Tenham vergonha!

Maurício Miguel

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Qual é a diferença actual entre o Governo PSD-CDS/PP de Passos Coelho/Portas e o PS de António José Seguro? Pode parecer surpreendente para alguns leitores mas a resposta é muito simples: «um ano». Sim, repito, «um ano» – correndo o risco de afirmar algo matematicamente inconclusivo e politicamente difícil de explicar. Segundo o semanário Expresso, «o PS está a levar a cabo uma intensa ofensiva diplomática junto dos seus parceiros europeus para os convencer da necessidade de Portugal dispor de “mais um ano” para cumprir as metas do ajustamento negociado com a troika». Segundo o mesmo jornal, reportando-se à explicação dada pelo secretário nacional do PS para as Relações Internacionais, trata-se de uma iniciativa «inédita na história do PS». Isto de se dirigirem ao estrangeiro tem pinta, entretém e dá a ideia de que o esforço é de tal dimensão que ultrapassa as fronteiras do «Estado», alimentando a ideia que só poderão vir de fora – talvez por obra e graça do divino, porque da UE estamos fartos de ver o que vem – as soluções que são, em primeiro lugar, construídas cá dentro pela luta organizada dos trabalhadores e do povo português. Mas este «esforço» não se fica por aqui. Segundo noticiaram vários órgãos de comunicação social, António José Seguro encontrou-se na semana passada com alguns homólogos «líderes» de partidos «socialistas» e com o presidente do grupo parlamentar dos «socialistas e democratas» no Parlamento Europeu, com quem abordou a estratégia a adoptar nas votações sobre o chamado «pacto orçamental» e a questão da introdução da «regra de ouro» e do «mecanismo de estabilização».

António José Seguro não tem tarefa fácil, reconheça-se, fazer oposição sem o ser tem muito que se lhe diga e quando o espaço de manobra se reduz, invoca apoios dos congéneres de fora. E ao mesmo tempo, lá vai continuando a sua saga pelo vocabulário, pela postura, pela criação de uma alternativa que não tem – nem quer ter – mas que necessita de encenar para manter as hostes do partido animadas e tentar enganar o povo.

Na conferência de imprensa realizada com o «líder» do Partido Democrático de Itália, Seguro tirou da cartola do oportunismo mais uma tremenda aldrabice em relação à introdução na Constituição da República Portuguesa, ou em lei equivalente, de um limite ao défice e à dívida, afirmando tratar-se de uma «questão de Estado». Não se pense que o disse de uma forma leve, pelo contrário, reuniu o seu ar mais sério, até mesmo sofrido, afirmando que esta não era uma questão partidária – respondendo assim ao desafio lançado por Passos Coelho no Congresso do PSD – mas antes uma questão de «Estado» e que «a mensagem que Portugal devia dar para o exterior é que 80 por cento da representação parlamentar (PSD, PS e CDS) está de acordo em acolher essa regra». E acrescentou: «Não se crie divisões em matérias substantivas e politicamente relevantes». Seguro e o PS navegam nas águas conturbadas da inevitabilidade, mentindo e aldrabando o povo com uma suposta oposição que nunca foram, nem serão. Foi este o papel que o PS desempenhou desde a sua criação e irá continuar a desempenhar.

Poderia o PS e toda a social-democracia – nas suas várias identidades – ser diferente? Não, não podia. No momento em que se aprofunda a crise do capitalismo, com todas as consequências para os trabalhadores e o nosso povo, o PS evidencia uma vez mais a sua natureza de classe ao serviço do próprio sistema. Não espanta que queira fazer letra morta da Constituição da República Portuguesa, dos princípios progressistas que ainda consagra, quer pela via da sua alteração, quer pela via da imposição de regras – como a dita «regra de ouro» – que negam a concretização de direitos e liberdades fundamentais nela consagrados pela luta do povo, transformando o nosso País numa colónia dos interesses alheios ao povo português e aos seus anseios (grandes potências da UE, particularmente da Alemanha). Em Portugal e na UE, a social-democracia vê o seu espaço de manobra reduzido. A sobrevivência imediata do sistema exige a acelerada concentração e centralização do capital em Portugal e na UE, a destruição das soberanias dos povos para os desarmar e impor o retrocesso social. E a tudo isto o PS diz: presente! É mesmo caso para dizer... 



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