Valorizar o trabalho e os trabalhadores

O que se propõe o Governo fazer com as alterações à legislação laboral?

A proposta do Governo de alteração à legislação laboral, na base da chamada Agenda para o trabalho digno e a valorização dos jovens no mercado de trabalho, não responde a nenhum dos bloqueios há muito identificados.

1. Não revoga o regime que é usado como arma de chantagem contra os trabalhadores: o regime da sobrevigência e caducidade das convenções colectivas.
Mantém assim em vigor todas as normas que subvertem o direito constitucional de contratação colectiva e que desequilibram as relações laborais em favor dos do costume – ou seja, dá ao patronato a possibilidade de fazer caducar os contratos colectivos de trabalho para eliminar os direitos dos trabalhadores que aí estão consagrados.
Nesta matéria, introduz um novo mecanismo da arbitragem necessária, que nada mais é que um embuste. Na prática, o que se propõe é mais uma etapa, a acontecer antes da caducidade, passando para a mão de um tribunal arbitral a decisão dos conteúdos a aplicar, não se sabendo o que daí poderia resultar da eliminação de direitos. Não serve afirmar apenas que a contratação colectiva existe, importa também saber qual é o seu conteúdo.

2. Não repõe o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador, mantendo a porta aberta para que possam ser negociadas normas e obrigações, para os trabalhadores, inferiores aos mínimos da lei.

3. Não clarifica o acesso dos sindicatos aos locais de trabalho, independentemente de terem ou não organização. Ao contrário, introduz elementos que facilitam a acção patronal para limitar o exercício da liberdade sindical. Esta concepção de limitação do acesso dos sindicatos a todos os locais de trabalho é, também, uma inaceitável limitação do direito dos trabalhadores ao contacto com as suas organizações representativas.

4. Não introduz o princípio de que a um posto de trabalho permanente deve corresponder um contrato de trabalho efectivo, perpetuando deste modo a precariedade. Continua a permitir o recurso ao trabalho temporário e ao outsourcing para ocupação de postos de trabalho permanentes, legitimando a utilização destas formas de precariedade laboral, e mantém ainda o período experimental de 180 dias para os trabalhadores à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração, permitindo que este seja abusivamente utilizado como instrumento de precarização laboral.

5. Não reduz para as 35 horas o tempo de trabalho para todos os trabalhadores, sem perda de retribuição, e não revoga os mecanismos de desregulação do tempo de trabalho, como a adaptabilidade e o banco de horas grupal, pondo em causa a conciliação entre vida profissional e pessoal.

6. Não limita os fundamentos que permitem o crescente recurso à laboração contínua, obrigando os trabalhadores, nos mais diversos sectores de actividade, a trabalharem à volta do relógio nos sete dias da semana, sem qualquer justificação para tal, a não ser a busca do lucro e o agravamento da exploração.

7. Não repõe os regimes de compensação e indemnização por despedimento, mantendo a mesma lógica de facilitação e embaratecimento dos despedimentos.

8. Não repõe os acréscimos remuneratórios pela prestação de trabalho suplementar e os respectivos descansos compensatórios, que foram cortados.

9. Mantém a Autoridade para as Condições de Trabalho sem o efectivo reforço dos meios materiais e humanos e dos seus poderes executivos, que permitam uma fiscalização e acção eficazes no cumprimento da lei e respeito pelos direitos dos trabalhadores.

 



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