ENVC: uma luta que continua

João Frazão (Membro da Comissão Política)

Quando, em Junho de 2011, os trabalhadores dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC) foram confrontados pela decisão do governo PS de proceder a uma dita reestruturação da empresa, que não passava de um gigantesco despedimento colectivo, muitos vaticinaram o fim imediato da longa história de 67 anos do maior estaleiro nacional com capacidade de projecto.

É possível defender os Estaleiros e os postos de trabalho

Alguns pensaram que os trabalhadores baixariam os braços, diminuídos que estavam já por um processo que tinha começado muito antes de destruição da empresa. Muito poucos considerariam possível que, quase três anos depois, houvesse ainda mais de quatrocentos trabalhadores que, resistindo a todas as pressões e mentiras, continuassem a defender os seus postos de trabalho e os ENVC como empresa pública.

Estes anos mostraram que PS, primeiro, e PSD/CDS, depois, tendo decidido a entrega a interesses privados do fundamental das empresas do Sector Empresarial do Estado, puseram em marcha um plano de degradação da sua capacidade produtiva, nuns casos, ou de limpeza de passivos para a sua entrega em limpo, noutros.

Nos Estaleiros, tal operação passou pelo boicote à sua produção, como no caso dos Navios Atlântida e Anticilone, pelos governos do PS, nos Açores e na República, pela paralisação completa da sua actividade, designadamente com o cancelamento das encomendas de navios para a Marinha, bem como pelo desvio das contrapartidas dos submarinos, e com a obstrução deliberada à construção dos navios asfalteiros para a Venezuela. Ao fim destes três anos em que sujeitaram os trabalhadores à humilhante situação de, dia após dia, se dirigirem ao seu local de trabalho sem nada para fazer, o Governo articula com a Comissão Europeia uma justificação para o culminar de todo o processo: a extinção dos ENVC, o despedimento de todos os trabalhadores e a entrega, a patacos, da concessão do espaço onde hoje estão os ENVC.

Pouco prevenido para a capacidade de luta e de resistência dos homens e mulheres herdeiros de uma gesta de construtores de alguns dos melhores navios que vagueiam pelos mares do planeta, o Governo acenou com uma mala cheia de notas. Enganou-se! Neste momento, os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, ao contrário das intenções e expectativas do Governo, mantêm cerca de 400 trabalhadores. De todo o lado chegou a solidariedade para com a sua luta. Da CGTP-IN, das Uniões de Sindicatos e da FIEQUIMETAL. De estruturas do Movimento Sindical de diversos países da Europa. Da população de Viana do Castelo, que em todos os momentos disse presente, fazendo sua a luta dos trabalhadores da empresa, âncora do desenvolvimento do distrito. E do nosso Partido, cuja organização nos Estaleiros vêm já de antes do 25 de Abril, e que assumiu com clareza a exigência da manutenção dos Estaleiros Navais como empresa pública, nas jornadas parlamentares em Viana, nas visitas dos deputados do Parlamento Europeu, nas propostas na Assembleia da República, na presença constante do Partido, incluindo do Secretário-geral nas diversas acções de luta.

Força indestrutível

Dando expressão concreta à tese marxista de que quando a classe operária age em unidade é indestrutível a força das massas e que essa unidade é factor determinante do êxito na defesa dos interesses imediatos, os trabalhadores dos ENVC vieram para a rua e recusaram o dito inevitável. Hoje, como em Junho de 2011, as reivindicações são as mesmas. Portugal mantém-se como um País de vocação marítima, sendo o que tem a maior Zona Económica Exclusiva da Europa. Como várias vezes ouvimos, o mar continua aí e nem a pesca industrial nem a marinha mercante se pode fazer a remos. Portugal precisa de uma industria naval forte que, tendo em conta a sua importância estratégica, tenha um determinante papel do Estado, para estar ao serviço do desenvolvimento do País.

Para construir navios é necessário trabalhadores, pelo que é indispensável que o Estado, proprietário dos ENVC, garanta emprego com direitos a todos os trabalhadores. De imediato, estes trabalhadores têm de começar a construir os asfalteiros cuja encomenda continua garantida a favor dos ENVC. Apenas isso garantiria trabalho para todos eles, e para outros tantos, nos próximos três anos. E porque a situação em que os Estaleiros se encontram não é fruto do acaso, é ainda justa a exigência de que, no âmbito da Comissão de Inquérito que, por proposta do PCP, iniciou o funcionamento esta semana na AR, se apurem responsabilidades e os responsáveis.

Hoje e no futuro a luta é em defesa dos direitos de quem trabalha e trabalhou nos ENVC.

Por mais apertadas que sejam as curvas do caminho, a luta continua sendo, agora e sempre, o caminho.

 



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