Os descarados

Leandro Martins
Ora reparem nos comentários tecidos em redor de notícias que abalaram este Julho/Agosto do nosso descontentamento: Israel invade o Líbano sob o pretexto do rapto de dois soldados. Os bombardeamentos de civis, entre os quais muitas mulheres e crianças aparecem-nos assim com a benção de Bush e dos seus numerosos lacaios, em que se incluem os lusos comentadores encartados. Está tudo justificado! Um tal senhor Queiroz, subdirector de seu estado, vem gritar no Correio da Manhã contra um programa da RTP2, o Clube de Jornalistas, acusando-o de se apresentar a «dar voz aos que não têm voz». «E os que não têm voz», ironiza ele, «são os que não gostam de Israel, porque toda a nossa imprensa está feita com o sionismo e contra o Hamas e o Hezbollah». Bombardeamentos sobre o Líbano? O subdirector não quer saber. O que o incomoda são os que, em resposta, atingiram Haifa. Mas, a dar uma ajuda, lá aparece o editor Catarino, do mesmo jornal, a justificar os ataques a civis, porque... «os gerrilheiros do Hezbollah são todos civis»!
Eles vão-se mostrando cada vez mais descarados no seu apoio aos agressores de Israel que, convenhamos, não são os maiores responsáveis pelos massacres e agem como cães de fila dos EUA e dos seus aliados.
Este descaramento no apoio ao imperialismo atinge, por outro lado, o cúmulo, quando se trata de propagandear a bondade dos enterrados regimes fascistas que aterrorizaram a Europa. Branquear é a palavra de ordem. Vasco P. Valente, na sua prosa envinagrada, vai ao ponto de chamar ao fascismo português «uma ditadura conservadora e católica», e descasca na pobre São José Almeida por ela se ter atrevido a criticar o branqueamento do «Estado Novo». A jornalista do Público aparece assim quase como uma perigosa «estalinista» aos olhos do comentador que, no dia seguinte, volta à carga para zurzir em Zapatero e na sua lei tão tímida que apenas se limita a reconhecer que houve vítimas da sangrenta ditadura franquista mas se coíbe de nomear os carrascos. V.P.Valente vai ao ponto de «ensinar» que a Resistência francesa não teve qualquer valor militar. Quanto à lei de Zapatero, Valente vê nela o perigo de abrir «um processo de revisão histórica» que pode levar a uma nova divisão da Espanha! E põe a coisa em termos equitativos – em 36, as culpas dividiam-se – de um lado havia a «Espanha centralista e católica de Franco»; do outro, uma República igualitária, anticlerical e federalista». As «culpas» são para dividir ao meio, portanto.
Nesta escalada de descaramento, ainda não se chegou ao ponto de apelar à ressurreição de Hitler e de exigir o massacre dos comunistas.


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