Aumentar a produção nacional para garantir a soberania e o desenvolvimento
Só a defesa dos sectores produtivos e da produção nacional, vencendo para isso os actuais constrangimentos, garante o desenvolvimento sustentado do País.
Portugal precisa de criar mais riqueza e de a distribuir melhor
Esta ideia central voltou a ser chamada para primeiro plano do debate parlamentar pela mão do PCP, convicto que está de que se trata de uma questão de «relevância estratégica para o futuro do País».
O tema ocupou por sua iniciativa a totalidade da agenda plenária do dia 24, em interpelação do Governo, onde ficou demonstrada a necessidade absoluta de aproveitar todos os nossos recursos e potencialidades, defendendo e promovendo a produção nacional e os sectores produtivos, na certeza de que essa é condição para superar muitos dos nossos bloqueios ao desenvolvimento.
«É aí que devemos procurar a chave de uma política económica que assegure o desenvolvimento nacional e rompa com a dependência externa, de uma política capaz de assegurar a criação de riqueza e de emprego de forma sustentada e de distribuir de forma mais justa a riqueza criada», sublinhou o líder parlamentar do PCP, João Oliveira, apurando as conclusões do debate.
O mote fora lançado cerca de duas horas antes pelo deputado Francisco Lopes quando, logo a abrir a sua intervenção, afirmou que um «país que não produza está sujeito à dependência, à desvalorização e ao definhamento». Daí considerar que a «resposta às necessidades nacionais tem que ser assegurada pelo próprio País, não se isolando, relacionando-se com os outros, mas tendo uma sólida capacidade de produção e sustentação».
A circunstância de tudo isto ter sido profundamente fragilizado por décadas de política de direita leva a que o tema da produção nacional ganhe uma acuidade crescente, não como um assunto passageiro ou de mera conjuntura mas como uma questão estrutural para o nosso devir colectivo.
E foi isso que não passou à margem da interpelação. Nela, como salientou João Oliveira, o que esteve verdadeiramente em foco foi o «futuro do País, a resolução dos problemas estruturais da economia, o desenvolvimento nacional, a distribuição da riqueza e da justiça social».
O verdadeiro défice
Reafirmada logo no início dos trabalhos por Francisco Lopes, e comprovada pelos deputados comunistas que neles intervieram, foi essa ideia nuclear de que o «principal défice do País é o défice produtivo».
«Foi a destruição da nossa produção nacional, dos nossos sectores produtivos, que conduziu o País aos défices que são conhecidos, à dependência externa, ao endividamento, que trouxe os níveis de desemprego, pobreza e emigração que tão dramaticamente têm marcado a vida nacional», recordou João Oliveira.
Esta realidade não é todavia uma fatalidade, pode e deve ser invertida, como tratou igualmente de demonstrar a bancada comunista. «Portugal pode libertar-se, pode resolver estes problemas, se enfrentar os constrangimentos que impedem o desenvolvimento do País, se der resposta à necessidade de uma política económica de apoio à produção nacional, à criação de riqueza e à criação de emprego», sublinhou convictamente o líder parlamentar comunista, ciente porém de que isso não chega. «Portugal precisa simultaneamente de produzir mais para criar mais riqueza e de distribuir de forma mais justa a riqueza criada», acrescentou. O que explica, aliás, por que razão a bancada comunista insistiu tanto na necessidade de «valorizar o trabalho e os trabalhadores, valorizar os seus salários, valorizar as funções sociais do Estado, de valorizar uma resposta mais adequada aos problemas sociais que o País enfrenta». É que, também por essa via, como foi realçado, pode alcançar-se «níveis mais justos de distribuição da riqueza criada».
Política alternativa
Ficou entretanto claro do decurso do debate, sem surpresa, que esta perspectiva está longe de ser acompanhada pelas bancadas que levaram até onde puderam a política de empobrecimento e exploração. O que se ouviu das intervenções do PSD e CDS-PP foi a repetição de «velhas teses» e do apego a soluções – imposição de cortes nos direitos e rendimentos – que a própria realidade já se encarregou de desmentir. «Não é com o corte nos direitos, corte nos salários, corte nas condições de vida e trabalho dos portugueses que algum dos problemas económicos e sociais do País se pode resolver», reagiu João Oliveira, insistindo que é exactamente ao contrário: «é por via da valorização do trabalho e dos trabalhadores, por via da valorização da produção nacional que podemos dar resposta aos problemas económicos e sociais».
Foi essa proposta de política alternativa, nas suas múltiplas vertentes, que a bancada comunista levou a debate. Uma proposta, como foi dito, com os olhos postos no futuro do País, orientada para uma política de defesa da produção, do pleno emprego, dos direitos, do desenvolvimento, da soberania, de uma democracia entendida em toda a sua extensão, política, económica, social e cultural.
Valorizar o trabalho
Componente absolutamente central na política patriótica e de esquerda defendida pelo PCP é a que se refere à valorização do trabalho e dos trabalhadores. Francisco Lopes considerou mesmo que este elemento é «objecto e condição do desenvolvimento», pormenorizando alguns dos planos em que ele se desdobra e assenta. Trata-se do pleno emprego, do aumento dos salários (a começar pela fixação do salário mínimo nacional em 600 euros), do respeito pelos horários de trabalho e sua redução para as 35 horas, do combate à precariedade, do respeito pelos direitos laborais (incluindo de contratação colectiva), da valorização das pensões de reforma e dos apoios sociais, de «diversificar as fontes de financiamento da Segurança Social, designadamente acrescentando a contribuição das empresas na base do valor acrescentado líquido».
Frases
«Pode, como no passado já se verificou, haver períodos de crescimento económico, mas só com a libertação do País dos constrangimentos existentes é possível assegurar o desenvolvimento e a melhoria das condições de vida a que o povo português tem direito. É esse o sentido da política patriótica e de esquerda que o PCP defende e sublinha.»
Francisco Lopes
«Na indústria, na agricultura ou nas pescas temos inúmeros exemplos da destruição a que a política de direita sujeitou o nosso país nos últimos quarenta anos.
Mas temos também exemplos da produção nacional que resiste e que é necessário apoiar, não só porque dela depende a sobrevivência de milhares de portugueses, muitas vezes de comunidades inteiras, mas também porque dela depende o desenvolvimento soberano do país, assente no aproveitamento dos nossos próprios recursos e potencialidades.»
João Oliveira
«A política energética em Portugal está hoje completamente subordinada aos interesses dos grupos monopolistas. E isso é o resultado de erradas opções, no passado, de privatização das grandes empresas energéticas, como a EDP, a REN, a Galp ou a Transgás, da liberalização dos mercados energéticos e do desmantelamento do sistema de planeamento e controlo público do sistema energético nacional.»
Paulo Sá
«A promoção e a dinamização da actividade industrial devem constituir uma política de Estado. Temos inúmeros recursos minerais estratégicos (...) Temos condições para apoiar a indústria tradicional (...) Temos experiência, conhecimento e capacidade para desenvolver a indústria transformadora e estratégica para a economia (...) Temos potencialidades para o crescimento de novas indústrias com maior incorporação tecnológica, como as biotecnologias, as farmacêuticas, as tecnologias de informação e comunicação, a área da produção energética e de novos materiais, aeronáutica e aeroespacial e na área do ambiente.»
Paula Santos
«Portugal precisa de investimento para reforçar a inovação, a investigação e desenvolvimento na produção; precisa de aproveitar os projectos públicos para dinamizar sectores produtivos e apoiar as MPME a reduzir a factura energética, a subir na cadeia de valor e à melhoria do seu desempenho em geral.»
Bruno Dias
«Tempos houve em que nossa soberania alimentar foi posta em causa com o apoio à não produção pagando aos agricultores para não produzir e aquilo que se assiste hoje é que os apoios são canalizados para o agro-negócio, independentemente da necessidade de produzir, e para promover claramente a expansão capitalista da agricultura.»
António Filipe
«O país está a produzir mais em algumas produções, mas também está a concentrar mais a riqueza produzida e a concentrar a propriedade da terra. Com os milhares de explorações encerradas, veio desemprego na agricultura, que tem aumentado consistentemente.»
«O país já pescou mais de 60% daquilo que consumia, mas hoje não chegará aos 40%. Se Portugal não captura o pescado que consume, alguém o faz por si.»
João Ramos
«A necessidade de investimentos nos portos de pesca e o combate à sua degradação, os problemas do assoreamento e a necessidade de respostas estruturadas, programadas, são os problemas mais sentidos pelas comunidades piscatórias.»
Jorge Machado