Tribuna do Congresso

Omissões e rupturas

 

O Projecto de Alterações ao Programa do PCP lança uma ponte entre a democracia avançada e os valores de Abril no futuro de Portugal. A relação pode ser fonte de confusões.

O desenvolvimento da revolução democrática e nacional foi travado pelo golpe contra-revolucionário do 25 de Novembro. O fim da aliança entre o movimento popular e o MFA inviabilizou o projecto revolucionário.

É transparente que a relação de forças é hoje muito mais desfavorável do que a existente no período das conquistas de Abril. Conclusão: no actual contexto o carácter da futura revolução portuguesa terá de ser outro; a Historia não se repete.

O Projecto de Programa define a Democracia Avançada tal como a concebe nas suas quatro vertentes e expõe os objectivos a alcançar para que o Portugal ideado possa ser uma realidade.

A democracia avançada – afirma-se – «criará condições propícias a um desenvolvimento da sociedade portuguesa conduzindo ao socialismo».

O documento submetido aos militantes lembra, porém, e bem, que «a questão do poder acaba por condicionar o curso da política nacional». Não apenas em Portugal – acrescento – mas em qualquer país.

O projecto de alterações, claro e quase exaustivo ao desenhar o quadro de uma ambiciosa democracia avançada, é porém omisso quanto ao desafio fulcral: como concretizar o objectivo fixado?

Cabe recordar a velha pergunta de Lénine: Que Fazer?

O PCP «aponta ao povo português como seu objectivo a futura construção do socialismo». Mas o Projecto não esclarece como deve actuar o «partido de funcionamento democrático, enraizado nas massas», na luta contra o poder da burguesia para construir a sociedade de transição.

O Projecto de Resolução Política também não responde à questão fundamental.

Condenando a criminosa política praticada pelos governos do PS e do PSD-CDS, a direcção do Partido propõe como alternativa «uma política patriótica de esquerda».

Nas Teses reafirma-se que «a luta de massas constitui a expressão central, essencial e determinante da resistência e da luta do povo português». Mas, simultaneamente, a insistência numa táctica que defende o advento de «um governo patriótico de esquerda» no quadro institucional existente gera confusão.

Obviamente a luta institucional, a luta eleitoral e a luta de massas não são incompatíveis, mas complementares.

Mas estarão as duas primeiras colocadas ao serviço da ascensão torrencial da luta de massas como prioridade no combate para a transformação revolucionária da sociedade?

A pergunta é inseparável de outra: no actual contexto português é possível um «governo patriótico de esquerda»?

Registo que no Projecto de Teses se afirma que a alternativa proposta pode constituir um processo complexo e eventualmente prolongado que «assuma uma corajosa ruptura com a política de domínio do grande capital».

Essa ruptura seria portanto uma luta dentro do sistema e não uma «ruptura» com o sistema.

A ambiguidade desse conceito de «ruptura» pode empurrar muitos militantes para a conclusão de que aflora no Partido uma tendência reformista de matizes eleitoralistas.

É motivo de orgulho para os seus militantes que o Partido se defina como marxista-leninista. O PCP mantém-se fiel à sua ideologia revolucionária. Precisamente por isso, os projectos agora divulgados deveriam ser claros na afirmação de que as transformações revolucionárias na sociedade portuguesa são incompatíveis com reformas inatingíveis no âmbito do capitalismo. O caminho para o socialismo passa pela destruição, sem calendário, do capitalismo.

Miguel Urbano Rodrigues

 

O que fazem membros do PCP no «Congresso das Alternativas»?

 

Segundo o Público (de 5/10 p. 8) Manuel Carvalho da Silva, até há poucos meses secretário-geral da CGTP-IN, um dos organizadores e porta-vozes do auto-designado congresso das alternativas, assumindo-se como membro do partido, afirma: «há na organização militantes do BE, do PS e do PCP – do PCP não somos assim tão poucos.» É no mínimo surpreendente que alguém que há bastante tempo e de forma metódica, em declarações sucessivas à comunicação social tem feito questão de se distanciar do seu partido, venha agora assumir a sua condição de militante na organização deste congresso para enfatizar a participação de «não poucos» militantes do PCP.

Se esta afirmação é verdadeira, das duas uma: ou há camaradas que andam distraídos, e em vez de discutirem nas reuniões partidárias ou na tribuna do Avante!, as propostas de resolução política, de alterações ao programa e estatutos do Partido, em discussão para a aprovação no XIX Congresso, defendendo aí as suas posições, nomeadamente quanto a alianças sociais, políticas, a plataformas de unidade, alternativas ou convergências, para que sejam aprovadas e levadas à prática pelos seus órgãos legítimos com toda a força e coesão, ou então, desconhecem as regras, natureza e características do Partido. Senão não constituiriam nem integrariam organização paralela para discutir, enquanto militantes do PCP e à revelia da sua direcção, com outros cidadãos e membros de outros partidos, propostas de alternativa política próprias.

Sempre ouvi dizer que aqueles que têm problemas com a mulher e começam a discuti-los com os vizinhos em vez de os resolverem com ela em casa, já estão é a pensar no divórcio (e litigioso) e o que procuram é arregimentar testemunhas para a sua causa. Por mim penso que é muito mais civilizado, democrático e corajoso resolverem-se as coisas pela discussão clara e frontal, e a bem, por mútuo acordo, do que criarem-se pretextos para armar em vítima.

Sou dos que pensam que a democraticidade do Partido (bem como de qualquer outra associação) passa pelo cumprimento das suas regras e, no caso, pela disciplina partidária. Admitindo que alguns dos camaradas contabilizados pelo acima citado porta-voz do congresso das alternativas as possam desconhecer, para seu governo e ilustração permito-me citar uma das que em minha opinião se aplicam à situação em causa.

Se dúvidas houvesse sobre esta leitura, os organizadores do congresso da Aula Magna encarregaram-se de as eliminar ao decidirem aprovar um programa político e manter-se organizados para o levar à prática. Ora veja-se:

«Artigo 16.º 2. São princípios orgânicos fundamentais: (do PCP) (…) h) o cumprimento das disposições estatutárias por todos os membros do Partido e a não admissão de fracções – entendidas como a formação de grupos ou tendências organizadas – que desenvolvam actividades em torno de iniciativas, propostas ou plataformas politicas próprias.»

Não proponho que esta regra seja revogada pelo XIX Congresso do Partido. Antes proponho que os órgãos dirigentes que vierem a ser eleitos incluam nos conteúdos para a formação dos quadros, o estudo, divulgação e interpretação dos estatutos. E que os organismos de base e intermédios do Partido, nas suas reuniões regulares, contemplem um ponto prévio em que seja discutido um artigo em cada reunião.

Américo Nunes

 

Militância

 

A luta consistente e organizada dos trabalhadores – força social central – é a resposta que se impõe à exploração, ao retrocesso, à injustiça. A luta necessita de um Partido forte, coeso e interventivo, ligado aos problemas dos trabalhadores, promovendo a luta pela derrota do pacto de agressão, da política de direita, do capitalismo e na defesa dos seus direitos, afirmando uma política patriótica e de esquerda.

O reforço do Partido é prioridade do militante e das organizações. Só com o reforço do Partido é possível uma acção política eficaz.

O desenvolvimento da organização, a centralidade do colectivo nas decisões, a captação e responsabilização de militantes, a divulgação da imprensa do Partido, a elaboração de propaganda de esclarecimento, a autonomia financeira, a afirmação do Partido da classe trabalhadora e afirmação do seu projecto socialista são elementos fundamentais do reforço do Partido e do seu prestígio junto dos trabalhadores e do povo.

A presença nas reuniões do Partido, elevando a participação e aprofundando a discussão colectiva, contribuindo para aperfeiçoar métodos de trabalho, para o reforço e crescimento das organizações e para o desenvolvimento da intervenção política de acordo com os princípios marxistas-leninistas é um dever do militante comunista.

A afirmação do colectivo nas decisões e orientações políticas é imperativo para a intervenção política assertiva, não numa perspectiva de submissão acrítica, mas no exercício da nossa liberdade aprofundando a liberdade colectiva, contribuindo para a solidez da democracia interna. Assumir e executar tarefas, dotados de consciência de classe e ideológica é ser militante. É levar o Partido mais longe. Enraizando-o, ainda mais, no seio dos trabalhadores.

Ler e divulgar a imprensa do Partido, no quadro político actual com forte promoção da ideologia dominante e omissão da actividade do Partido, assume importância decisiva, é um veículo fundamental para os militantes e trabalhadores na formação de classe e ideológica, no esclarecimento da política actual e na ascensão da alternativa necessária na consciência colectiva.

A elaboração de documentos de esclarecimento sobre os problemas mais simples ou complexos, a presença dos militantes onde reside o conflito e a participação vanguardista na luta pela defesa dos direitos dos trabalhadores é determinante para a elevação do prestígio do Partido.

A participação activa do militante comunista nas organizações de trabalhadores, associações e cooperativas populares, movimentos cívicos, é factor essencial de alargamento da acção do Partido, contribuindo para a convergência das diversas forças sociais na luta por uma política de esquerda.

A autonomia financeira do Partido que vive dos e para os trabalhadores é uma característica a preservar. A captação de fundos através das quotas dos militantes, de contribuição de camaradas e democratas, da realização de iniciativas é tarefa a estar sempre presente na consciência individual e colectiva. O pagamento de quotas é mais do que um dever estatutário é «como beijar o filho/na hora de deitar» (Mário Castrim).

Assegurar em toda a actividade do PCP a raiz operária, na defesa dos seus direitos, na luta pela sua emancipação é imperativo. A afirmação do projecto ideológico do Partido na avaliação correcta dos conflitos sociais, no prosseguir de uma democracia avançada, como resposta adequada aos problemas profundos provocado pelo capitalismo faz do PCP um Partido indispensável e insubstituível.

Mário Figueiredo

 

Explicar e clarificar conceitos

 

As Teses em discussão, a serem submetidas à apreciação do XIX Congresso, constam de um documento com cerca de 250 entradas, muitas delas interligadas entre si, não obstante por vezes haver repetições que poderiam ser melhor condensadas. Dada a impossibilidade de uma análise a cada uma dessas entradas seleccionei apenas quatro, sobre as quais, desde já, dou o meu contributo. Assim:

No ponto 1.0.1 é referido, e bem, que o «XIX Congresso realiza-se num contexto de particular exigência, complexidade e importância para a luta emancipadora dos trabalhadores e dos povos». Sublinho a palavra «complexidade», na medida em que, também entre nós, há dúvidas quanto ao peso específico das componentes – a externa e a interna –, nas causas da actual crise. Essa complexidade devia ser melhor desenvolvida à luz do ensinamento marxista-leninista utilizando, para o efeito, a terminologia constante nas Teses em discussão mas acompanhada de formulações acessíveis a todos.

Por exemplo: No ponto 1.1.1 são referidos dois conceitos, «crise de sobreprodução» e « lei da baixa tendencial da taxa de lucro». No ponto 2.5.1.6 há, também, uma outra expressão muito importante que passamos a transcrever: «empresas com reduzida composição orgânica de capital». Embora tais conceitos sejam familiares a muitos camaradas, provavelmente em relação a muitos outros haverá dificuldade na sua assimilação.

Nestes termos: o conceito de «crise de sobreprodução» deve ser melhor desenvolvido tendo em conta que no ponto 2.5.1 é reclamada a existência de um aparelho produtivo não só adequado às nossas necessidades como capaz de substituir as importações por produção nacional e, até, como é referido no ponto 2.5.1.10, garantindo «viabilidade e projecção externa da produção nacional». O conceito de sobreprodução aplicado à crise do sistema capitalista e o conceito de subprodução aplicado à crise do nosso País, são conceitos rigorosos.

Convém explicar que não há nenhuma contradição entre um e outro; o conceito relativo à «lei da baixa tendencial da taxa de lucro» deve ser melhor explicado à luz da incapacidade aquisitiva dos povos e tendo em conta, como sugestão didáctica, o desenvolvimento da formulação de Friedrich Engels que, em 1886, referiu o seguinte: «Enquanto o poder produtivo aumenta numa razão geométrica, a extensão dos mercados avança na melhor das hipóteses, numa razão aritmética».

O conceito «empresas com reduzida composição orgânica de capital» tem, como as restantes, uma extrema actualidade em função da acelerada introdução de maquinaria e sofisticados instrumentos no circuito produtivo alterando a relação do «capital constante» e do «capital variável», expressões que devem ser evidenciadas de uma forma bastante perceptível.

As sugestões atrás defendidas no sentido de facilitar uma melhor leitura e compreensão para explicar a natureza, a dimensão e o ciclo das crises do sistema capitalista deverão avolumar o texto em discussão.

Em minha opinião, o aumento do espaço tipográfico das Teses não levanta problemas. Tenhamos em conta que estamos a falar de um documento que, no futuro, irá servir de consulta não só para enriquecer textos a publicar no Avante!, n' O Militante, bem como para servir de base de sustentação a muitas reuniões e iniciativas. Estamos a falar de uma ferramenta de trabalho e não de um texto apenas discutido, aprovado e arquivado no dia 2 de Dezembro de 2012.

Estamos a falar de um texto que contribuirá na luta pela instauração de Uma Democracia Avançada – os Valores de Abril no Futuro de Portugal.

Anselmo Dias

 

Desmontar as mistificações sobre a classe operária

 

À tese que afirma a luta da classe operária e dos trabalhadores como motor da luta de massas (3.1), contrapõem os ideólogos burgueses que a classe operária: i) já não tem peso nas sociedades capitalistas contemporâneas; ii) está em processo de desaparecimento; iii) ao melhorar as suas condições materiais de vida, tende a esquecer as aspirações revolucionárias e a diminuir a acção transformadora que tem como objectivo derrubar o capitalismo e construir o socialismo. Estes ideólogos decretam, assim, o fim da luta de classes. (...)

É certo que diminuiu a sua percentagem nos assalariados, mas isso deve-se ao facto do número de assalariados não operários ter aumentado mais ainda, devido à contínua expansão dos serviços e às crescentes necessidades de assalariados para o sector financeiro, para actividades comerciais e de publicidade e para as tarefas administrativas em muitas empresas. A interpenetração entre o capital bancário e o capital de outos ramos de actividade deu como resultado o capital financeiro, constituído na base grandes grupos económicos, cujo domínio por parte da grande burguesia financeira – burguesia monopolista – se reflecte na obtenção de taxas de lucros mais elevadas do que as de outros camadas da burguesia. Sendo a burguesia a classe dominante nas sociedades capitalistas, é um facto que, em rigor, a sua fracção dominante, e por conseguinte a dominante de toda a sociedade, é a burguesia monopolista.

A situação que desde há muito tempo se vive no nosso País, demonstra a justeza da análise. (…) E, neste processo acelerado de destruição da economia nacional, as micro e pequenas empresas têm cada vez mais dificuldades de se sustentarem, enquanto os grandes grupos económicos atingem lucros escandalosos.

As classes sociais não são categorias estatísticas, pelo que o peso da classe operária não pode ver avaliado apenas pela sua expressão numérica. Ela é a grande criadora da riqueza social, fornece com o seu trabalho bens e serviços que sustentam toda a sociedade e, ao contrário do que é muitas vezes dito, a classe operária dos países desenvolvidos não deixou de ter aspirações revolucionárias, não perdeu razões para lutar, não concilia os seus interesses com a burguesia, não abandona a luta pelo facto de ter melhorado a sua situação material.

O Cap. III das Teses, ao afirmar a luta da classe operária e dos trabalhadores como o motor da luta de massas, descreve as inúmeras lutas que têm sido travadas nos últimos anos pelos trabalhadores, homens e mulheres que resistem, não se resignam e prosseguem determinados e confiantes a defender e prosseguir os ideais, conquistas e realizações da revolução de Abril.

Nesta caminhada pela construção de um futuro melhor para si e o seu povo a classe operária e os trabalhadores contam com o PCP, o partido que tem um ideal e um projecto, consubstanciado no programa que propõe ao Congresso: Uma Democracia Avançada – Os Valores de Abril no Futuro de Portugal, e que é inseparável da luta pela construção de uma nova sociedade de liberdade, de democracia e de paz, a sociedade socialista.

Entretanto, a classe operária, para se defender da exploração capitalista que a faz sofrer, tem de atacar os privilégios dos exploradores e, simultaneamente, tem de travar com muita determinação a batalha ideológica. De facto, as mistificações sobre a classe operária não são de hoje e permanecerão enquanto existir a sociedade dividida em classes, com as classes dominantes a actualizarem permanentemente o seu arsenal ideológico. Razão bastante para que o PCP também tenha de estar na primeira linha do combate das ideias, pelo socialismo.

Armando Farias

 

O feitiço contra o feiticeiro

 

É certo que o brutal ataque em curso contra os trabalhadores e, em geral, contra o povo português obriga a uma concentração e tensão imensas directamente no combate à obra de destruição em execução pelo «Governo de Portugal». Governo este mancomunado com os algozes da troika, a fraudulentamente fazer de seus mainates enquanto acobertado em funções que a República lhes confiou. E é mais clara que nunca a filiação directa das tenazes de especulação e agiotagem que se apertam em torno do País, na sua orientação para os interesses dos círculos dominantes do capital financeiro internacional e, sem menosprezo, quanto mais esquecimento, das suas extremidades no nosso País.

Mas tais preocupações não podem deixar para outra altura, antes exigem um conhecimento ainda mais aprofundado do poderoso e muito «dinâmico processo de rearrumação de forças na arena internacional», tal como é referido no §1.1.1. do Projecto de Resolução Política aprovado pelo Comité Central de 22/23 de Setembro passado. De facto, «a resultante é ainda (…) indefinida», contudo uma coisa parece ser certa: o papel central desempenhado pela ascensão da China a nível geo-estratégico.

E se dúvidas houvesse, a mudançaa de atitude dos EUA (e claro, em pleno processo eleitoral) em relação à China aí está para o demonstrar. Até há não muito (em particular durante 2011) os círculos políticos dirigentes dos EUA vinham demonstrando preocupação – e muito para eleitor ver – sobretudo com a taxa de câmbio entre o dólar e a moeda chinesa, «sugerindo» que a China estava a ganhar na globalização sobretudo devido à manipulação da taxa de câmbio – manipulação que era, no entanto, bem vista pela parte dos capitalistas norte-americanos com operações industriais na China.

E isto depois de, durante décadas da Guerra Fria, os EUA se terem servido da China na sua luta contra a União Soviética! E, mais tarde, de terem visto com bons olhos – terem mostrado a luz verde – à entrada da China para a Organização Comercial de Comércio (OMC). Afinal, o crescer da China ia ajudando a conter um Japão que se atrevera a desafiar economicamente os EUA. Além disso, o poder político norte-americano satisfazia, com se aludiu mais atrás, o lobby industrial deslocalizador quer dos EUA, quer do restante Ocidente, em particular do seu sector europeu Ocidental. Os próprios industriais do Japão, que foram os primeiros a «deslocalizar» para a China, ganhavam também com a política dos EUA relativa à integração da China na «globalização». Nesta fase, os EUA terão achado que ficavam sempre a ganhar nos diferentes carrinhos… mas, como habituais aprendizes de feiticeiros, terão achado que os seus objectivos estratégicos iam sendo atingidos e que a China estaria demasiado longe para, num horizonte percepcionável, lhes fazer frente.

Mas o facto é que o feitiço se virou conta o feiticeiro e os EUA, tal como a União Europeia, tiveram que começar a falar contra a «injusta» manipulação das taxas de câmbio por parte da China (não esquecer que ainda hoje o PIB per capita da China é varias vezes menor do que o dos países desenvolvidos ocidentais, mesmo que o PIB per capita de países como a Espanha, a Grécia e Portugal). O facto é que o mercantilismo pregado pela OMC e praticado pela China já não é visto com bons olhos pelo Imperialismo, o mesmo que desencadeou o processo de «globalização»!

Então o que está a acontecer é os EUA – enquanto continuam as suas guerras no Médio Oriente e cuidam do seu quintal da rectaguarda – estarem a desenvolver estratégias de contenção da China, tendo como aliado principal o seu «protectorado» Japão.

Francisco Silva

 

Acerca da renegociação da dívida

 

A renegociação da dívida é, talvez, a mais importante questão central da política nacional. Trata-se de pôr fim e vencer a agressão a que o País está sujeito. O Partido mostra um caminho correto. Haverá sem dúvida formulações aparentemente mais avançadas, mas inconsequentes.

O facto de haver sectores sociais ligados aos partidos da troika que falam agora em renegociar a dívida quando antes, por todos os meios, combatiam esta posição, não tornam as propostas do Partido social-democratas. Pelo contrário, mostra o oportunismo daqueles sectores, pois esta palavra de ordem já se difundiu entre as massas.

Porém a «renegociação» social-democrata pretende apenas conter a manifesta expressão popular e não se confunde com a que o Partido defende. Referem apenas a extensão dos prazos, e nunca ou quase nunca a questão do juros, ou seja, apenas pretendem garantir que a especulação e a agiotagem possam prosseguir com todas as garantias.

O Partido inclui o conceito verdadeiramente revolucionário de dívida ilegítima, pelas suas implicações e consequências para o povo português. Segundo critérios definidos internacionalmente torna-se ilegítima a parte da dívida contraída sem qualquer benefício directo ou indirecto para os povos: será o caso nomeadamente de verbas destinadas a compensar bancos privados pelas suas perdas em resultado de acções especulativas ou mesmo fraudulentas; verbas resultantes de rendas monopolistas (por ex. PPP), da descapitalização do Estado devido à livre transferência de capitais e rendimentos para paraísos fiscais sem pagar impostos ou ainda a resultante do pagamento de juros de usurários sobre a dívida existente. Enfim, a determinação exata destes montantes exige a o apuramento da origem e processo de formação da dívida. Verificar-se-ia então que o seu total seria muito reduzido face à fachada que nos querem impor.

Ora, esta dívida ilegítima torna-se odiosa quando associada a planos de austeridade que recaem sobre trabalhadores, MPME, sobre as camadas mais frágeis da população. Neste sentido, os acordos com a troika estão feridos de nulidade – e são odiosos – pois opõem-se frontalmente a preceitos da Carta das ONU – designadamente os artigos 1.º e 2.º.

Para quem tem dúvidas sobre o conteúdo patriótico e de esquerda, isto é, revolucionário no atual contexto, recordem-se as consignas do Rumo à Vitória para a Revolução Democrática Nacional e comparem-se com a fraseologia aparentemente muito revolucionária, mas oca de conteúdos (mesmo antes do 25 de Abril), dos divisionistas do movimento unitário e dos esquerdistas.

As palavras de ordem verdadeiramente revolucionárias são as que provam ser compreendidas e assumidas como suas pelas mais amplas massas populares, capazes de as unir na luta por uma política patriótica e de esquerda, com tomadas de consciência mais elevadas e para fases de luta mais avançadas. No que se refere à renegociação da dívida e rejeição do pacto de agressão as teses do Partido, penso, correspondem integralmente a este objetivo.

Vaz de Carvalho

 

Os textos enviados para a Tribuna do Congresso devem ter um máximo de 60 linhas dactilografadas a 60 espaços (3600 caracteres, espaços incluídos). A redacção do Avante! reserva-se o direito de reduzir os textos que excedam estas dimensões, bem como de efectuar a selecção que as limitações de espaço venham a impor. Cada texto deverá ser acompanhado do número de militante do seu autor.

Será dada prioridade à publicação do primeiro texto de cada camarada. Eventuais segundos textos do mesmo autor só serão publicados quanto não houver primeiros textos a aguardar publicação.

A redacção poderá responder ou comentar textos publicados.

De toda a correspondência que contenha propostas de emenda ou sugestões sobre os documentos em debate, será enviada cópia para as respectivas comissões de redacção.

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