O que se está a passar em Doha?

Ângelo Alves

Ao mo­mento que es­cre­vemos estas li­nhas (do­mingo), as no­tí­cias dão-nos conta de mais uma vi­agem do Se­cre­tário de Es­tado norte-ame­ri­cano, Anthony Blinken, a Is­rael, ale­ga­da­mente para «par­ti­cipar nos es­forços di­plo­má­ticos» com vistas a um acordo de cessar-fogo, acordo esse que o pre­si­dente dos EUA afirmou na se­mana pas­sada «estar mais pró­ximo que nunca».

Avan­çando nas lei­turas, o «op­ti­mismo» norte-ame­ri­cano vai-se es­ba­tendo num «op­ti­mismo cau­te­loso» do go­verno is­ra­e­lita, porque ale­ga­da­mente o lado pa­les­ti­niano – o Hamas – está a «boi­cotar» o tal acordo que es­taria por um fio. É isto que um ci­dadão comum que não queira pes­quisar sobre o tema apre­ende.

Mas o que está a acon­tecer de facto em torno das ne­go­ci­a­ções de Doha no Catar? Desde logo, não se trata de uma ne­go­ci­ação em que todas as partes es­tejam a par­ti­cipar. A re­sis­tência pa­les­ti­niana de Gaza, re­pre­sen­tada pelo Hamas, não está pre­sente nas ne­go­ci­a­ções, mantém apenas con­tactos com al­guns me­di­a­dores, con­tra­ri­a­mente à nar­ra­tiva que os EUA ten­taram criar de que a or­ga­ni­zação pa­les­ti­niana es­taria en­vol­vida nas ne­go­ci­a­ções, e que es­taria a ser ir­re­du­tível em al­guns pontos.

São vá­rias as cor­tinas de fumo com que Is­rael e os EUA tentam ocultar a ver­dade, para em qual­quer ce­nário res­pon­sa­bi­lizar sempre o lado pa­les­ti­niano. A ver­dade é que esta nova ronda de ne­go­ci­a­ções é nada mais nada menos que um re­tro­cesso re­la­ti­va­mente a acordos al­can­çados em 2 de Julho, que o lado pa­les­ti­niano es­taria pre­pa­rado para aceitar. E a ver­dade é que foi exac­ta­mente Is­rael que re­cusou vá­rias pro­postas do Catar e do Egipto e que voltou a co­locar ques­tões ina­cei­tá­veis para o lado pa­les­ti­niano, como por exemplo o di­reito de re­tomar os ata­ques mi­li­tares, não se re­tirar de Gaza e con­trolar vá­rias zonas do ter­ri­tório, in­cluindo a fron­teira da Pa­les­tina com o Egipto e de­cidir sobre mo­vi­men­tação de po­pu­la­ções.

É, por­tanto, Is­rael, com o apoio dos EUA, que está, mais uma vez a im­pedir um cessar-fogo. Aliás, o anúncio pelo Pen­tá­gono, no pas­sado dia 13 de Agosto (vés­peras das ne­go­ci­a­ções), de mais um for­ne­ci­mento de ar­ma­mento a Is­rael no valor de 20 mil mi­lhões de dó­lares, ou os novos ata­ques de Is­rael no Lí­bano e em Gaza du­rante o fim de se­mana, que ma­taram de­zenas de civis, dizem quase tudo sobre a real von­tade de Is­rael e EUA de al­cançar um acordo.





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