A vergonha
A Assembleia-Geral das Nações Unidas aprovou uma resolução, apresentada por mais de 20 países, que visa combatera glorificação do nazismo, do neonazismo e de outras práticas que contribuam para estimular formas contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerâncias relacionadas.
Na sua origem estão preocupações quanto ao branqueamento, promoção e glorificação do nazi-fascismo, à criminalização da resistência e dos seus símbolos, ao aumento da actividade, dos crimes e da expressão política de forças de extrema-direita, racistas e xenófobas e à proliferação de discursos de ódio nas redes sociais, dirigidos sobretudo às novas gerações.
Como resposta, recomenda a adopção de medidas legislativas, educativas e criminais que permitam um efectivo combate ao fascismo, ao racismo, à xenofobia e à discriminação, a justa integração de refugiados e de minorias étnicas e nacionais, a difusão de valores democráticos e humanistas e, por dever de memória, a salvaguarda e valorização de locais e monumentos ligados à barbárie nazi-fascista (desde logo as prisões políticas e os campos de concentração e extermínio) e aos que se lhe opuseram.
É difícil não reconhecer a actualidade deste documento, tanto no que a motiva como no que sugere. Passados 75 anos sobre o fim da Segunda Guerra Mundial, os discursos e as práticas fascizantes aí estão, arrogantes, ameaçadores, crescentemente normalizados. Vemos cruzes suásticas a desfilar nas ruas de várias cidades (de Varsóvia a Washington), criminosos de guerra nazis condecorados como heróis nacionais, partidos comunistas ilegalizados e acampamentos de refugiados incendiados. Auschwitz, remetido a mero cenário literário para aventuras e namoricos, é hoje um tão rentável quanto oco produto comercial. Os estados de excepção são já a norma em muitos países e abjectas propostas (do confinamento especial para ciganos à remoção de ovários a mulheres que abortem) são assumidas sem pudor.
Tal como na primeira metade do século XX, o fascismo medra por entre os efeitos dramáticos da crise do capitalismo e os favores financeiros e mediáticos. Não é e nunca foi anti-sistema, mas um instrumento de choque desse mesmo sistema – ou , pelo menos, dos seus «elementos mais reaccionários, chauvinistas e imperialistas». O seu caminho para o poder fez-se (faz-se?) nas passadeiras vermelhas estendidas por banqueiros, industriais e a direita dita democrática.
Resta dizer que a resolução foi aprovada por uma ampla maioria de 130 países, que os EUA e Ucrânia votaram contra e que 51 se abstiveram, na sua maioria os membros da NATO e da UE. Portugal estava entre eles. Para nossa vergonha. E alerta!