«Os povos não podem continuar a ser laboratórios de receitas coloniais»

Na cimeira para um Novo Pacto Financeiro Mundial, que decorreu em Paris, nos dias 22 e 23, o presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel, foi o porta-voz do Sul para denunciar a injusta ordem internacional que impede o desenvolvimento de grande parte do planeta.

Países em desenvolvimento defendem reforma das instituições financeiras mundiais

Na sua condição de presidente do Grupo dos 77+China, que agrupa 134 dos 193 Estados membros da ONU, o presidente de Cuba interveio para abordar o impacto da arquitectura financeira mundial e a urgência em transformá-la. «Não revelo nenhum segredo afirmando que as consequências mais nefastas da actual ordem económica e financeira internacional, profundamente injusta, antidemocrática, especulativa e excludente, recaem com maior força sobre os países em desenvolvimento», afirmou em Paris o dirigente cubano.

Apelou, nesse sentido, a reformular as bases actuais que definem as relações Norte-Sul e a coexistência no planeta e instou os líderes a não passar à história como os que não puderam marcar a diferença no destino comum. Alertou para as graves consequências para o Sul resultantes da ordem imperante, em particular o obstáculo que representa para a materialização dos Objectivos do Desenvolvimento Sustentável.

Nas actuais condições desfavoráveis, o Sul não pode gerar e aceder aos milhões de dólares anuais de que necessita para alcançar os referidos objectivos, estabelecidos no âmbito das Nações Unidas para serem concretizados até 2030.

Consciente da responsabilidade de ser o porta-voz do Grupo dos 77+China na cimeira que reuniu em Paris dezenas de chefes de Estado e de governo, o presidente cubano insistiu na necessidade de mudar a situação prevalecente. «Os nossos povos não podem nem devem continuar a ser laboratórios de receitas coloniais e de renovadas formas de dominação que incluem a dívida, a arquitectura financeira internacional e as medidas coercivas unilaterais para perpetuar o subdesenvolvimento e encher os cofres de uns poucos à custa do Sul», insistiu.

Quanto a propostas concretas, Díaz-Canel referiu a reforma das instituições financeiras internacionais – como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial –, tanto em questões de governança e representação como de acesso a financiamento que tenham em conta os legítimos interesses dos países em desenvolvimento. Defendeu também uma urgente e considerável recapitalização dos bancos multilaterais de desenvolvimento e acções em matéria de acesso a mercados, criação de capacidades e transferência de tecnologias.

No seu périplo pela Europa, o presidente de Cuba, antes de se deslocar a França, visitou o Vaticano, a Itália e a Sérvia, onde manteve encontros cordiais com os seus homólogos e outras autoridades, responsáveis de diferentes organizações multilaterais, empresários e representantes de grupos de solidariedade com Cuba.

 

Cimeira dos 77+China em Havana, em Setembro

O presidente de Cuba convocou a Cimeira de Chefes de Estado e de Governo do Grupo dos 77 mais China para os próximos dias 15 e 16 de Setembro, em Havana.

Na sua qualidade de presidente temporário do grupo de países em desenvolvimento, o dirigente cubano propôs para a reunião o tema «Desafios actuais do desenvolvimento: papel da ciência, da tecnologia e da inovação».

O Grupo dos 77 mais China – que no conjunto representa 80 por cento da população mundial e mais de dois terços dos membros das Nações Unidas – pugna pela construção de relações internacionais mais justas e por uma ordem verdadeiramente democrática e inclusiva, que privilegie a solidariedade e a cooperação.

 

Prioritário é reduzir as desigualdades sociais, afirma Lula da Silva em Paris

No discurso que proferiu durante a abertura do fórum Novo Pacto de Financiamento Global, o Presidente do Brasil, Lula da Silva, sublinhou que «se nós não discutirmos a questão da desigualdade e se a gente não colocar isso com tanta prioridade quanto a questão climática, a gente pode ter um clima muito bom e o povo continuar morrendo de fome em vários países do mundo».

Convidado a discursar sobre preservação do meio ambiente e combate às mudanças climáticas, o presidente lembrou que o Brasil irá sediar a COP-30, em 2025, pela primeira vez num estado amazónico (Pará), mas alertou que as discussões entre os países também devem abordar como combater as várias formas da desigualdade.

«Eu não vim aqui para falar somente da Amazónia. Vim aqui para falar que, junto com a questão climática, nós temos que colocar a questão da desigualdade mundial. Não é possível que, em uma reunião entre presidentes de países importantes, a desigualdade não apareça. A desigualdade salarial, a desigualdade de raça, a desigualdade de género, a desigualdade na educação, a desigualdade na saúde», disse Lula da Silva.

Para o Presidente do Brasil, a discussão sobre medidas para ajudar a garantir um futuro mais próspero para a humanidade deve, obrigatoriamente, incluir os mais pobres. «Somos um mundo cada vez mais desigual e cada vez mais a riqueza está concentrada na mão de menos gente e a pobreza na mão de mais gente. Salientou, ainda, que instituições como o Banco Mundial ou o FMI «não atendem às aspirações nem aos interesses da sociedade».

O governo brasileiro, garantiu Lula da Silva, honrará os compromissos assumidos relativamente à questão do clima, desde logo acabar com o desmatamento na Amazónia até 2030 e cuidar dos outros biomas nacionais: «Vamos colocar isso como questão de honra, de até 2030 acabar com o desmatamento na Amazónia. O Brasil tem 30 milhões de hectares de terras degradadas, não precisa cortar uma árvore para plantar um pé de soja, um pé de milho ou criar gado. É só recuperar as terras degradadas», afirmou.

Outro compromisso expresso pelo presidente do Brasil é com os mais pobres. Depois de ver o país sair do Mapa da Fome em 2012, como resultado de políticas sociais aplicadas durante o período de gestão do seu governo e no da presidente Dilma Rousseff, o Brasil voltou a apresentar, no fim de 2022, um quadro com 33 milhões de pessoas em situação de escassez alimentar.

«Treze anos depois eu volto à Presidência e 33 milhões de pessoas estão passando fome. E agora temos que fazer tudo o que já tínhamos feito. Tudo. Vamos refazer tudo para o país voltar a crescer», concluiu o presidente.



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