A «missão»

Henrique Custódio
No início desta semana a NATO recebeu o comando operacional das forças militares internacionais colocadas no Sul do Afeganistão o que, nas palavras do Público, constitui «a mais difícil missão de toda a sua história».
Aqui para nós, trata-se de muito mais que isso: em 57 anos de existência, desde que a NATO foi criada à volta dos EUA, em 4 de Abril de 1949, com o objectivo expresso de «constituir uma frente ao bloco comunista», é a primeira vez que este instrumento bélico ao serviço da política imperial norte-americana assume o comando directo de operações militares ofensivas em território estrangeiro.
E isto tem consequências directas e concretas.
Segundo a notícia, o «testemunho» transitou oficialmente das mãos do general norte-americano Karl Eikenberry para as do general britânico David Richards, comandante da Força Internacional de Assistência à Segurança da NATO (Isaf), que passou a liderar este seu contingente da Isaf de oito mil homens no Sul do Afeganistão constituído, maioritariamente, por tropas britânicas, canadianas e holandesas, mas também integrando militares australianos, canadianos, estonianos, dinamarqueses, romenos e, ainda, norte-americanos.
A notícia dá relevo a este último pormenor - o de esta força da NATO integrar, pela primeira vez, militares dos EUA em combate a ficarem sob comando não norte-americano -, ao mesmo tempo que não assinala o fundamental: o de, também pela primeira vez, se constituir uma força militar multinacional no âmbito da NATO que entrou oficialmente em guerra em substituição de forças norte-americanas e cumprindo no terreno, ela mesmo, as estratégias e os objectivos políticos definidos pela administração dos EUA.
É que a presença da NATO no Afeganistão não se limita a este contingente da Isaf no Sul do país: antes dele, já havia estendido as suas operações militares de Cabul para o Norte e o Ocidente num total de 13 províncias afegãs, passando agora a NATO a comandar no Afeganistão um efectivo total de 18.500 soldados provenientes de 37 países, perspectivando-se que este número se elevará a 23.000 militares até ao final deste ano, quando se completar esta «expansão» da NATO para Sul e também para Leste, como está previsto.
Em suma: os EUA, sob a liderança da administração Bush, começaram por invadir o Afeganistão numa retaliação cega pelos atentados de 11 de Setembro de 2001 em Nova Iorque.
Aproveitando o ensejo, esta administração norte-americana de ultraliberais povoada de gente de extrema-direita assumiu-se arrogantemente como polícia do mundo e lançou-se de seguida no tenebroso atoleiro da invasão do Iraque, com o pretexto de perseguir armas de destruição maciça e o objectivo mal disfarçado de controlar o petróleo e o poder da região.
Finalmente, a administração Bush apontou baterias ao regime fundamentalista do Irão, arreganhou ameaças à Síria e deu carta branca aos sionistas de Israel para massacrarem e invadirem o Líbano e sempre os palestinianos, sob pretexto do aprisionamento de dois soldados israelitas pelo Hezzbollah.
O resultado está à vista: o Afeganistão tornou-se um atoleiro mortífero para as tropas de ocupação norte-americanas, o Iraque afundou os EUA num novo e catastrófico Vietname e os sonhos de domínio imperial no Médio Oriente e na região transformaram-se num pesadelo que a administração Bush já nem forças militares tem para aguentar.
Daí a importância, para os EUA de Bush, de pôr finalmente a NATO a fazer a sua guerra no Afeganistão.
O que significa uma coisa terrível: as chamadas «democracias ocidentais» deixaram-se envolver directamente nas guerras americanas, o que as encaminha para uma guerra mundial...


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