Sondagens – Previsão ou manipulação

Jorge Cordeiro
Volvidas que estão as eleições regressemos ao tema. Já não na base de alegações susceptíveis de serem repelidas porque especulativas mas sim com fundamento na comparação entre o caudal de «previsões» despejadas e o resultado expresso por quem decide – os eleitores.
Deixaremos de lado o que já aqui outros, e com mais detalhe, se encarregaram de apresentar como pequenos truques podem fazer com que as sondagens cumpram o que alguns determinaram querer que cumpram: a questão da participação na amostra, a dimensão da amostra e a sua distribuição regional, a formulação das perguntas, a ausência de intervalo. E sobretudo essa habilidade de transformar uma previsão numa certeza a partir da qual se titulam, fundamentam e induzem as conclusões políticas que mais interessam aos que as dominam e encomendam.
Fixemo-nos apenas na observação objectiva de dois casos: a sequência das 24 sondagens registadas no âmbito das eleições presidenciais e esse caso mais particular de estudo (ou de policia!) que a sondagem da Marktest nos seus esforçados 12 dias constituiu. Sobre a primeira, três notas: o facto de nas 24 sondagens publicadas ter sido sempre atribuído a Cavaco Silva valores bem superiores ao seu resultado, sendo que em 17 delas as previsões estiveram sempre mais de 5 pontos percentuais acima do que obteve; o pormenor de em 15 destas 24 sondagens Francisco Louçã aparecer sempre com valores superiores (alguns bem superiores) àquilo que mostrou valer nas eleições; e a proeza de em 24 das 24 sondagens Jerónimo de Sousa aparecer sempre com valores inferiores ao que os que decidem lhe quiseram dar.
Quanto à da Marktest, registe-se o facto de, a exemplo do primeiro caso, Cavaco Silva aparecer desde sempre com valores bem acima do que veio a obter; e esta curiosidade cientifica de em 12 das 12 sondagens publicadas pelo DN/TSF Louçã ter sido sempre bafejado com resultados superiores aos que veio a obter e de ter sido possível atribuir a Jerónimo de Sousa em 12 das 12 sondagens valores bem inferiores aos que veio a obter. Ficará para o acervo de exemplos de manipulação a delirante sondagem de 14 de Janeiro em que se atribuía a Louçã quase o dobro das intenções de voto de Jerónimo e um quase empate técnico com Mário Soares.
Dir-se-á que sondagens são estudos de opinião, falíveis e voláteis, para serem lidos como descrição de preferências e não como resultados. Assim será. Mas a verdade é que neste país são sempre vendidas como resultados num dado momento, com esta particularidade de a sua falibilidade ser sempre e curiosamente correspondente à arrumação de interesses de alguns, e com o pormenor de jogarem sempre no sentido da menorização do PCP. Dir-se-á tratar-se de mera coincidência mas o que é um facto é que a sequência destas sondagens tiveram a particularidade de desempenhar um papel essencial e complementar ao que os editores e responsáveis de informação haviam decidido decretar: a apresentação da Cavaco Silva como candidato imbatível.
Imprecisões inerentes a este instituto? Falta de rigor e profissionalismo? Pura fraude? A resposta fica à reflexão de cada um.


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