate sobre precariedade laboral que foi tema de uma interpelação do BE ao Governo, a deputada comunista lembrou na ocasião que há hoje no nosso País mais de um milhão e 200 mil trabalhadores nessas condições, ou seja com vínculo precário.

Entre as formas dominantes dessa precariedade laboral que é sinónimo de insegurança e restrição de direitos fundamentais, especificou, está a utilização de contratos a termo em desrespeito pela lei, o uso abusivo de recibos verdes, o trabalho encapotado em regime de prestação de serviços, as bolsas de investigação ou estágios profissionais e o trabalho temporário sem observância de regras.

«A precariedade dos contratos de trabalho e dos vínculos é a precariedade da família, é a precariedade da vida. Mas é igualmente a precariedade da formação, das qualificações e da experiência profissional, é a precariedade do perfil produtivo e da produtividade do trabalho laboral», sintetizou Rita Rato, que advertiu por isso ser este um «factor de instabilidade e injustiça social» que compromete simultaneamente o «desenvolvimento do País».

 Ao sabor do patrão

 O deputado comunista David Costa, falando ainda nesse mesmo debate da tentativa de «demolir a contratação colectiva», fez notar que o intuito do Governo é «empurrar os trabalhadores para a contratação individual, à peça, sem direitos defendidos, com salários esmagados e horários de trabalho de sol a sol ou à medida das conveniências do patrão».

Num debate onde o ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, Pedro Mota Soares, traçou um quadro quase idílico da realidade laboral – o que foi visto por Jorge Machado como um «insulto» aos milhares de portugueses que vivem o drama do desemprego e da precariedade –, foi ainda o deputado do PCP a rejeitar a tese segundo a qual é a «segmentação ou a dita rigidez do mercado de trabalho» que promove a precariedade. Pelo contrário, as opções do Governo, essas sim, «determinam a precariedade», asseverou, acusando aquele de ser o primeiro a promover a precariedade nos diferentes ministérios e nos diferentes órgãos e serviços da administração pública (ver caixa).

No próprio IEFP, que está sob a alçada daquele Ministério, há centenas de professores com falsos recibos verdes e é este organismo que coloca mais de 68 mil desempregados a trabalhar de graça em diferentes serviços públicos, para desempenhar tarefas permanente por via dos ditos contratos de emprego e inserção», acusou Jorge Machado, que lembrou ainda que é o Governo que promove de forma directa a precariedade ao utilizar milhares de estágios para funções e tarefas permanentes, não falando nos mais de 63 mil trabalhadores com contrato a termo na administração pública e nos milhares de trabalhadores com outras formas de trabalho precário.

Governo dá o pior exemplo

Na saúde, na educação ou nas autarquias locais são muitos os exemplos que ilustram a proliferação da precariedade em resultado das opções políticas do Governo.

Apesar de desafiado pela deputada comunista Paula Santos a esclarecer a questão, o ministro da Solidariedade e do Emprego nada disse sobre o facto de o Governo, por exemplo, ao mesmo tempo que impede a contratação de trabalhadores para os serviços públicos de saúde promover a contratação de médicos e enfermeiros através de empresas de trabalho temporário.

A deputada do PCP referiu, por outro lado, que o Governo mantém profissionais de saúde essenciais para o funcionamento dos serviços de saúde (hospitalares e centros de saúde) com contratos de trabalho a termo certo, recorrendo ainda aos contratos de emprego-inserção para suprir necessidades permanentes, designadamente assistentes administrativos e assistentes operacionais.

Já nas escolas, perante a enorme carência de funcionários, o que se assiste é uma vez mais ao uso e abuso pelo Governo dos «contratos de emprego-inserção ou às contratações a tempo parcial para algumas horas, por 2,80 euros e por períodos muitas vezes inferiores a seis meses», denunciou Paula Santos, que não esqueceu os milhares de professores contratados que «andam há anos com a casa às costas, com prejuízo para si e para a sua família, e sem qualquer perspectiva de vinculação a um quadro de escola».

Ao impedir as autarquias de contratar trabalhadores, impondo inclusive a sua redução, é ainda o Governo que os empurra para a «contratação através de contrato de emprego-inserção», sublinhou por último a parlamentar do PCP, para quem é inaceitável esta «opção pela precariedade nas relações laborais para o desempenho de funções permanentes».

 

 



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