Números da Educação «martelados» para servir interesses privados
A FENPROF contrariou o suposto crescimento do ensino privado e uma alegada fuga de alunos do público, e afirmou que os números da DGEEC foram martelados por quem pretende passar tal mensagem.
Os governos reservaram o Pré-Escolar e os cursos profissionais para o negócio privado
Lusa
Os números em que se basearam as notícias e comentários, em torno da relativa diminuição das escolas públicas, foram divulgados pela Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC).
A FENPROF dedicou a este tema uma extensa e documentada nota de imprensa, no dia 16, indicando «dois dos principais promotores dessa torção».
Rodrigo Queiroz e Melo, o director executivo da confederação patronal de colégios privados (a Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo, AEEP), «aproveitou para fazer propaganda ao seu negócio», enquanto Marques Mendes. no espaço que a SIC lhe dá ao domingo, «não perdeu a oportunidade para, mais uma vez, atacar os sindicatos».
Na realidade, «os números divulgados pela DGEEC foram martelados por quem pretende passar aquela mensagem», ocultando que «o que faz com que a diferença entre público e privado pareça inclinar-se para o lado do privado são os jardins de infância que, como se sabe, têm uma forte componente privada, tanto lucrativa como de natureza dita social (principalmente IPSS e misericórdias) e, também, as escolas profissionais que são, essencialmente, privadas».
Ao analisar os diferentes níveis, a FENPROF admite ser verdade que «entre 2013 e 2023 o número de jardins de infância privados teve um ligeiro decréscimo, passando de 1901 para 1839 (-62), enquanto no sector público foi mais significativo, passando de 1422 para 1019 (-403)», para o que apresenta vários motivos. Houve «encerramento de jardins de infância em pequenas localidades onde já não há crianças em idade pré-escolar», «encerramento de estabelecimentos e concentração em centros educativos, vários designados por EBI, passando a ser contabilizado apenas um», «encerramento de estabelecimentos e concentração das crianças em escolas básicas (EB), deixando de ser contabilizado qualquer um deles».
Só que, olhando para o número de crianças na Educação Pré-Escolar, verifica-se que «no sector público há crescimento e no sector privado até há decréscimo». Em estabelecimentos públicos, a variação foi de 141 999 crianças, em 2013, para 144 363, em 2023 (um crescimento de 1,6%). No sector privado, o número de crianças passou de 123 415, em 2013, para 120 662, em 2023 (um decréscimo de 2,2%).
O número de alunos que frequentam os cursos do ensino profissional diminuiu, tanto no sector público, como no privado. A redução foi maior no público, mas continua a haver muito mais alunos nas escolas públicas (embora estas sejam apenas 12,7% dos estabelecimentos, contra 87,3% de privados). O sector público registou 67 730 alunos, em 2013, e 65 167, em 2023, enquanto o privado contou com 47 969, em 2013, e 46 131, em 2023.
No básico e no secundário, ocorreram «ligeiras oscilações em relação ao número de estabelecimentos».
Quanto ao número de alunos, a FENPROF começa por referir os dados gerais do Ensino Secundário. As escolas públicas tinham 305 613 alunos, em 2013, e 296 371, em 2023 (menos 3,0%), cabendo ao sector privado 79 597 alunos, em 2013, e 98 593, em 2023 (mais 23,8%).
Mas a federação alerta que «este total é enganador». «Mais uma vez, o que provoca estas diferenças são os cursos profissionais e, principalmente, os chamados “cursos de aprendizagem”, em que o sector privado passa de 91 alunos, em 2013, para 9 559, em 2023».
«Falam por si» os números relativos aos cursos científico-humanísticos: o sector público regista 177 419 alunos, em 2013, e 186 543, em 2023 (mais 9 124 alunos, um crescimento de 5,1%), e o sector privado conta 23 441, em 2013, e 23 852, em 2023 (mais 411 alunos, um crescimento de 1,7%).
No Ensino Básico, o decréscimo (10,3% no público, 9,3% no privado) «acompanha a redução global do número de alunos».
«Com a Escola Pública a prevalecer em Portugal, sem oscilações», a FENPROF interroga: «Que respostas poderiam ser dadas, se houvesse um efectivo investimento no sector público? Se o Governo, este como anteriores, apostasse no sector público, ao invés de reservar a Educação Pré-Escolar e os cursos profissionais para as áreas de negócio?»
Ministro com preconceitos
Afinal, o ministro da Educação, «contrariamente ao que afirma, tem mesmo preconceitos ideológicos, pois, ao invés de avançar com o alargamento da rede pública de jardins de infância, preferirá reforçar o financiamento aos privados, alimentando o negócio com dinheiros públicos».
A FENPROF comentou assim recentes declarações do governante, a admitir avançar com a celebração de contratos de associação na Educação Pré-Escolar, o que, «em vez de alargar a rede pública de jardins de infância, indicia uma clara opção pela privatização».