José Neto

Situação na Justiça


Quatro anos se passaram e continuam marcantes os traços de uma crise que há muito afecta o sistema judicial.
Com a chegada ao poder da coligação PSD/CDS-PP, a situação na justiça não mudou e os problemas agravaram-se.
A morosidade da justiça e a prescrição dos processos continuam; a justiça tornou-se mais cara, com a decisão deste governo de aumentar as taxas e as custas judiciais; continuam as disfunções no sistema prisional, com as prisões a abarrotar de excluídos, apesar do show-off das medidas anunciadas.
Morosidade ou justiça de classe não são figuras de retórica, quando caracterizamos a situação de desigualdade dos cidadãos no acesso aos tribunais e à realização da justiça.
A situação escandalosa na justiça do trabalho é disso demonstrativa. Milhares de trabalhadores têm processos pendentes, que esperam anos a fio para receber aquilo a que têm direito, em casos de salários em atraso ou de falência de empresas. É necessário que se criem mais tribunais de trabalho para acabar com esta injustiça, com esta vergonha.
A desresponsabilização do Estado, numa linha privatizadora na área da justiça, conhece desenvolvimentos preocupantes, numa estratégia verdadeiramente mercantilista da justiça, como é a privatização dos notários, a privatização das acções executivas, as privatizações no sistema prisional, a venda de património e até, pasme-se, o investimento de verbas da justiça no mercado de capitais.
E se falarmos do apoio judiciário, que a Constituição garante a todos os cidadãos, o Governo descarta responsabilidades, passando-as para a Ordem dos Advogados. Aprova uma lei que, por não regulamentada, deveria ser suspensa e publica uma portaria que restringe de tal maneira o acesso, que só os indigentes poderão candidatar-se à assistência judiciária gratuita. Isto é, também nesta matéria, como na Saúde ou na Educação, quem quer Justiça paga-a.
A impunidade continua. Bem pode o Governo, como há tempos fez Durão Barroso a propósito da Casa Pia, afirmar que já não há uma justiça para ricos e outra para pobres. Está longe de ser verdade, infelizmente.
As notícias dos escândalos e da corrupção, das fraudes fiscais e dos crimes sem perdão, ou dos processos que se levantam, continuam a encher os telejornais. E, no entanto, é o que se vê. Quem se lembra já do processo do Fundo Social Europeu, ou da mega investigação à grande corrupção fiscal ou até do Apito Dourado?
Seria mau se nos deixássemos embalar ou iludir pelo espectáculo mediático. A realidade é que a impunidade continua, e é com isso que é preciso acabar.
Igualmente preocupantes são as tendências recorrentes e os casos de interferência mais ou menos visível, do poder político com a independência do poder judicial.
Volta a estar na ordem do dia o questionamento da autonomia do Ministério Público. No dia em que o Ministério Público dependesse do Poder Executivo, não poderiam os cidadãos ficar descansados. A partir daí, passaria o Governo a mandar nas investigações, escolhendo os processos que iriam ou não a julgamento. Com a corrupção que grassa no País e estando ela normalmente associada ao poder, o resultado seria previsível.
Tal cenário, de uma gestão política da justiça, está bem patente no Programa Eleitoral do PSD, onde é defendida uma maior intervenção do Ministro na esfera do poder judicial. A verificar-se, tal constituiria um retrocesso no Estado de direito para o tempo antes do 25 de Abril. Não podemos permiti-lo.
É essencial para o Estado de direito democrático a preservação e defesa do poder judicial, garantindo a sua independência face ao poder político. Questão central é a defesa do princípio constitucional da legalidade no exercício da acção penal pelo Ministério Público e do modelo de investigação criminal sob a sua direcção.
Continuamos a pugnar por meios efectivos e eficazes contra o crime organizado, cuja crescente sofisticação exige medidas urgentes no campo da formação e especialização daqueles a quem incumbe directamente esse combate.
Tardam as medidas e respostas necessárias aos males de que padece o sistema judicial e que há muito estão diagnosticados. Para tal diagnóstico e para tais medidas muito tem contribuído o PCP, não apenas com a sua reflexão mas também e sobretudo com as suas propostas.
O PCP defende uma política de justiça que promova as reformas necessárias e urgentes com vista a assegurar eficazmente o princípio constitucional da igualdade dos cidadãos perante a lei e no acesso a uma justiça mais próxima e mais célere e que defenda os seus direitos, liberdades e garantias.
O PCP está, como sempre esteve, preparado para o debate necessário. Estaremos lá, com responsabilidade, com as nossas opiniões, propondo medidas e lutando por elas.
O novo ministro da Justiça desencadeou agora um novo lance – está aí mais um “pacto de regime” em que os partidos do poder são useiros e vezeiros. Com os objectivos habituais. Desta vez para a justiça. De “pactos de regime” contra o regime democrático estamos fartos. O nosso pacto, em matéria de justiça, é com a Constituição.


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