Uma política contra o mundo rural
Agrava-se os problemas da nossa agricultura
Os actores mudaram mas o fundamental da política permanece inalterada e incólume, lembrou o deputado comunista Agostinho Lopes numa declaração política em que responsabilizou o actual Governo pelo estado calamitoso que atinge os nossos campos.
«Tantas promessas. Tanta e quase sempre justa oposição à política agrícola do governo PS/Sócrates. Tanta crítica e propostas alternativas, para depois de um ano de governo, certamente com outra encenação, reproduzirem o essencial dessa política, argumentarem como argumentava o PS, fazerem o que fazia o Ministério da Agricultura do PS», sublinhou o parlamentar do PCP, pondo em evidência esse rotativismo feito de ilusões e falsas juras, ora de uns ora de outros, que desfaz expectativas e gera frustações.
Ávidos de soluções
Foi dessa realidade dura e difícil que hoje se vive na agricultura que Agostinho Lopes falou da tribuna do hemiciclo, dando exemplos concretos que atestam não só essa linha de persistência em medidas de política erradas como uma completa ausência de resposta para os principais problemas com que se confronta o sector.
É o caso da falta de ajuda aos produtores de maçã da Beira Alta para que estes possam expandir a sua produção e, por essa via, dar um contributo para contrabalançar as cerca de 200 mil toneladas que o País hoje importa desse fruto. O ProDer ainda não foi capaz de assegurar essa ajuda, assinalou o deputado comunista, que estivera dias antes em contacto directo com a principal organização de produtores daquela região, de quem ouviu relatos apontando para a urgente necessidade de um seguro de colheitas «acessível e eficaz» (também para a vinha e para as hortofrutícolas), já que este Governo alterou «tarde, mal e a más horas» o sistema anterior (que não era bom), «agravando brutalmente os custos dos prémios e mantendo um sistema desadequado para a região».
Estes produtores de maçã precisam ainda de água – prometida mas que ainda não chegou, «nem grande barragem nem pequenas charcas» –, tal como carecem de Investigação e Desenvolvimento e, bem assim, de «uma concepção de fileira», hoje inexistente, num vazio em tudo igual ao «dos serviços oficiais depauperados de meios e recursos humanos».
Sanidade animal
Não são também propriamente boas notícias as que chegam ainda da Beira Alta, em concreto da União das Associações de Defesa Sanitária (ADS), envolvendo 10 Organizações de Produtores Pecuários (OPP) de seis cooperativas e quatro associações. Da sua visita àquela estrutura associativa, Agostinho Lopes pôde confirmar que as associações em matéria de custos no plano da sanidade animal não só não receberam o que falta de 2011 (65 a 70 por cento) como continuam sem saber como vai ser neste ano de 2012.
O que sabem é que o PSD e o CDS-PP «eram, há pouco mais de um ano, contra a passagem dos custos da sanidade animal para cima dos produtores» mas, agora, «é o que está a acontecer», anotou o parlamentar comunista, advertindo que pode estar em causa «um património de saúde animal que significou o investimento de muitos milhões de euros de fundos públicos».
«De que está o Governo à espera para agir? De algum desastre? A situação é insustentável», afirmou Agostinho Lopes, veiculando o sentimento e a preocupação que perpassam hoje pelos responsáveis da sanidade animal de centenas de explorações pecuárias da Beita Alta, face à falta de resposta a problemas que implicam com a saúde pública e podem penalizar com gravidade a nossa exportação de produtos pecuários.
Cataclismo
A extensa lista de problemas, infelizmente, não se esgota aqui. A continuidade desta política agrícola que vem do governo PS/Sócrates tem ainda expressão na ausência de qualquer avanço no plano do regadio (o Baixo Vouga Lunar ou o regadio de Sabariz/Cabanelas, em Vila Verde, por exemplo), enquanto, por outro lado, no apoio à floresta, o que se verificou foi uma reprogramação do ProDer com um corte equivalente a 150 milhões de euros.
Agostinho Lopes insurgiu-se ainda contras as graves ameaças que pairam sobre as terras baldias (a ministra da Agricultura já falou em alteração à lei), alertando, por outra parte, para o propósito do Governo de «concessionar a privados as matas públicas», segundo notícias recentes.
Questão para a qual o PCP tem insistentemente chamado a atenção é ainda o preço do leite, com Agostinho Lopes a recordar que este caiu 2,5 cêntimos desde Janeiro, ao mesmo tempo que continuaram a subir os custos de produção (electricidade, gasóleo, palhas e rações).
Também o Douro e os seus crónicos problemas não foram esquecidos nesta declaração política, onde o PCP voltou a alertar para o estado de «cataclismo económico e social» da região, nomeadamente para a falência de adegas e para a não resolução do quadro que afecta a Casa do Douro.
Populações sofrem
Não vêm apenas da política agrícola os ataques desferidos pelo Governo às populações do interior. Como bem salientou Agostinho Lopes, um renovado ataque aos serviços públicos está também em curso. Ao seu conhecimento chegou a informação de que o Ministério da Saúde se prepara – e este, que se saiba, é o caso mais recente – para desactivar as estruturas do INEM em Vieira do Minho, Cabeceiras e Celorico de Basto.
«Não basta os encerramentos e ameaças em curso nas unidades e serviços de saúde, na rede escolar, nos serviços de finanças, nos transportes ferroviários», afirmou o deputado do PCP, que não escondeu a sua indignação por o Executivo de Passos Coelho e Paulo Portas, ainda por cima, intensificar esse ataque aos cidadãos do interior retirando-lhes também o INEM, os tribunais e até as freguesias.
Escamotear a realidade
Ao deputado do PSD Pedro Lynce, que se regozijara com a acção do Governo apontando-lhe uma mão cheia de qualidades – a presença do primeiro-ministro nas feiras e outros eventos, por exemplo –, respondeu Agostinho Lopes fazendo-lhe notar que as visitas são importantes mas estão longe de preencher a falta de uma adequada política agrícola. E relevou sobretudo o facto de o seu interlocutor não ter tocado em nenhuma das questões essenciais por si suscitadas, fuga essa especialmente notória no que se refere à questão da sanidade animal.
E mesmo em relação à questão da seca, sobre a qual o deputado laranja tecera também um rasgado elogio ao Ministério da Agricultura, lembrou-lhe que só tarde e a más horas é que foram adoptadas algumas medidas (nem todas ainda operacionalizadas), depois de um longo compasso de espera justificado com públicas expressões de Assunção Cristas de que a falta de chuva se resolveria pela fé.
Em suma, a visão optimista evidenciada pelo deputado do PSD só pode ser entendida por desconhecimento da realidade no terreno ou, até, por falta de uma simples leitura dos jornais, pois, como salientou Agostinho Lopes, «nem a CAP, hoje, consegue fazer uma leitura positiva da política agrícola do Governo».
À acusação de que o PCP tem uma «visão distorcida», segundo o deputado do CDS-PP Abel Baptista, contrapôs Agostinho Lopes com o aforismo de que o pior cego é o que não quer ver. Na versão minhota, a da sua região, o deputado do PCP invocou o ditado popular que diz que «quem feio ama bonito lhe parece».
«Os senhores estão a ver bonito aquilo que continua a ser uma política agrícola de desgraça». E assim arrumou a questão, não sem antes deixar um exemplo que ilustra essa realidade: o facto de «a grande distribuição continuar a fazer operações que penalizam de forma brutal e gravemente a produção nacional».