Comentadeiros
Os últimos dias fizeram prova de que os espaços de comentário político nas televisões portuguesas não passam de espaços de propaganda, autênticos tempos de antena para a promoção própria de quem os ocupa, dos seus partidos ou de interesses que representam.
Na mesma estação – a SIC – dois distintos ex-líderes partidários, sempre à procura de garantir o espaço para a promoção de eventuais ambições presentes e futuras, a partir do seu lugar cativo falaram sobre a posição do PCP face ao Orçamento do Estado. Nisto, há um pormenor: quando qualquer dos dois falou essa posição ainda não existia pelo simples facto de que o Orçamento ainda não existia.
Na sexta-feira à noite, Francisco Louçã, com o habitual ar professoral, não se coibiu de usar o seu espaço habitual para, do início ao fim, atacar o PCP. Começou por fazê-lo com a tese de que foi o PCP que empurrou o Governo a atrasar a discussão em torno do Orçamento, quando a verdade é que foi precisamente o PCP quem criticou o Governo por antecipar a data das eleições autárquicas. Depois, continuou, mentindo: que haveria um acordo para que fosse o PCP e não o Governo a propor o aumento de 10 euros para as pensões mais baixas. E por fim coroou o seu espaço de propaganda política com uma nova mentira: que, ao contrário do seu partido, o PCP separou as questões laborais da discussão do OE – quando em todas as intervenções públicas do PCP essas questões têm estado expressamente presentes.
Dias depois foi a vez de Marques Mendes dizer o contrário no seu espaço de comentário na SIC: o PCP está mais exigente, incluindo em matérias como a legislação laboral. Como já lhe é habitual, prosseguiu o seu monólogo contrariando mesmo tudo o que vinha dizendo há meses: depois de, desde o início do Verão, andar a dizer que a viabilização do PCP estava garantida, agora explica que, mesmo que o PCP vote contra, o OE deve ser viabilizado com uma mudança de posição do BE.
Qual é a relevância de tudo isto? É a prova da inutilidade informativa destes espaços de opinião. Nestes, dizem-se mentiras, fantasias, expressam-se desejos, faz-se combate político e ideológico, procura-se formatar o pensamento à doutrina única do anticomunismo, ainda que com cambiantes diversos. Isto pode interessar, e muito, a quem detém os órgãos de comunicação social (no caso da SIC, nunca é demais relembrar, que se trata do militante número 1 do PSD, ex-representante do grupo de Bilderberg em Portugal) e de quem determina a forma e o conteúdo que estes espaços assumem.
Também assim se explica como é fácil construir uma narrativa única que, por mais que não adira à realidade, de tão esmagadora penetra de forma subtil ao nível de massas. O leitor do Avante! que olhe para os comentários que se seguiram ao anúncio da posição do PCP após a entrega do OE na Assembleia da República: quase sem excepção, todos os comentadores alinharam na ideia de que tudo não passa de teatro. Depois de 100 anos de história, ainda não perceberam nada sobre a identidade do PCP?