Corroído e inconformado

Jorge Cordeiro

Há ten­ta­ções ir­re­pri­mí­veis. Mesmo quando se pre­tende cul­tivar um certo ar de ur­ba­ni­dade de opi­nião e manter por des­vendar aquilo que se é. Será o caso de um co­nhe­cido co­men­tador que, sal­ti­tando entre o que diz em rádio e o que es­creve em papel de jornal, to­mando para si as dores de quem bem se cal­cula e não que­rendo deixar por mãos alheias o que tem a seu cré­dito de an­ti­co­mu­nismo, es­par­ramou o in­con­for­mismo que lhe vai na alma. À per­ti­nência da questão co­lo­cada pelo Se­cre­tário-geral do PCP no de­bate par­la­mentar com o pri­meiro-mi­nistro, se es­taria o Go­verno dis­posto a atri­buir à flo­resta e às con­sequên­cias dos in­cên­dios a verba des­pen­dida com o BANIF, Raul Vaz, a su­pra­ci­tada per­so­nagem, de­sem­bai­nhou em termos de in­qui­rição a per­gunta se es­taria Je­ró­nimo de Sousa dis­posto a «ab­dicar das be­nesses ao elei­to­rado do PCP». Per­cebe-se que a per­gunta o tenha in­co­mo­dado. Lem­brar os des­mandos da banca, pôr em causa essa gesta de hon­rados ban­queiros que do BPN ao BES pro­varam essa su­pre­macia da gestão pri­vada, tocar nos in­te­resses desse saco sem fundo por onde, tal su­mi­douro, se es­vaem de­zenas de mi­lhões de euros é afronta que não deixa sem res­posta. Talvez menos bem se per­ceba o de­safio que ir­ri­ta­da­mente es­grimiu. Se Raul Vaz, quando fala de be­nesses, alude ao au­mento extra de pen­sões de re­forma para mais de mi­lhão e meio de re­for­mados, o des­con­ge­la­mento na pro­gressão de car­reiras de 400 mil tra­ba­lha­dores, ao de­sa­gra­va­mento fiscal de quase três mi­lhões de pes­soas, à me­lhoria do abono de fa­mília para de­zenas de mi­lhares de fa­mí­lias ou à gra­tui­ti­dade de ma­nuais es­co­lares para mi­lhares de cri­anças, e as iden­ti­fica com o elei­to­rado do PCP, sau­damos a ge­ne­ro­si­dade do co­men­tário. Não era pre­ciso tanto. Bas­tava que dis­sesse que aquilo que sin­ce­ra­mente o in­co­moda é o papel e a ini­ci­a­tiva do PCP na vida po­lí­tica na­ci­onal e so­bre­tudo aquela sau­dade que o corrói de nunca mais ver re­gres­sado o tempo dos roubos de sa­lá­rios, re­formas e di­reitos.




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