Realidade desmente Governo
Na sua intervenção inicial Jerónimo de Sousa foi direito ao assunto descrevendo um quadro muito completo sobre os principais problemas com que se debatem hoje os portugueses e o País.
Cortes nos salários e pensões, a somar aos impostos, empurraram milhares de pessoas para a pobreza
«É ou não verdade que com o seu Governo se acentuou o fosso entre ricos e pobres na razão directa em que aumentou e concentrou a fortuna nas mãos de alguns poucos e aumentou a pobreza para muitos?», foi a primeira pergunta que dirigiu a Passos Coelho, abordando assim factos concretos que hoje marcam o quotidiano dos portugueses e a realidade nacional.
«É ou não verdade que os dois problemas da dívida e do défice, o alfa e o ómega das razões invocadas para aceitar a intervenção externa, não foram resolvidos e no caso da dívida foi mesmo agravado?», inquiriu de seguida, para logo referir que é necessário recuar ao tempo da II Guerra Mundial para encontrar um nível da recessão económica comparável ao actual.
Jerónimo de Sousa frisou, por outro lado, que o desemprego é hoje «estruturante» no nosso País e que só a «emigração em massa e os desencorajados que perderam o subsídio de desemprego e não encontram trabalho permitem leituras distorcidas das estatísticas».
O saque
«É ou não verdade que os cortes nos salários, nas pensões e reformas, a carga brutal dos impostos, o congelamento e a desvalorização do salário mínimo nacional, empurraram centenas de milhares de trabalhadores, reformados e pensionistas para o limiar da pobreza ou mesmo para a pobreza?», voltou à carga o Secretário-geral do PCP, na primeira ronda de perguntas ao chefe do Governo, a quem inquiriu ainda sobre o destino do «dinheiro que sacaram a quem trabalha ou trabalhou» e sobre o montante desse dinheiro que foi transferido para o capital financeiro.
Para o líder comunista não é para admirar, pois, que haja quebras de natalidade como as que se verifica nestes tempos de regressão social, face às tremendas incertezas quanto futuro que estão colocadas às novas gerações.
«É ou não verdade que hoje as populações, particularmente do interior, ao ver encerrar a unidade de saúde, o hospital, as escolas, os correios, os tribunais, sentem que vão piorar as suas condições de vida e que são discriminadas já não só em relação à sua origem social, mas também em relação ao sítio onde nascem, crescem, vivem e trabalham?», indagou o responsável máximo do PCP, que contestou o argumento tantas vezes invocado pelos governantes de que o País tem de «ficar pior para no futuro ficar melhor».
Mistificação
O primeiro-ministro, na resposta, não fugiu do guião que levava, insistindo no logro de que o «País vive situação de confiança». Adiantou mesmo que o «caminho», que reconheceu ter trazido «dor e sacrifício à generalidade dos portugueses», está «invertido», e que a «economia do País está a recuperar e o desemprego a baixar». E foi a partir dessa imagética que não resistiu à insinuação de que tal cenário «deve estar a preocupar o PCP, porque já só depende de alguma desorientação do PS para poder crescer no futuro mais imediato».
A mistificação não se ficou porém por aqui, com Passos Coelho a querer justificar o recuo estatístico da taxa de desemprego pela acção meritória do Governo, ignorando em absoluto o factor emigração, os expedientes encobridores desse flagelo social (os contratos emprego-inserção e modalidades congéneres que transformam o desempregado em «ocupado», por exemplo, na função pública, onde ronda os 60 mil o número de trabalhadores sem vínculo e sem os direitos mais básicos), além da própria desistência dos referidos desempregados de longa duração.
Já sobre o recuo à II Guerra Mundial para encontrar uma contracção da riqueza de cerca de seis pontos percentuais acumulados, como agora acontece, Passos Coelho escudou-se na comparação com outros países igualmente submetidos aos ditames da troika, para dizer que a Irlanda perdeu cerca de 10 p.p. e a Grécia cerca de 16 p.p. da sua riqueza. Sem incómodo visível pela destruição em massa que nos atingiu em resultado da política das troikas, preferiu dar-se por muito satisfeito pelo facto de no nosso País, comparativamente com os seus parceiros de desgraça, ser «menor a perda de riqueza» e «menor a «destruição do produto».