- Nº 2647 (2024/08/22)

O que se está a passar em Doha?

Opinião

Ao momento que escrevemos estas linhas (domingo), as notícias dão-nos conta de mais uma viagem do Secretário de Estado norte-americano, Anthony Blinken, a Israel, alegadamente para «participar nos esforços diplomáticos» com vistas a um acordo de cessar-fogo, acordo esse que o presidente dos EUA afirmou na semana passada «estar mais próximo que nunca».

Avançando nas leituras, o «optimismo» norte-americano vai-se esbatendo num «optimismo cauteloso» do governo israelita, porque alegadamente o lado palestiniano – o Hamas – está a «boicotar» o tal acordo que estaria por um fio. É isto que um cidadão comum que não queira pesquisar sobre o tema apreende.

Mas o que está a acontecer de facto em torno das negociações de Doha no Catar? Desde logo, não se trata de uma negociação em que todas as partes estejam a participar. A resistência palestiniana de Gaza, representada pelo Hamas, não está presente nas negociações, mantém apenas contactos com alguns mediadores, contrariamente à narrativa que os EUA tentaram criar de que a organização palestiniana estaria envolvida nas negociações, e que estaria a ser irredutível em alguns pontos.

São várias as cortinas de fumo com que Israel e os EUA tentam ocultar a verdade, para em qualquer cenário responsabilizar sempre o lado palestiniano. A verdade é que esta nova ronda de negociações é nada mais nada menos que um retrocesso relativamente a acordos alcançados em 2 de Julho, que o lado palestiniano estaria preparado para aceitar. E a verdade é que foi exactamente Israel que recusou várias propostas do Catar e do Egipto e que voltou a colocar questões inaceitáveis para o lado palestiniano, como por exemplo o direito de retomar os ataques militares, não se retirar de Gaza e controlar várias zonas do território, incluindo a fronteira da Palestina com o Egipto e decidir sobre movimentação de populações.

É, portanto, Israel, com o apoio dos EUA, que está, mais uma vez a impedir um cessar-fogo. Aliás, o anúncio pelo Pentágono, no passado dia 13 de Agosto (vésperas das negociações), de mais um fornecimento de armamento a Israel no valor de 20 mil milhões de dólares, ou os novos ataques de Israel no Líbano e em Gaza durante o fim de semana, que mataram dezenas de civis, dizem quase tudo sobre a real vontade de Israel e EUA de alcançar um acordo.



Ângelo Alves