Abalos mediáticos
O PCP realizou jornadas parlamentares esta semana, em Leiria, com a abertura a realizar-se na segunda-feira, com intervenção do Secretário-Geral. Ao longo de toda a manhã, não houve espaço para qualquer referência, por mais curta que seja, nos canais de televisão informativos, que mantiveram emissões de horas das cerimónias fúnebres do antigo presidente do Futebol Clube do Porto.
Este último foi um acontecimento de inegável impacto e valor noticioso: Pinto da Costa foi presidente de uma das mais relevantes colectividades do País durante mais de quatro décadas, com um impacto no País que ficou expresso na dimensão de massas que essas cerimónias assumiram. Ignorando paixões clubísticas, os muitos milhares de pessoas que ali marcaram presença tornaram o acontecimento, indiscutivelmente, notícia de primeiro plano. Seria bom, no entanto, que fosse garantida maior uniformidade neste critério jornalístico: se assim fosse, teríamos a grande manifestação em defesa da paz, a 18 de Janeiro, a abrir noticiários – coisa que não sucedeu.
Ainda assim, teria sido possível interromper a emissão de qualquer dos canais para ir em directo a Leiria por uns minutos, onde Paulo Raimundo intervinha – a essa hora, todos os canais protagonizavam um daqueles já típicos momentos em que é preciso encher a emissão, seja com o que for. Não aconteceu.
Pouco depois, registou-se um sismo na Área Metropolitana de Lisboa. Esta notícia, sim, foi capaz de interromper as emissões em directo do Porto. Mais uma vez, a relevância noticiosa deste acontecimento é inegável e justifica-se que ganhe preponderância mediática. Tal poderia explicar a ausência das jornadas parlamentares do PCP dos noticiários das 13 horas da SIC e da TVI (estação que manteve o silêncio às 20 horas), mas a hipótese cai por terra quando se constata que houve lugar para longas peças sobre uma onda de calor no Brasil, os preparativos para o carnaval de Sines ou o Festival do Sável e da Lampreia em Vila Nova da Barquinha, na SIC. No caso da TVI, até fomos brindados com uma inusitada opção, mostrando-nos durante um minuto inteiro a cadeira da sala de imprensa do centro de estágio do Benfica a tremer com o abalo sísmico. É, sem dúvida, uma forma criativa de mostrar os impactos de um terramoto, ainda que custe entender a relevância noticiosa deste momento televisivo.
Dir-se-ia que foi um azar do acaso a abertura das jornadas parlamentares do PCP caírem num dia que se revelou um autêntico engarrafamento mediático. Nada, porém, que tenha afectado o líder do ruidoso partido cujo registo criminal dos seus dirigentes envergonharia a própria máfia: marcou uma conferência de imprensa para ameaçar a apresentação de uma moção de censura no dia seguinte, depois de ter feito o mesmo no dia anterior. O ridículo é assinalável e poderia ter levado as estações de televisão a encararem com cautela mais uma diatribe de quem as repete para garantir palco mediático dia após dia. Nada disso, RTP3, SIC Notícias e Now foram a correr em directo para essa declaração. À hora que tal sucedia, ainda nada tinha passado das jornadas parlamentares do PCP...