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Maternidade e Paternidade
Uma Campanha Pública
pelos direitos

Entrevista com Graciete Cruz

A necessidade de reforço da luta pelo cumprimento dos direitos ligados à maternidade e paternidade motivou a realização de uma Campanha Pública da CGTP-IN «Basta de ilegalidades é hora de efectivar direitos», que decorreu de 22 a 26 de Outubro. Esta acção permitiu um amplo contacto com milhares de trabalhadoras(es) nos locais de trabalho informando sobre os direitos legalmente consagrados e ao mesmo tempo aprofundando os casos concretos de violação desta lei. A este propósito o Avante! conversou com Graciete Cruz, da Comissão Executiva da CGTP-IN e responsável pela área das mulheres.

– Quais as principais razões da realização da Campanha pública Pelos Direitos de Maternidade e Paternidade?

Graciete CruzA efectivação das leis do trabalho é, cada vez mais, uma questão suscitada pelos trabalhadores e pelas suas estruturas representativas. Se atentarmos a que os atropelos aos direitos individuais e colectivos consagrados nas leis e nos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho são uma constante em muitas empresas e locais de trabalho; se tivermos presente a ineficácia, o mau funcionamento e a morosidade dos órgãos de fiscalização e de punição dos infractores; se a isto acrescermos as anunciadas intenções do Governo de apanhar a «boleia», perigosa, da chamada «Comissão de Sistematização da Legislação Laboral» para alterar as Leis Laborais, então perceber-se-á melhor como é pertinente e oportuna a preocupação e, sobretudo, a exigência de acção.

Ora, a legislação que regulamenta os direitos de maternidade e paternidade é, pelo conhecimento que temos, uma das mais (se não a mais) frequentemente alvo de condicionamentos e violações por parte do patronato e das administrações.

Havia, pois, que passar à acção, de forma coordenada, e centrando a nossa atenção em dois sentidos: por um lado, a divulgação dos direitos, junto das trabalhadoras e trabalhadores; por outro, a denúncia das violações legais e contratuais conhecidas e a consequente exigência de efectivação dos direitos, através da comunicação social e junto das instituições.

– Qual é o balanço que fazem da sua concretização? O movimento sindical sentiu que estas questões não dizem respeito apenas às mulheres, mas aos trabalhadores?

O balanço é francamente positivo. Contactámos largos milhares de mulheres e homens (mais de 123 mil) em todo o país - predominantemente nos locais de trabalho - através da distribuição de um folheto com informação útil sobre os direitos de maternidade e paternidade; realizámos plenários de trabalhadores, conferências de imprensa, bancas de rua, acções públicas de denúncia - como foi o caso da «Praça Pública», promovida pela União dos Sindicatos de Lisboa.

O levantamento de casos que efectuámos abrangeu igualmente todo o País e a generalidade dos sectores de actividade e comprovou que as infracções à lei ocorrem tanto na administração pública como no sector privado, se bem que de forma mais diversificada e com maior expressão neste último.

Um dado a registar é, sem dúvida, a presença significativa de homens, muitos deles jovens, nas iniciativas e mesmo na fase preparatória da Campanha. Tal significará um melhor conhecimento dos direitos, uma maior consciencialização quanto à natureza e dimensão dos problemas que afectam tantas trabalhadoras e já alguns trabalhadores, constituindo, ao mesmo tempo, afirmação de que a luta pela efectivação destes direitos respeita a todos e a todos deve envolver.

– A Comissão Nacional de Mulheres da CGTP-IN tem vindo a dar uma grande atenção aos direitos da maternidade com expressão concreta no lançamento de inquéritos e em iniciativas junto dos grupos parlamentares, de que é exemplo o 8 de Março. Este é um problema central das mulheres trabalhadoras?

A cultura instalada, sedimentada ao longo dos séculos, sempre atribuiu à mulher, os cuidados com as crianças e a família – o seu papel social queria-se confinado à esfera privada e à maternidade.

Assim, quando começou a participar de forma mais expressiva no mundo do trabalho, a mulher passou, «naturalmente», a acumular a dupla tarefa, continuando a assumir, no essencial, o acompanhamento e a educação dos filhos.

As próprias normas legais só tardiamente começaram a relevar a paternidade, os direitos a ela associados e os direitos partilhados.

Em resultado, a mulher, e em particular a jovem trabalhadora, não só vê serem-lhes cerceados direitos legais e contratuais relacionados com a maternidade (e a paternidade), como o facto de ser mãe ou a expectativa de o vir a ser acabam por a transformar em alvo preferencial das discriminações praticadas pelo patronado e pelas administrações.As mulheres são discriminadas no acesso ao emprego; são despedidas quando engravidam na vigência de um contrato precário; descontam-lhes, no salário, ou perdem prémios, por causa do tempo gasto em consultas pré-natais ou a amamentar ou a aleitar as crianças; não têm actualizações salariais na sequência da licença de maternidade; são vítimas de repressão e prejudicadas na carreira.

E tudo isto a Lei proíbe

– Consideras que as queixas que chegam à CITE e mesmos aos Sindicatos estão na proporção das discriminações das trabalhadoras e dos trabalhadores e da violação ao exercício dos seus direitos no domínio da maternidade-paternidade?

Não. Tenho mesmo a convicção de que a ordem natural das coisas se inverteu. Ou seja, a excepção parece ser a regra.

Para tal concorrem os elevados e crescentes índices de precariedade - as mulheres constituem a maioria dos trabalhadores com vínculo precário – geralmente associada a um escasso grau de efectividade dos direitos, seja por obstaculização patronal, seja pelo desconhecimento dos próprios direitos. Contudo, muitas das infracções nem chegam ao conhecimento dos sindicatos.

O Governo tem vindo a anunciar novas medidas no domínio do reforço dos direitos da maternidade – paternidade? Qual a avaliação que fazes da acção do Governo neste domínio?

A melhoria dos direitos constitui uma expectativa legítima de quem trabalha. Mas os avanços legislativos só por si não bastam se não houver vontade política para os fazer aplicar.

E este Governo tem dado provas de estar mais preocupado com a forma que com a substância. A título de exemplo, veja-se a continuada insuficiência de meios, de natureza diversa, dos organismos encarregues de produzir pareceres, de fiscalizar e de punir as infracções.

Falávamos há pouco da CITE, uma Comissão criada para promover a igualdade no trabalho e no emprego, com um campo de actuação importante no domínio da aplicação dos normativos legais, designadamente em matéria de maternidade e paternidade.

Mas o que é facto é que, exceptuando os casos de despedimento de grávidas, puérperas ou lactantes , em que os pareceres são emitidos no prazo de 30 dias, a generalidade das queixas, muitas delas relacionadas com direitos de exercício limitado no tempo, chegam a demorar dois e três anos a aguardar parecer - dizem-nos que por escassez de meios técnicos.

– Estas reivindicações da CGTP-IN irão estar presentes nas acções de luta de 7 de Novembro?

A efectivação dos direitos, onde se inserem os de maternidade e paternidade, é um dos objectivos centrais da política reivindicativa da CGTP-IN.

Daí que a Campanha tenha sido preparada e realizada como elemento também de dinamização da própria Jornada de Luta de 7 de Novembro próximo, conforme deliberação da Conferência Nacional sobre Acção Reivindicativa que, em Setembro, reuniu mais de 1000 quadros sindicais.

No movimento sindical unitário a protecção da maternidade e da paternidade é já um objectivo de luta comum. A Campanha que realizámos ajudou a consolidar esse caminho sem retorno.

«Avante!» Nº 1458 - 8.Novembro.2001