Um incómodo chamado filhos

Margarida Botelho

A Confederação Empresarial de Portugal (CIP) diz-se, segundo o Observador, «muito sensível» às dificuldades sentidas pelos pais que têm de acumular trabalho com o acompanhamento às crianças, desde que as escolas e creches encerraram. Tão sensível, tão sensível, que não está de acordo que em certas circunstâncias o apoio aos pais para acompanharem os filhos seja pago a 100%.

Relembre-se que até à semana passada accionar o mecanismo de apoio à família implicava sempre um corte de um terço do salário, e que os trabalhadores em teletrabalho não lhe podiam aceder. O Governo decidiu entretanto que o salário poderia ser pago a 100% no caso das famílias monoparentais, e no caso de os pais conseguirem alternar semanalmente o cuidado com as crianças, mantendo-se o corte em todos os outros casos.

Apesar da limitação da medida, a CIP receia que a possibilidade do salário poder ser recebido a 100% gere «um incentivo perverso», que as empresas fiquem «sem trabalhadores essenciais" e possam sofrer «efeitos fortemente condicionadores». Omite que os trabalhadores essenciais são definidos em portaria pelo Governo, e que esses não podem em caso algum accionar o apoio a filhos - para as crianças filhas destes trabalhadores estão inclusivamente abertas escolas de acolhimento em todo o país.

A verdade verdadinha é que a CIP não quer pagar parte nenhuma dos salários destes trabalhadores, dizendo mesmo que «estamos perante uma situação de preservação de saúde pública, pelo que o apoio, nestes casos, deve ser integralmente suportado pela Segurança Social.»

Qual responsabilidade social, qual função social da maternidade, qual estamos todos no mesmo barco. Para a CIP, o melhor é não ter filhos, nem doenças, nem vida.




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