Que peso terá o salário?
O Instituto Nacional de Estatística (INE) publicou (22 de Fevereiro de 2022) os resultados do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento - 2021 divulgando dados sobre as condições de vida das crianças em Portugal, no ano de 2021.
Ora, que conclui o INE sobre a matéria investigada?
Que em 2021, dos 1,5 milhões de crianças com menos de 16 anos em Portugal quase 11% (cerca de 165 mil) pertenciam a agregados familiares em privação material e social.
E em que se traduziram estas privações segundo o estudo do INE? No facto de 15,5% das crianças não terem conseguido passar férias fora de casa pelo menos uma semana por ano; 9,7% das crianças não terem conseguido participar regularmente numa actividade extracurricular ou de lazer; 6,6% não terem podido participar em viagens e actividades escolares não-gratuitas; 4,3% não poderem comprar roupa nova; 1,6% não terem conseguido celebrar ocasiões especiais e 1,5% não ter podido convidar amigos de vez em quando, para brincarem e comerem juntos.
O estudo fica-se por estes traços do retrato material e social. E, convenhamos, não é pouco. Mas é legítimo questionar porque foi deixada de fora uma consequência óbvia desta privação: as (muitas) situações de subnutrição e fome.
Por outro lado, aponta este estudo como factores que influenciam este estado de privação o número de pessoas do agregado familiar e e a escolaridade dos pais. Mas, e factores como os baixos salários dos pais, a precariedade nas relações laborais, a desregulação dos horários de trabalho não pesaram nada neste quadro?
Dir-se-á que o estudo não aspirava a tanto. Que o INE tinha que seleccionar variáveis. Mas, convenhamos, o salário não é um mero elemento acessório. É questão essencial. Pesa muito na vida das crianças e dos pais.
É certo que o INE não estava obrigado a abranger no seu inquérito todos os factores. Mas há silêncios ensurdecedores pelo ruído que provocam.
É que para transformar a realidade, é preciso interpretá-la com a objectividade necessária. Ou será por isso mesmo que acontecem tão flagrantes omissões?…