No desporto, os números dizem muito, mas não dizem tudo
Mais de 73% da população afirma «nunca praticar» desporto
Quando se fala do desporto nacional aparecem muitos números. Normalmente, os sucessivos governos – e este não é excepção – divulgam diversos elementos para procurar criar a ideia de que se dá valor ao desporto e que ele assume uma função de grande importância.
Não faltam dados, como aqueles revelados pelo INE «Desporto em números – 2023», que nos dizem que 45 600 pessoas trabalham no sector, que são já 16 441 empresas e 2,9 milhões de euros em volume de negócios. Revelam também que são 686 mil praticantes inscritos em federações e 11 456 clubes desportivos, ou ainda as referências – sem poupar elogios – às medalhas conquistadas pelos atletas portugueses.
Como em muitas outras áreas da vida nacional, também no sector do desporto a propaganda associada, com tanta divulgação em tom positivo, procura no essencial esconder o problema existente: a ausência real de condições para garantir o direito constitucional do acesso ao desporto. No tratamento do desenvolvimento desportivo nacional está ausente uma visão e estratégia pública que salvaguarde a prática desportiva integrada no desenvolvimento humano e não na busca de atletas, por via da cada vez mais acelerada formação precoce e do afunilamento da participação.
O que não é sublinhado, e entende-se porquê, é que mais de 73% da população afirma «nunca praticar» desporto, que se não tivéssemos um atleta naturalizado (cuja formação não foi feita em Portugal) o País passaria do 55.º para o 75.º lugar nos Jogos Olímpicos de 2021.
O que procuram esconder, mas é cada vez mais notório, é que o financiamento da prática desportiva é assegurado pelas famílias e não por quem possa permitir outras condições ao movimento associativo. O financiamento por parte do Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ) é de apenas 44 milhões, ao mesmo tempo que as autarquias investem 367 milhões de euros em actividades e equipamentos.
Direito universal
O facto é que a proposta de retirar a dependência do sector das receitas dos jogos sociais, como o PCP tem proposto ao longo do tempo, tem sido sempre rejeitada, assim como a concretização do direito das crianças à Educação Física no pré-escolar e no 1.º ciclo. Direito esse negado pela prática existente em muitas escolas do País, juntamente com as dificuldades que enfrenta o desporto escolar: neste caso, teimam em não desenvolver esforços para que existam dados de análise real da sua dimensão, alcance e resultado, sabendo que apenas 20% de crianças e jovens se inscrevem, mas nunca se sabe quantos frequentam efectivamente e as condições em que o fazem.
Sabemos igualmente da falta de condições com que os clubes e associações federados e não federados se confrontam, sendo criadas cada vez mais dificuldades para poderem cumprir o seu papel.
A palavra de ordem «faça você mesmo» é crescentemente proclamada, criando-se assim a ideia de uma responsabilidade individual numa área que constitui um direito universal. A lógica da desresponsabilização do Estado, à semelhança de outras áreas, é reveladora do caminho seguido.
Escondem e mascaram a realidade porque não querem que se torne mais claro e evidente a necessidade de uma política alternativa que coloque o desporto enquanto direito e não como negócio, em que se criem condições para que, nomeadamente, o movimento associativo e a escola pública possam cumprir o seu papel.
O PCP irá prosseguir na exigência dessa política, sendo indispensável para isso que mais vontades, forças e vozes se juntem.