Ataque à contratação colectiva

Cortar salários e direitos

A contratação colectiva e o pagamento do trabalho extraordinário estão sob fogo do Governo. É mais um «duro golpe nos direitos dos trabalhadores», com o único intuito de intensificar a exploração, acusa o PCP.

Atacar a contratação colectiva é atacar os sindicatos e a própria democracia

«O objectivo é reduzir de forma generalizada os salários, é atacar e tentar destruir os contratos colectivos de trabalho», sintetizou no Parlamento o deputado comunista Jorge Machado, aludindo às duas propostas de lei que, na perspectiva do PCP – e ao contrário do que afirma o discurso hipócrita do Governo –, não visam nem «modernizar» o mercado de trabalho nem «dinamizar» a contratação colectiva.

Para o parlamentar comunista, que tratou do tema em declaração política em nome da sua bancada, dia 11, este ataque à contratação colectiva não pode deixar de ser encarado como um violento ataque aos sindicatos – a contratação colectiva foi sempre um elemento chave da actividade sindical, lembrou –, e, nessa medida – também porque não há democracia sem sindicatos –, um ataque à própria democracia.

«Os contratos colectivos de trabalho, enquanto instrumentos livremente negociados e assinados entre sindicatos e patrões, consagram um conjunto muito vasto de direitos com reflexos muito significativos nas condições de trabalho e salários dos trabalhadores», recordou Jorge Machado, que sublinhou ainda o facto de a contratação colectiva, além de ser um «direito fundamental dos trabalhadores, reconhecido como tal pela Constituição», assumir simultaneamente a inegável qualidade de «instrumento de melhoria das condições de trabalho».

No caso vertente, com o presente diploma, o Governo pretende reduzir de forma significativa os prazos da caducidade e sobrevivência dos contratos colectivos de trabalho, ou seja, acelerar o seu término. Assim, uma vez pedida a cessação de vigência, com a presente lei, como explicou o parlamentar do PCP, os «prazos para que os contratos colectivos de trabalho deixem de vigorar passariam a ser muito mais curtos».

Resulta assim claro, para o PCP, que a pretensão do Governo vai no sentido de que os direitos consagrados nos contratos colectivos cessem o «mais depressa possível» para que dessa forma possa baixar salários e agravar a exploração.


Contestação não pára

Verdadeiramente extraordinário foi o facto de Nuno Magalhães (CDS) passar absolutamente ao lado do tema da declaração política – uma questão que diz respeito à vida de milhares e milhares de trabalhadores –, e, numa tentativa de desviar as atenções, pôr o foco no protesto popular que legitimamente se fez ouvir nas cerimónias oficiais do 10 de Junho e que coincidiu com o desmaio de Cavaco Silva, um assunto marginal ao debate.

Mas sobre isto Jorge Machado desfez de imediato eventuais dúvidas que pairassem sobre o deputado do CDS-PP, sublinhando que a manter-se a política de ataque aos trabalhadores, prosseguindo o saque aos seus salários e pensões e a ofensiva contra os seus direitos, o Governo terá «sempre mas sempre» a contestação de quem trabalha e em número crescente, inclusivamente de gente que votou no PSD e CDS-PP, que foi enganada com as promessas eleitorais.

Igual certeza da parte do PCP foi transmitida ao deputado Pedro Roque (PSD), cuja intervenção dera idênticos sinais de incómodo perante o que chamou de «cultura de rua e de manifestação», considerando mesmo que os manifestantes que protestaram na Guarda «não respeitaram o chefe do Estado».

«Se estão à espera que os trabalhadores e o povo, a quem roubam salários e pensões, a quem tiram os serviços públicos, a quem agravam as condições de vida, fiquem calados e quietos, aceitem passivamente os cortes, enquanto os ricos ficam mais ricos, desiludam-se», ripostou Jorge Machado, que acusou o Governo de ser o único responsável pela contestação que grassa no País.

E reiterou que está em causa um ataque sem precedentes aos direitos e salários, com milhares de pessoas a verem em risco uma parte dos seus rendimentos, tudo porque o Governo ataca deliberadamente a contratação colectiva.

E por isso insistiu em acusar o Governo de não fazer outra coisa que não seja atacar a contratação colectiva para reduzir os salários aos trabalhadores do sector privado.

O deputado Nuno Magalhães foi ainda confrontado com afirmações do seu correligionário Mota Soares, ministro da Solidariedade e do Trabalho, e do ministro Paulo Portas, os quais, ainda há bem pouco tempo, afirmavam a pés juntos que já estaria feito o ajustamento dos salários do sector privado e que não havia espaço para cortar mais.

«Então e agora, pouco tempo depois, vêm apresentar novas medidas para cortar nos salários?», inquiriu o deputado comunista, pondo assim em evidência o pouco ou nenhum valor dado à palavra por aqueles responsáveis do CDS-PP e do Governo.

 

Golpe profundo

O ataque do Governo PSD/CDS-PP à contratação colectiva não é de hoje nem de ontem. Como assinalou Jorge Machado, há muito que por aquele são usados os mecanismos da caducidade e da sobrevigência, criados pelo anterior Governo PS. Acontece assim que por acção do Governo, nomeadamente por via da não publicação das portarias de extensão e pelo facto de ser quase inexistente a mediação e a conciliação, a contratação colectiva está hoje em «níveis historicamente baixos». Com efeito, em 2013, o número de trabalhadores abrangidos por contratos colectivos representava apenas 14,3% do valor existente em 2009. Mais precisamente, enquanto em 2009 o número de trabalhadores abrangidos pelos instrumentos de regulação colectiva de trabalho ascendia a um milhão e 303 mil trabalhadores, em 2013 esse número desceu drasticamente para 186 mil.

 

Menos dinheiro

Jorge Machado deu exemplos concretos do que significa o ataque à contratação colectiva de trabalho, com impacte directo na remuneração dos trabalhadores.

No sector das moagens, rações, massas e arroz, está em causa, entre outros cortes, o fim de um complemento de doença e redução do pagamento de trabalho nocturno.

Já no sector da hotelaria e restauração significa o fim do direito à alimentação em espécie, que representa mais de 99 euros por mês, ou do direito ao prémio de línguas, que corresponde a 43 euros mensais.




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