«America first»
A natureza de classe do poder nos EUA é a questão determinante
As insolentes e ameaçadoras declarações da administração norte-americana pondo em causa as perspectivas de desanuviamento na Península da Coreia confirmam que o insólito e errático comportamento de Trump e do seu governo não é mais do que uma original (e para muitos incómoda) expressão da perigosíssima deriva reaccionária e belicista dos EUA. Na política dos diferentes governos da superpotência sempre houve nuances relacionadas com a personalidade do presidente e pela cor da maioria do Congresso, embora «Republicanos» e «Democratas» sejam duas faces do mesmo partido único. E claro que pesa o facto de a «Casa Branca» estar enxameada de notórios falcões do Pentagono e do Tea Party. O que é determinante porém é a natureza de classe e a lógica de um poder que pretende dominar o mundo, objectivo que os EUA prosseguem com particular arrogância desde a II Guerra Mundial, mesmo quando tiveram que encolher as garras perante a conquista da paridade militar estratégica pelo campo socialista e a força da luta dos povos e do movimento da paz. A criminosa utilização da arma nuclear em Hiroshima e Nagasáqui ou a proclamação da «nova ordem mundial» por Bush após o desaparecimento da URSS, são expressões marcantes desse objectivo. É neste pano de fundo que devem ser consideradas as provocações de Trump e o seu «America first».
Se fosse Hilary Clinton, a «rainha da guerra», a ocupar a presidência, a política dos EUA seria outra? Seria diferente a resposta ao agravamento da crise estrutural do capitalismo, ao declínio da hegemonia dos EUA, à ascenção internacional da China ou ao descontentamento e à luta (que não se deve subestimar) do povo norte-americano? Quanto ao essencial certamente que não. Trump é um personagem execrável e um perigoso aventureiro. Não é porém nos seus dislates e provocações que deve concentrar-se a atenção, mas no real significado e consequências da política interna e externa dos EUA, sabendo que – num quadro de clivagens na classe dominante norte-americana e de contradições no campo imperialista – quem a comanda é o grande capital financeiro, Wall Street, o Pentágono, o poderoso complexo militar industrial. O comportamento burlesco de Trump serve às mil maravilhas para facilitar e banalizar o avanço da extrema-direita, do racismo, do obscurantismo e do militarismo.
É significativo que as decisões mais reaccionárias e agressivas da administração Trump não levantem assim tanta polémica na pútrida elite dirigente norte-americana ou que na UE não suscitem (pelo menos por enquanto) mais do que preocupação e desconfiança. Isto quando a desenfreada corrida aos armamentos desencadeada pelos EUA, as suas colossais despesas militares, a revisão belicista da sua doutrina militar apontando explicitamente a China e a Rússia como inimigos, o aperfeiçoamento das armas nucleares e a ameaça do seu uso em primeiro lugar, constituem um terrível perigo para a Humanidade. E é assim porque tal política é expressão de um sistema que pretende dominar o mundo apesar de enfraquecido e históricamente condenado.