Sem faz de conta

Anabela Fino

O circo mediático montado em torno do ministro da Finanças e dos seus hipotéticos projectos de futuro num organismo europeu que é por excelência um veículo de pressão e ingerência no que deviam ser as opções soberanas do País, atingiu nos últimos dias um nível tal que até parece nada haver de mais importante para debater na cena política nacional.

De um lado temos plumitivos e comentadores com lugar cativo na comunicação social dominante que no passado recentíssimo não perderam uma oportunidade para desancar nas opções de Centeno, para não dizer mesmo nas suas capacidades, chegando mesmo a dá-lo como politicamente morto, que falam hoje dele como se fora a nova estrela que estava a faltar no céu da União Europeia. Do outro lado, os apoiantes de sempre embandeiram em arco nos mesmíssimos órgãos de comunicação, arvorando embora aqui e ali falsas modéstias, como se estivessem na iminência de levar a taça, sabe-se lá de quê, para casa. Pelo meio, os mais verrinosos destilam venenos vários antevendo clivagens e farejando confrangedoras vaidades de fazer estalar o ego, esquecidos já dos tempos e das prosas em que incensaram a presença de nacionais num qualquer areópago internacional. Todos, ou quase todos, ignorando olimpicamente que não há muito tempo escreviam e diziam que a «hipótese» agora quase (?) arvorada em desígnio nacional era uma invenção para consumo interno.

Os rios de tinta que o «caso» fabricado a partir de uma boutade do ministro das Finanças alemão tem feito correr são paradigmáticos da imagem do país de faz de conta que a opinião publicada nos meios dominantes pretende impor aos portugueses. A mesma «opinião» dos que todos os dias clamam do alto dos seus púlpitos mediáticos que os sindicatos estão «domesticados», que as lutas nos locais de trabalho – que não noticiam – não existem. E se acaso não conseguem esconder a contestação, por demasiado estridente, não hesitam sequer em afirmar, como fez recentemente um conselheiro de Estado e ex-dirigente do PSD no seu comentário semanal num canal televisivo, que tudo não passa de um «arranjinho» entre Governo, comunistas e sindicatos para que todos fiquem bem na fotografia.

Na mesma linha dos que há mais de três séculos nos impingem a fábula da cigarra e da formiga recontada por La Fontaine para exaltar os valores da burguesia exploradora e dos alegados méritos da acumulação de bens, não hesitando para isso em deseducar gerações sucessivas quanto às reais características de cada um daqueles insectos, estas formigarras dos nossos dias cacarejam de manhã à noite entoando a cantiga do capitalismo. Presumir que nada disto tem a ver com a jornada nacional da CGTP-IN que no próximo sábado vai estar na rua é como crescer e continuar a acreditar em gambozinos. Quem trabalha e reivindica os seus direitos há muito que percebeu que não há nada de lúdico nos jogos do capitalismo e que isto só lá vai pela luta. É por isso mesmo que depois de amanhã o país real vai estar na rua a afirmar que a cantiga do trabalho é outra.




Mais artigos de: Opinião

Vale a pena lutar!

Num período em que os desenvolvimentos da situação internacional apontam para enormes perigos, demonstram hipocrisias sem fim, e levantam medos que o imperialismo alimenta e tenta utilizar em proveito próprio – tentando conter ou fazer regredir a luta dos povos –, é...

Vamos à luta!

Os recentes dados e evoluções da situação nacional devem ser olhados com confiança naquilo que significam de esperança num futuro melhor para os trabalhadores, o povo e o País. As conquistas e resultados alcançados são indissociáveis da intervenção do PCP e da luta dos trabalhadores e do povo, que é cada vez mais importante.

Os amigos não se esquecem

Javier Solana está de regresso. Fazendo prova de vida. Mais do que isso, fazendo jus ao papel que lhe atribuíram de feitor das ambições e estratégia de dominação imperialista. E sobretudo, revelando que no antro em que se move não há ingratidão. Se...

Igualdade de género, esse bom negócio

«Porque é que a igualdade de género é um bom negócio?» é o título do relatório do Forum de Empresas para a Igualdade de Género (IGEN). É um daqueles títulos absolutamente assertivos, que são clarificadores do objectivo a que os...

390 mil

O número – 390 mil – , em euros, é público mas chegou-me pelo boletim de Maio da célula do Partido no grupo Navigator, a antiga Portucel, e refere-se aos seus lucros diários, no primeiro trimestre de 2017, que seguem em linha com os lucros de 2016. Confesso que, ao ler o...