Uma morte anunciada

Margarida Botelho

Uma se­nhora morreu na se­mana pas­sada na fre­guesia de Tro­viscal, con­celho da Sertã.

A morte foi no­tícia porque o ma­rido da ví­tima teve de ca­mi­nhar cerca de dois qui­ló­me­tros para pedir au­xílio, pelo facto de não es­tarem res­ta­be­le­cidas as co­mu­ni­ca­ções na zona de­pois dos in­cên­dios do ano pas­sado e de não existir rede de te­le­móvel.

No final do ano pas­sado, tinha acon­te­cido o mesmo à se­nhora que viria agora a morrer, quando o ma­rido se sentiu mal.

A Al­tice Por­tugal – como se chama a PT de­pois de pri­va­ti­zada – ar­gu­menta que já refez 99,5% das li­ga­ções des­truídas pelos in­cên­dios e que teve di­fi­cul­dades em con­tactar certos cli­entes (o que não deixa de ser um ar­gu­mento tris­te­mente iró­nico, vindo de uma em­presa de te­le­co­mu­ni­ca­ções).

Diz a em­presa, em jeito de des­culpa, que até mandou cartas (da ma­neira que andam os CTT, outra em­presa pri­va­ti­zada, talvez ti­vesse sido mais efi­ci­ente ex­pe­ri­mentar pombos-cor­reio).

Não sa­bemos, se ca­lhar nunca sa­be­remos, se esta morte podia ter sido evi­tada se o so­corro es­ti­vesse à dis­tância de um te­le­fo­nema em tempo útil. Mas no Por­tugal 4.0 do sé­culo XXI, nin­guém devia estar su­jeito a que a vida ou a morte se de­cidam pela exis­tência de um sim­ples te­le­fone. Nin­guém devia estar su­jeito a ca­mi­nhar dois qui­ló­me­tros noite dentro à pro­cura de ajuda para uma pessoa que se sentiu mal.

Fa­larmos de um casal de idosos só torna tudo mais triste, dra­má­tico, in­justo e ina­cei­tável.

Para a Al­tice só faltam 0,5% dos cli­entes, uma ir­re­le­vância, está bom de ver.

Para quem ha­bita nestas re­giões, é o pro­lon­ga­mento da tra­gédia, do aban­dono, da in­se­gu­rança.

Para o País, é um crime, um li­belo acu­sa­tório contra a pri­va­ti­zação de um sector tão es­tra­té­gico como o das te­le­co­mu­ni­ca­ções.




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