Combater a desregulação do horário de trabalho e lutar pelas 35 horas

O PCP considera tarefa primordial o combate à desregulação do horário de trabalho, lembrando ser essa uma das armas a que recorre o patronato para agravar a exploração.

Alterações às leis laborais só serviram os interesses patronais

«Hoje, o horário de trabalho, a sua fixação e cumprimento, o respeito pelos tempos de descanso, as respectivas condições de pagamento e de compensação, e a articulação com a vida familiar, pessoal e profissional assumem uma enorme actualidade», afirmou da tribuna do Parlamento, dia 18, a deputada comunista Rita Rato.

A actualidade e importância deste tema, que ocupou a declaração política que proferiu dia 18 em nome da sua bancada, foi justificada em face das consequências «profundamente negativas» para a vida dos trabalhadores decorrentes das alterações levadas a cabo por sucessivos governos à legislação laboral, nomeadamente as promovidas em 2012 pelo anterior do PSD/CDS-PP, sempre com o intuito de favorecer o patronato.

Essa crescente fragilização dos direitos laborais foi, aliás, bem documentada nos relatos circunstanciados transmitidos na audição que o Grupo Parlamentar do PCP promoveu no dia 15 sobre esta matéria no Parlamento (ver caixa).

Como salientou Rita Rato, essas alterações à legislação laboral, «à boleia da dita competitividade», resultaram sempre na «degradação dos direitos dos trabalhadores, corporizando novos conceitos que apenas recuperam velhas ideias de desumanização do trabalho».

As consequências, essas, estão bem à vista. Para a sua gravidade chamou a atenção a parlamentar comunista salientando que, hoje, no nosso País, «cerca de 75 por cento dos trabalhadores são atingidos pelas adaptabilidades de horários, pelo recurso abusivo ao trabalho por turnos e ao trabalho nocturno, pela generalização do desrespeito e do prolongamento dos horários».

Sempre o lucro

Estas práticas, que nada têm de novo, estão em linha com a utilização de outros «instrumentos ardilosos» de que o capital nunca prescindiu para contrariar os avanços civilizacionais conquistados pelos trabalhadores, designadamente a fixação das oito horas de trabalho.

Daí o recurso do patronato a expedientes como sejam o de transformar «todo o período normal de trabalho em tempo de trabalho», eliminar pausas, impor flexibilizações, aumentar a «intensidade e os ritmos de trabalho», como tratou de sumariar Rita Rato.

É neste quadro, pois, que urge combater a desregulação do horário de trabalho, do mesmo modo que importa garantir o «respeito pelos seus limites diários e semanais» e pelos «dois dias de descanso semanal». Trata-se, ainda, de revogar os «bancos de horas, adaptabilidades, horários concentrados» e de combater o «prolongamento da jornada diária com o abuso do trabalho extraordinário».

Não esquecendo a necessidade de reforçar os direitos dos trabalhadores por turnos, Rita Rato puxou ainda para primeiro plano a necessidade de «garantir as 35 horas a todos os trabalhadores», no público e no privado, «sem perda de remuneração nem de outros direitos», no que é encarado também como um contributo para criar postos de trabalho e combater o desemprego.

Em síntese, do que se trata é de «colocar os avanços científicos e tecnológicos ao serviço do crescimento e desenvolvimento do País, da redução do horário e da penosidade do trabalho».

Por outras palavras, «colocar a ciência e a tecnologia ao serviço não dos lucros de uma minoria mas das condições de vida da maioria».

Opções pelo patronato

À afirmação do deputado Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP) de que «não é atacando o capital que se favorece os trabalhadores», respondeu de pronto Rita Rato: «Mas é atacando os trabalhadores que se favorece o capital».

Ripostado foi assim o sentido geral das palavras do deputado centrista, revelando preocupação apenas com a defesa dos detentores do dinheiro, para si a fonte que «cria emprego e dinamiza a economia».

Os anos mais recentes têm demonstrado de «forma muito clara» esse acentuar ainda maior da linha de favorecimento dos detentores da riqueza, anotou a parlamentar do PCP, exemplificando com o facto de nenhuma medida das últimas alterações ao Código do Trabalho – «nem uma», vincou –, ter favorecido os trabalhadores.

«Todas tiveram por objectivo embaratecer e facilitar os despedimentos, cortar no trabalho extraordinário, cortar três dias de férias e quatro feriados – uma semana de trabalho à borla para o patronato –, aumentar o horário de trabalho, dificultar a articulação entre a vida profissional e familiar».

E não estranhando este posicionamento em favor do patronato assumido por PSD e CDS-PP, Rita Rato lembrou que ambos foram responsáveis por uma revisão do Código do Trabalho que colocou as relações laborais a um «nível inaceitável, profundamente fragilizadas para os trabalhadores».

Dessa opção inequívoca que as bancadas à direita do hemiciclo têm pelos interesses dos poderosos dera já antes conta a deputada comunista ao constatar como nenhuma das questões concretas por si suscitadas na intervenção merecera uma abordagem séria por parte da deputada do PSD Maria das Mercês Borges, que se limitou a remeter o assunto para a Concertação Social.

Foi sem surpresa por isso que Rita Rato constatou que a deputada laranja, apesar de eleita pelo círculo de Setúbal, nada tivesse dito sobre empresas como a Lisnave ou a Siderurgia, onde os trabalhadores sentem duramente o impacto das alterações para pior feitas por PSD e CDS-PP na legislação laboral, numa oferta em bandeja ao patronato.

Mecanismos de exploração

Na sua intervenção Rita Rato deu variadíssimos exemplos da erosão a que têm sido sujeitos os direitos dos trabalhadores, fruto de sucessivas alterações – sempre para pior – à legislação laboral.

Desses novos e velhos mecanismos e formas de agravamento da exploração puderam os deputados comunistas recolher testemunhos concretos na audição parlamentar realizada três dias antes (dia 15) pela sua bancada, com a participação de mais de três dezenas de estruturas representativas de trabalhadores, sob o tema «Horários de trabalho: combate à desregulação, 35 horas, respeitar direitos».

Ao plenário, pela voz da parlamentar do PCP, chegaram alguns desses relatos sobre a forma como os trabalhadores são atingidos pelas adaptabilidades de horário, pelo recurso abusivo ao trabalho por turnos e ao trabalho nocturno, pela generalização do prolongamento dos horários. Eis alguns exemplos concretos:

– Nas minas da Somincor, em Castro Verde, acentua-se a pressão da Administração para impor horários concentrados de 12 horas, no subsolo.

– Na Kemet, em Évora, onde há vários anos se pratica o regime de 12 horas de trabalho diário (o mesmo é praticado na Tyco), a administração impõe a marcação de férias em regime concentrado e seis dias de trabalho gratuito, mesmo após condenação do Tribunal da Relação.

– No Grupo REN, onde há falta de trabalhadores para cumprimento cabal dos turnos, é negado o direito ao descanso obrigatório e os horários são organizados quinzenalmente, o que se traduz numa «instabilidade permanente» dos trabalhadores.

– Na Siderurgia Nacional, no Seixal, a administração impõe 12 horas de trabalho diário, inclusive ao sábado e domingo, situação que se reflecte no aumento dos acidentes de trabalho, em desgaste físico e psicológico dos trabalhadores. Na sequência dos despedimentos tem havido a subcontratação por via de empresas de trabalho temporário.

Empresas de limpeza estão a impor a redução de horários semanais para não pagarem o salário mínimo e respectivos aumentos.

– Na área da Hotelaria e Restauração, em muitos locais de trabalho, não são respeitados os tempos mínimos de descanso, com trabalhadores a saírem do local de trabalho à uma hora da manhã e a voltarem ao seu posto logo na manhã seguinte, passadas apenas seis ou sete horas.

– Na Lisnave Yards, em Setúbal, os trabalhadores são obrigados a prestar 1800 horas de trabalho efectivo, divididas por dois semestres, sendo que 270 dessas horas são prestadas de segunda-feira a sábado (incluindo feriados), o que pode ir até 15 dias de descanso semanal complementar e/ou feriados. Isto sem qualquer acréscimo de remuneração.

– No âmbito do SNS, a carência de profissionais leva a situações inaceitáveis como é o caso da existência de milhares de horas que são devidas aos enfermeiros.

 



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